Efeitos do luar

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(P.O.V. REMUS)

...

Estava quase dormindo quando ouvi passos pelo quarto.

Confesso que minha curiosidade me tomou o corpo e eu tive de abrir uma pequena fresta da cortina de minha cama. Ao espiar lá fora, vi Sirius entrando dentro do banheiro, tentando fazer o mínimo possível de barulho. Depois disso, não consegui dormir mais. Nenhum som saía de lá, nem mesmo um mísero ruído.

O fato de meus sentidos estarem mais aprimorados por conta da lua – que em menos de três dias chegaria em seu ápice –, não me ajudaram a identificar se estava tudo bem com ele. E, ao invés de fechar o cortinado e tentar voltar a dormir, não, eu continuei ali, observando uma maldita porta.

No geral, meus sentidos já eram mais aprimorados que os das outras pessoas, principalmente meu olfato e minha audição. No entanto, nesta fase do mês, os cheiros pareciam me asfixiar e os sons... qualquer ruído, por menor que fosse, me fazia querer arrancar as orelhas. Estar em um lugar lotado, como Hogwarts, não era muito convidativo para minha condição... Não que eu estivesse reclamando de estar ali, longe de mim sequer pensar nisso, mas não deixava de ser algo doloroso.

Minha visão era excelente durante o dia, porém, era de noite que ela se tornava extraordinária, independente da fase da lua, continuava a mesma.

Desde que me "transformei" em um monstro, a agilidade e a força foram aspectos dados a mim, mesmo com um corpo magricela e ossudo, conseguiria, com imensa tranquilidade, fazer coisas que nem em sonhos pensariam que eu seria capaz.

Vários minutos se passaram. Sirius não saiu.

Por um breve momento pensei em ir chamá-lo ou, ao menos, perguntar se ele estava bem, mas assim que me levantei e comecei a abrir o cortinado da cama, ouvi o barulho de água correndo e, logo em seguida, a porta do banheiro se abriu.

Percebi que Sirius estava com o rosto inchado de tanto chorar e em suas mãos havia claramente o motivo. Uma carta. Aquela carta devia ser uma coisa muito pessoal de sua vida para fazê-lo chorar daquela forma.

No momento em que entrei naquela cabine e olhei em seu rosto pela primeira vez, um alerta ecoou: perigo! Sirius era o que muitos diriam se tratar de um desastre ambulante: Riquinho, mimado e que achava que o mundo inteiro deveria girar ao seu redor. Mas... não acreditava tão plenamente nisso agora. Sirius, assim como eu, tinha coisas muito bem escondidas lá no fundo, que não mostrava a ninguém. Aquele sorriso debochado e as piadas na ponta da língua eram apenas uma máscara. Por isso o alerta de perigo estava ligado naquele exato momento, ordenando que eu me virasse e não abrisse a boca, que me mantivesse quieto e sem falar demais.

- Sirius, aconteceu alguma coisa? – perguntei, abrindo de vez a cortina. Quis me bater ao perceber que aquela pergunta ridícula saíra mesmo de minha boca.

- Foi mal... eu te acordei?

- Não, já tava acordado – falei, me levantando e indo até sua cama. – Posso sentar aqui?

- Pode sim. – Eu não deveria ter ido. Eu não deveria ter falado nada. O alerta ainda disparava.

- Quer conversar sobre...?

- Não. – Ele deu de ombros, sorrindo. – Tô de boa.

- Não é o que tá parecendo. – Talvez... Talvez eu pudesse tentar ajuda-lo e, então, cair fora dali, antes que ele se aproximasse demais. – Eu sei que nos conhecemos há pouco tempo, mas se precisar desabafar com alguém... Tô aqui.

- É bom saber disso, Remus. Sabe... – Ele parou de falar e percebi que seu olhar havia recaído sobre mim. – Porra, seus olhos são muito bonitos, sabia? Nunca vi olhos brilhando dessa forma no escuro. Sempre quis ter olhos mais diferenciados... e os seus, puta merda, são magníficos! – Senti meu rosto inteiro pegar fogo.

- S... Seus olhos são acinzentados. Os meus só são castanhos.

- Castanhos amarelados.

- Os seus que são diferentões, Sirius.

- Não, não são. – Seu olhar se direcionou para o teto. – Todos da minha família tem esses olhos. É uma das formas de reconhecer um Black. Ter olhos acinzentados, cabelos pretos... ser filho de um... – Ele se interrompeu, mexendo nervosamente nas mãos. – Mas, voltando ao assunto em questão – Sirius sorriu ao se voltar para mim -, os seus olhos são realmente bonitos.

- Ah, valeu. – Desviei o olhar depressa. Não, meus olhos não eram bonitos. Eram olhos de um monstro... Olhos que brilhavam tão fortemente porque estava no período de "caça". Aquilo não era bonito... só mostrava o quão perto o lobo estava de reaparecer.

- Falei alguma coisa errada?

- Quê? – Pisquei algumas vezes e neguei. – Não, não é isso. É só que eu... er... n... não tô muito acostumado com elogios.

- Não sei o porquê, você deve ser elogiado toda hora! Já se olhou no espelho? Você é lindo, cara. – Sirius sorriu e, em seguida, olhou para as outras duas camas à nossa frente. – Dormem feito pedras, né? Estamos falando bem alto, se formos considerar o silêncio que tá fazendo aqui, e eles continuam dormindo.

- Queria conseguir dormir fácil desse jeito...

- Somos dois. Ter o sono leve é chato pra caramba, qualquer coisa te faz acordar e pra conseguir dormir de volta é um verdadeiro pesadelo.

- Verdade.

- Então, me diga, Remus John Lupin – um toque de divertimento lhe preencheu o rosto -, o que você costuma fazer quando perde o sono?

- Eu... Bem, eu costumo tentar voltar a dormir?

- Ah, qual é? Você me entendeu! – exclamou, dando-me um leve cutucão na costela, fazendo com que eu começasse a rir.

- Geralmente... quando eu percebo que não vou conseguir voltar a dormir, eu pego algum livro pra ler e...

- Caralho, Remus. – Ele revirou os olhos. – Tem algo que você faça que não tenha nada a ver com estudar?

- Não são todos os livros que tem a ver com estudar, Sirius.

- Então, você está me dizendo que lê por diversão?

- Sim, ler é algo maravilhoso, consegue te transportar pra mundos e universos diferentes, cada história é única e...

- Ok. Ok, Sr. Certinho... Hummm... Então, me fale alguns livros que você já leu. – Foi a minha vez de revirar os olhos ao ouvir aquele apelido ridículo.

- Bom... a maioria dos livros que eu já li são trouxas, você não deve conhecer...

- Eu não ligo, só me fale o nome dos livros, tô curioso agora.

- Tá, tá. – Eu ri ao ouvi-lo. – Eu já li... Ilíada; Odisseia; As mil e umas noites; Dom Quixote; As viagens de Gulliver; Os miseráveis; Alice no país das maravilhas; A divina comédia; Romeu e Julieta; O pequeno príncipe; entre muitos outros.

- Como é que você consegue ler tantos livros?

- É fácil... Sei lá... Acho que... Como eu sempre vivi trancado dentro de casa, meus livros eram meus únicos amigos e... – Remus John Lupin, o que pensa que está fazendo? O alerta disparou completamente dentro de minha cabeça. Eu estava revelando coisas que não deveria... Idiota. Idiota! Eu era um idiota!

Meu pai estava certo. Me aproximar de qualquer um me colocaria em risco e a essas pessoas também. Eu era doente. Eu era um monstro. E se eles descobrissem...

Meu primeiro erro foi ter aceitado entrar naquela cabine. Meu segundo erro foi ter ficado próximo demais deles em tão pouco tempo. Se eu continuasse abrindo a boca, esse seria meu terceiro erro...

..., Mas, por que, por Merlin, eu queria tanto que esse terceiro erro continuasse?

...continua no próximo capítulo...

Os Marotos (Livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora