Capítulo 92 — Lorena
Me ajeito na cama, já incomodada por estar tanto tempo deitada. Pela minhas contas, já fazem vinte dias que eu estou internada. A cirurgia foi boa, recuperação tranquila, mas contando que eu vou sair daqui direto pro sistema carcerário, na teoria, os médicos tão segurando bastante a minha alta. É quase um milagre que eu não tenha tido nenhuma complicação, a bala quando entra, além do impacto, vai queimando tudo por onde ela passa.
Respiro fundo e balanço os pés, olhando pro teto e pedindo a Deus pro tempo passar mais rápido. To na expectativa de que alguma coisa vai acontecer em breve porque tem dias que a Kemilly não vem.
— Acho bom você exercitar a paciência, vai precisar muito quando tiver no privado — O policial Guimarães fala comigo. Sem brincadeira, eu acho que esse homem tá apaixonado por mim, ele não deixa meu santo em paz.
— Tava precisando de umas férias mesmo — dou de ombros e olho pra ele, sorrindo. Posso tá fudida, mas não deixo esse macho chato alugar apartamentos na minha mente — Isso aqui tá melhor que spa. Franguinho com purê de batata que veio mais cedo tava uma delicia, agradece ao cozinheiro por mim?
A policial nova que tá de dupla com ele prende nega com a cabeça, olhando de rabo de olho pra ele.
— De zero a dez, quanto vocês vão ficar felizes quando eu for pra cadeia? — pergunto, aproveitando a deixa pra perturbar a paciência deles.
Sinto falta de ser produtiva, de tá pensando o crime, ensinar os meninos ou de, simplesmente, levar o Lucas pra tomar um sorvetinho na praça. Qualquer coisa que me faça sentir mais viva.
Pra não pirar, tento não pensar no que tá acontecendo lá nos morros, a Kemily tentou me passar algumas dicas, mas nada que abrisse brecha pros policiais desconfiarem.
— Não vejo a hora — a mulher diz, sem tirar os olhos do celular.
— Eu vou sentir falta, capaz de eu ir te visitar no presídio — o homem ri, cheio de si.
— Tua mulher já sabe que tu tá apaixonado por uma presa? Eu sei que eu sou linda, guigui, mas vai com calma — dou um sorriso debochado.
— Já falei pra você não entrar nesse assunto — ele aponta pra mim, endurece a expressão e eu sorrio ainda mais.
— E eu falei que não é legal ficar na vontade de outra mulher sendo casado — a policial desvia atenção do celular pra me olhar — Já não foi legal ficar olhando pra bunda da sua colega — ela, na mesma hora, arregala um pouquinho os olhos — Relaxa, foi você não, foi a outra, a que tava antes, mas cuidado, quem faz com uma...
Eu não consigo terminar a frase ou prestar atenção na resposta dele, muito menos nas palavras que a colega diz logo depois, porque meu foco vai todo pra porta do quarto, quando a Cecília entra vestida de jaleco e máscara.
Meus anjos da guarda chegaram.
Ela mostra o crachá pro Guimarães que concorda com algo que ela diz, mas a imagem parece passar sem som na minha frente. O policial levanta da cadeira e anda até próximo à minha cama, enfiando a chave na algema e soltando meu braço.
Troco olhares com a minha melhor amiga pela primeira vez desde que ela entrou e contenho o ímpeto de levantar correndo.
— Vê se não apronta com a fisioterapeuta — me provoca, enquanto eu passo a mão no pulso pra aliviar o incômodo que a algema tava me causando.
— Eu sou um anjo — respondo pra não ficar muito quieta e ele desconfiar.
— Dá licença, Lorena, eu vou te ajudar a dar uns passos igual a outra fisioterapeuta fez com você anteontem — Cecília diz, me olhando nos olhos e eu sorrio, genuinamente feliz por ela estar aqui.
Ela me estende as mãos e eu seguro, ficando sentada na beira da maca.
— Se doer, você me avisa — olha pra mim, sorrindo de lado.
— Tô nova.
— Podemos ir até o corredor? — ela se vira ao Guimarães, perguntando.
— Melhor não, essa daí é espertinha.
No que o Guimarães termina de falar, Kemily aparece, se escorando na porta do quarto e dá um tiro na cabeça dele. Eu levanto e vou pra cima da policial, mas um tiro, vindo da Cecília, atinge a perna dela, fazendo com que ela solte a arma próximo ao pé da Kemily que pega.
— Caralho, vocês tão pica mesmo — elas riem e eu coloco a mão no rosto, negando com a cabeça. Minhas crias, caralho.
Rapunzel tira uma pistola de trás da cintura e me entrega.
— Tem dois no corredor vindo — Kekel espia, escorada na parede ao lado da porta.
— Vamo pra dentro deles — dou dois passos largos até a porta.
Respiro fundo quando a tontura vem, ainda não tô cem por cento e a quantidade de adrenalina que corre na minha veia agora é um veneno pra mim.
Coloco a cabeça pra fora do quarto e atiro na direção dos vermes que correm até nós. Um entra num quarto à esquerda e o outro se protege na maca vazia largada no corredor.
— Como que a gente tá de munição? — pergunto, voltando a cabeça pra dentro do quarto e olhando a mulher tentar estancar o sangue enquanto chora de dor. Sei o que ela tá passando, mas na minha vez ninguém teve pena.
— Tem o suficiente — Cecília diz e para do meu lado.
— Não tenho como segurar mais um pente — respondo, lembrando que tô apenas com uma camisola do hospital.
— A gente te dá cobertura — fala firme, com as tranças amarradas no alto da cabeça, enquanto Kemilly mete a cara e troca tiro com os caras.
— Derrubei um — diz, abaixando a arma — Vamos avançar um pouco e pegar o que tá no quarto.
— Se eu tomar mais um tiro desse não sobrevivo não — rio, saindo do quarto, escorada na parede em duração ao quarto que o verme entrou.
— Então cuida, chefona — a mais nova balança a cabeça — Tem mais duas viaturas lá fora.
Ela passa na minha frente e caminha mais uns metros, parando logo após da porta. Conto até três, mostrando os dedos, e as duas metem o pé na porta, escancarando a entrada do quarto.
Olho brevemente pro cara, que levanta as mãos, apontando a arma pra cima, em sinal de rendição, mas meu olhar foca na senhorinha deitada na cama, aterrorizada com a cena.
— Joga a porra da arma no chão — grito e ele exita — Agora, caralho, tô mandando largar essa porra!
Ele treme, mas faz o que eu ordenei.
— Vira de costas e coloca a mão na cabeça — Cecília manda, também balançada com o olhar da senhorinha em nós.
Ela o revista, enquanto Kekel vigia a porta. Eu observo o monitor cardíaco da senhora disparar, os batimentos já estão a mais de 100 por minuto.
— Fica calma, não vamos fazer nada com a senhora não — digo olhando nos olhos dela.
— Tá limpo — Rapunzel avisa.
— Prende ele no banheiro e vamos.
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Sonho dos crias [M]
FanfictionE fé no pai, sei Que todo mal contra mim vai cair por terra Nós gosta da paz, mas não fugimos da guerra Paz, justiça e liberdade, fé nas crianças da favela Eu vivo a vida e amanhã não me interessa Lorena, vulgo Princesa, tá terminando a faculdade d...