Capítulo 37

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Rara

2 anos se passaram, desde a morte de minha Lúcia e, 1 ano, desde a quase morte de Robert. O quase perecimento de Robert, caiu-nos como um balde de água fria, era inacreditável como num período tão curto, havíamos perdido uma das pessoas de que mais gostávamos e, num abrir e piscar de olhos, a outra estava prestes a seguir o mesmo rumo, falo num plural, porque assim como Milena, Romando e Cassandra, todos nós ficamos devastados. Cassandra tornara-se nossa amiga, desde o falecimento de Lúcia, pois frequentemente visitávamos a sua casa para saber como Robert se encontrava. Lembro-me perfeitamente do dia em que me ligara preocupada para saber sobre Robert, dado que se fazia tarde e, ele não chegava à casa, sendo que dissera à Cassandra, que passaria pela empresa para cumprimentar-nos.

— Por favor Cassandra, acalma-te! — Apresentava um tom apaziguador para tentar reconfortá-la.

Eu não consigo e não me posso acalmar, eu tenho muito medo que algo aconteça, eu não quero que a história se repita. — Manifestava Cassandra em prantos.

Tu verás que tudo ficará bem e, que tudo isso, não passam de ideias da tua cabeça, pelo que já havia acontecido — Relatava serenamente e, arrependendo-me, no minuto a seguir, pois à frente de mim, pela Tv, passava a tremenda notícia do possível suicídio de um cidadão em Formby Beach, não evitando a minha tamanha perplexidade, que se fez transparecer à Cassandra.

Passa-se alguma coisa, Rara? Por que te calaste de repente? — Perguntava simultaneamente Cassandra, do outro lado da linha preocupada.

Só espero que um dia sejas capaz de o perdoar. — Expremi já com os olhos encharcados.

— O que queres dizer com isso, Rara? — Inquiria Cassandra, sem ainda entender o que se passava.

Liga à Tv. — Comunicava já chorando.

E, no minuto a seguir, ouvia o berreiro  tremendo de Cassandra através da linha, que inevitavelmente, desligara a chamada.

Após a quase extinção de Robert, Cassandra mudara para Liverpool, deixando para trás, tudo o que construíra em Manchester, já que recebera uma proposta de trabalho. Ela queria levar Robert consigo, porém, ele não tinha condições psíquicas para um recomeço, então, acabara por ficar em sua residência, sendo este, o seu último desejo. Soube disso, porque antes de partir, se despedira de mim, Milena e Romando.

Hoje, precisamente hoje, a minha Lúcia completaria 24 anos se ainda estivesse em vida, isso porque hoje, era o dia de seu aniversário. Robert faria anos no mês a seguir ao de minha Lúcia, isto é, 26, soube deste particular aspecto, ao aceder as suas respectivas informações pessoais, para que se pudesse fazer uma identificação do corpo, caso a sua tentativa de suicídio fosse certeira, posto que não existia parentes próximos que o pudessem fazer e, ainda mais quando o último lugar em que trabalhara, fora à British Company. Muita coisa mudara depois da morte de minha Lúcia. Romando havia-se movido à Londres para assumir e, se responsabilizar pela filial que lá tínhamos, pois permanecer em Manchester, era sufocante e demasiado doloroso para ele, dado que lembrava-se sempre de Lúcia, todas as vezes que pisava os pés na empresa e, também porque, Romando era dotado de uma emotividade incomum, e estar fora de Manchester por um tempo indeterminado, o faria bem.

Milena e eu assumimos todas as responsabilidades por cá e, com isso, decidimos abrir uma fundação, a qual baptizamos pelo nome de "Morgan & Gold", para homenagear e honrar a nossa Lúcia e, aquele que em vida amou, mesmo que negasse interminavelmente. Robert ficara extasiado e entusiasmado com a notícia, porém, sempre com o olhar abatido, visto que notava-se o seu sofrimento, simplesmente, com um olhar superficial, mas isso, era uma maneira de podermos mantê-lo debaixo de nossos olhos, já que o trabalho era a forma mais viável para animá-lo, a fim de que não cometesse outro impropério, sendo que tentara antes e, para que não voltasse a repetir,  Milena e eu fazíamos questão de visitá-lo todos os dias e, até dormir em casa de Cassandra, todas as vezes que fosse necessário.

 Milena e eu estabelecemos não doar nenhum dos pertences de nossa Lúcia, nem roupas e nem acessórios, pois por mais egoísta que possa parecer, eram as únicas coisas que Lúcia nos deixara e, nós não estávamos dispostas a retirar Lúcia de nossas memórias, porque para nós, ela está e, permanentemente permanecerá, viva. Eu e Milena nos mudamos para a casa de nossa Lúcia, uma vez que queríamos estar, cada vez mais, perto dela e, recordo-me  sem defeitos, do dia em que Matilde recebera a notícia, ficando completamente arrasada, isso porque Lúcia, era como uma filha para ela. Mas o principal motivo para a mobilidade, era pela causa de que, nos últimos dias em que esteve viva, nós não desfrutamos de sua presença por desentendimentos e orgulho, todavia neste actual dia, nos arrependemos eternamente por não termos aproveitado cada minuto de sua assiduidade.

Entre suas coisas, também haviam poemas que minha Lúcia escrevia, facto esse, que era desconhecido por todos nós. Foi então, que Milena e eu tivemos a ideia de publicar um livro de poemas em seu nome, com dezenas deles retractando a amarga história de amor, que seria mais uma interminável homenagem em sua memória. O livro recebe o nome de " O teu beijo impossível", um dos poemas de que mais aprecio, que começa da seguinte forma:

Li isto num livro «O teu beijo impossível»

Então, começo por dizer:

Impossível seria se eu não pudesse olhar-te;

Impossível seria se eu não pudesse tocar-te;

Impossível seria se eu não pudesse sentir-te;

Impossível seria se eu não pudesse apreciar-te.

O impossível se torna algo autêntico perante todas essas sensações aqui descritas porque eu nunca poderei sentir nem tocar os lábios do teu impossível beijo.

E lá estava eu, deitada na cama com lágrimas nos olhos, a cama que retia o cheiro de minha Lúcia, lendo pela milésima vez aquele poema, aquele que foi o início e o fim de sua história de amor, a amarga cronologia de Lúcia Morgan e, que a mim se aplicara o segredo, confidência de toda a sua vida. Uma revelação que nem Milena e nem Romando haverão de saber, pois a mim ela confiou no período mais sombrio de sua vida há muitos anos e, eu levá-lo-ia ao túmulo.

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