Capítulo 29

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Capítulo 29 — Pov Jogador
Cpx do Alemão

Mais tarde fui dar um rolé de moto pelo morro, sempre tento estar presente no dia a dia do morador, criar vínculos. Esse foi o exemplo que meu pai deu desde sempre, era nós menorzinho andando pela comunidade e cumprimentando as pessoas. O Sábio leva isso tão à vera do que qualquer outra parada do comando e eu tento seguir a conduta.

Medo e lealdade andam juntos, nós somos maneiros pra caralho com quem anda lado a lado, mas tratamento com quem trai é um só.

Antes de voltar pra casa, paro na birosca do Seu Lino, desço da moto e vou andando até o balcãozinho.

O barzinho fica na parte superior do complexo, onde só quem é daqui conhece. Seu Lino sustentou mulher e quatro filhos só com essa portinha anexada ao barraco dele, um dos caras mais fodas que eu conheço.

Tá um calor do caralho, então eu tiro a minha camisa e jogo no ombro, colocando a chave da moto no ombro. Me apoio no balcão e vejo a filha mais nova do dono sentada numa cadeira mexendo no celular. Ela deve ter uns 17 anos, a única que ainda mora com os pais.

Eu pego minha arma da parte de trás da minha cintura e coloco em cima da bancada, chamando a atenção dela que olhou pra mim. Depois que fiz, pensei que ela tomaria susto, mas apenas me olhou envergonhada.

— Oi — ela levanta da cadeira deixando o celular — vai querer alguma coisa? — ela passa um paninho no balcão.

— Me vê uma brahma aí — eu peço e ela vai em direção ao freezer — Teu pai taí não? — tiro meu celular do bolso.

— Tá descansando lá dentro — pega uma cerveja e um copo — tá com umas dores, não sabe o que é ainda.

— Qualquer parada tamo aí pra ajudar — digo olhando pra ela que serve a bebida e coloca a garrafa do lado.

— Meu pai é orgulhoso, jogador. — nega com a cabeça indo lavar uma louça que tinha na piazinha.

— Tu me procura, po. Manda um vapor desses me chamar que eu ajudo, considero teu pai pra caralho — ela me olha e concorda, não falando mais nada.

Fico ali mexendo no celular também e falando com quem passa. O complexo é composto por diversas favelas e nós organizamos uma divisão dentro do nosso próprio comando pra dominar tudo.
Chega uma mensagem do chocolate avisando que já tinha deixado a Princesa em casa, tinha pedido pra ele me avisar por whatsapp, e mando ele vir aqui.

Alguns minutos depois, ele já de moto, para na frente do barzinho e desce da moto olhando ao redor, me vendo sozinho.

— Kemily — eu chamo a atenção da menina no bar que para de arrumar os biscoitos na prateleira da parede e me olha — Trás um copo pro chocolate aí — eu franzo a sobrancelha e aponto pra ele.

— Suave, Kemily? — chocolate olha pra ela e ela concorda pegando um copo pra ele.

— Tranquilo lá? — me refiro a penha, tomando um gole da cerveja.

— Tranquilão — ele pega o copo e serve a cerveja — Tá ligado quem é um tal de BW? Chegado do Capitão.

— Comédia. — não me desce, cheio de marrinha porque o capitão dá confiança — Cresceu pra cima de tu?

— Não, po. Comigo ele agiu namoral— ele toma um gole da cerveja com cara pensativa — Só que quando nós foi lá na casa da princesa, ele pediu pra conversar com ela, tá ligado? Até aí tudo bem,eles entraram e eu fiquei do lado de fora, mas depois saiu de lá puto pra caralho e ela parecia meio irritada no carro.

Fico com neurose. Chocolate é águia, observa tudo, tanto que a última vez que ele bateu um papo desse comigo, o filha da puta do Mendonça era polícia e x9.

— Ela não falou nada depois? — falo vendo meu celular vibrar no balcão.

Pego o celular no bolso e vejo que é mensagem de um número desconhecido.

— Falou nada não, chefia. Pode ser nada demais, mas achei que deveria contar.

— Fez o certo.

Abro o Whatsapp, indo na conversa desconhecida e vejo uma foto do Rodrigues morto. Ele tava com a cabeça estourada, tiro de fuzil que estragou o velório do arrombado. Passo o olho pelo corpo dele na imagem e tá bem magoado, não sei se pelo pau que a Princesa mandou dar nele sábado ou se é parada de quem matou.

— Caralho, não tem um minuto de paz nessa porra — jogo a cabeça pra trás e passou a mão no rosto, mostro a foto pro Chocolate e ele só arregala o olho pra mim.

Pego minha carteira no bolso e jogo uma nota de 200 no balcão.

— Paga a cerveja e alguma coisa que teu coroa precisar — olho pra Kemily que concorda — Princesa tá entre os meus — me viro falando pro chocolate — qualquer parada anormal perto dela, eu quero saber.

— Esquenta não, to palmeando tudo.

— To ligado, vai ser recompensado.

— Não to pensando nisso, quero fazer o meu em lealdade a quem me estendeu a mão quando eu não tinha ninguém.

— É nós — Cumprimento ele e vou embora.

Meu irmão com mais um filho vindo aí e essas merdas acontecem cada vez mais. Meu sonho sempre foi construir família, mas às vezes duvido desse pensamento na vida que eu levo.

Essa hora o Sábio deve ter ido pra casa já, então nem vou pra boca, vou voado pra casa tomar um banho e colocar a cabeça no lugar.

Paro na porta de casa e dou um salve pros moleques da segurança, entro e ouço a televisão da sala ligada. Lorena tá lá, sentada vendo série de babydoll com um balde de pipoca.

— Tu não tá ligada quem passaram — falo e ela olha pra mim colocando um monte de pipoca na boca e levanta os ombros em dúvida — Rodrigues.

Ela coloca o balde de pipoca no chão ao lado do sofá e senta.

— Eu mandei dar um trato, mas sem machucar muito.

— Foi tu não doidona — eu rio me jogando no sofá do lado dela — me mandaram no whatsapp.

Eu aproveito e pego meu celular no bolso, encaminho a foto pro Sábio e mostro pra ela.

— Desconhecido — pega o celular da minha mão e vai tentar descobrir o número.

— É.

— Vamo fazer o que? — sorri me olhando.

— Chamar um moleque de TI, mas deve ser chip descartável

— Quem fez, vai fazer de novo, tem que olhar na frente - morde a bochecha por dentro, pensando.

— Vai. Torcer pra ser da NH, pq se for inimigo de outro canto, tamo mais longe. — digo e ela me devolve o celular.

— Lutar contra um inimigo invisível é foda — ela encosta no sofá e estica a perna pro meu colo — depois que eu digo que prefiro a boa e velha troca de tiro, me chamam de maluca — passa a língua no lábio inferior.

— É que aí tu sai na vantagem —rio e passo a mão na perna dela — e como foi lá na Penha?

— Tranquilo, conversei com meu pai a beça — ela passa um pé no outro e presta atenção na tv.

— Se estressou com o BW?

Não aguento a curiosidade e pergunto, sou impulsivo, não aguento não.

— Chocolate é um fofoqueiro do caralho ein — ela olha pra mim, balança a cabeça e volta pra tv.

— Meu moleque é águia, sente cheiro do errado de longe — eu olho pra tv também e percebo que ela tá vendo série de coisa antiga, umas mulher com uns vestidos velhos — Brigou com o comédia por causa de que? — insisto no assunto.

— Me queria no posto de fiel dele — ela não dá nem moral pra conversa.

— E tu lá é mulher pra ser fiel? — eu rio — a mulher de bandido seria ele.

Ela pega o controle, pausa a série e sorri.

— Foi exatamente o que eu disse pra ele — ela joga o controle pra mim — bota no jogo do flu aí.

Sonho dos crias [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora