81- Tapa Na Cara

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Sentia que minha semana que começara bem terminaria ainda melhor, queria contar tudo pra Heitor, sobre as fotos, sobre a viagem dos meus pais e sobre as coisas que estava planejando. Depois do almoço subo para o quarto e mando uma mensagem para ele, porém não há sinal de que esteja online, passo as próximas horas fazendo as tarefas de casa enquanto eventualmente busco no celular por algum sinal de vida, nada.

Parte de mim tentava se acalmar pensando que celulares descarregam e pessoas tem mais o que fazer, porém a outra parte entrava em pânico conforme os minutos passavam, sabia que Heitor se sentira mal por precisar usar usar lado não-humano para impedir o pior com Jonas e tinha medo de que isso afetasse o garoto, por fim desisto de esperar e ligo.

Não há resposta da primeira tentativa, insisto e na segunda finalmente tenho resposta.

-Oi.- diz a voz grave de Heitor, exito por alguns instantes ao notar, há algo de errado em seu tom, sua voz trazia um aspecto embargado.

-Oi, tudo bem?- pergunto em um misto de dúvida e preocupação.- Você demorou pra atender e eu pensei que...

-Estou bem.- corta ele rapidamente, fungando em seguida, algo estava errado.- Só acabei pegando no sono, me desculpe.

Eu conhecia aquilo que acabara de ouvir, Heitor estivera chorando, a forma com que fungara, sua voz continuava achatada, além disso ele tinha mentido, não estava dormindo. Por que estava mentindo pra mim?
Demoro tanto pra responder que ele volta a falar.

-Gabriel? Eu...- começa ele, porém se atém, sua voz agora se afogava no fundo da garganta. -Depois eu te ligo.

O telefone fica mudo e meu mundo cai, me sento na cama afundando o rosto nas mãos, o que faria agora? Queria ligar pro garoto até ele atender mas imaginava que seria inútil. Uma ideia quase que instintivamente corre minha mente: ligar para Abigail, ela provavelmente saberia o que fazer, sempre sabia, porém logo desisto ao lembrar que não nos falávamos mais, sabia que provavelmente ela atenderia, mas... Sei lá. Sendo assim restava apenas uma escolha, preocupado e apressado disparo rumo à saída, antes que abra a porta ouço a voz de minha mãe.

-Filho? Está indo aonde?- questiona já surgindo da cozinha, a urgência me fazia querer ignorá-la, mas sabia que não seria certo ou inteligente, a contragosto me volto na sua direção.

-Vou na casa do Heitor, ele está com alguns problemas nas atividades de química e vou lá ajudar.- minto quase embolando as palavras, o rosto dela se torce com certa desaprovação.

-Querido, o seu pai te proibiu de frequentar aquela casa, você se lembra?- pontua ela.

-Sim, mas deixou que eu voltasse, conversamos sobre isso antes do almoço, lembra que procurei ele?- relembro.

-Mas filho, se está indo ajudá-lo com os exercícios por que não tem nenhum caderno com você?- pergunta, mais criteriosa do que o normal.

-Mãe, eu já fiz os meus, estou indo só ajudar ele, não precisa se preocupar, o Heitor tem os materiais dele.- explico e enfim ela se dá por satisfeita, voltando pra cozinha.

Aquele questionário quase havia tirado minha paciência, sabia que Heitor estava mal e queria estar com ele o quanto antes, saber que o garoto que amava estava triste me deixava triste.

Qualquer detalhe que descrevesse sobre a cidade seria uma completa mentira, cruzo as ruas rumo a casa de Heitor com apenas meu destino em mente. Quando dou por mim estou na metade do caminho colina acima no condomínio em que morava, respirava com dificuldade devido a subida, porém basta recuperar um pouco de fôlego pra retornar a jornada.

Toco a campainha da casa enquanto tento secar o suor em minha testa. Depois de um longo momento a porta se abre, escondendo-se atrás dela está Heitor.

Antes de qualquer coisa disparo em sua direção agarrando seu corpo em um forte abraço, após um momento de excitação sinto seus braços me envolvendo de um jeito desconjuntado.

-O que está acontecendo?- pergunto preocupado, me desvencilhando do homem para encará-lo. Ele tenta abrir um sorriso que desaparece rapidamente, seus olhos brilham por um instante, vermelhos.

-Você não deveria ter vindo aqui.- avisa em um tom sombrio e doloroso, sua sobriedade emocional começa a ruir mas volta um instante depois, o garoto suspira.

-Heitor, eu não sei o que está acontecendo, mas seja o que for, me deixe ajudar.- imploro vendo suas feições se endurecerem.

-Não! Você nunca entenderia, ainda mais sendo parte do problema.- responde áspero, me esforço tentando entender o que se passava mas era difícil, Heitor não era uma pessoa dramática e não estaria mal se não houvesse motivo.- Às vezes eu pensava que não podia ser real, sabe?

O homem parece se recompor, se esforçando para retomar o controle de seus sentimentos, em sua postura há um ar de maturidade, o tipo que costumam criar quando não há ninguém para resolver seus problemas, estranho.

-Heitor?

-Era difícil acreditar que alguém poderia entender minhas falhas e fraquezas, minha natureza demoníaca. Talvez isso explique porque reagiu tão bem ao corte brilhante nó meu rosto ou a notícia do meu pai.- diz ele cabisbaixo.

-Do que está falando? Eu não ligo pra isso, realmente gosto de você.- com um olhar cético e infeliz ele me encara, então se aproxima pondo a mão em meu rosto.

-Gabriel, me desculpe por tudo,- fala enquanto seus olhos se iluminam, encaro os círculos de fogo em seu rosto, os mesmos que já vira usando antes com Jonas.- Você não está apaixonado por mim, tudo não passou de uma impressão e quando sair daqui nem ao menos se lembrará de mim, espero que possa me ver como alguém legal quando os efeitos passarem e...

A incredulidade parece crescer a cada palavra de Heitor, finalmente entendia seu problema mas isso não era suficiente pra mudar a indignação que sentia ao ouvir suas palavras, antes que termine sua frase levanto a mão dando um tapa em seu rosto.

O homem pára imediatamente com uma expressão surpresa no rosto, em segundos seus olhos se enchem de água.

-Que droga você pensa que está fazendo?!- indago puxando o garoto atônito para um abraço, não demora muito para que ele finalmente desabe em lágrimas.

-Me desculpa. Depois do que aconteceu com o Jonas pensei que...- ele começa a se explicar, desolado.

-Eu sei, eu sei.- digo, realmente sabia agora.

Heitor tinha usado seus poderes no garoto pra nos proteger e com isso havia pago um preço muito caro, precisara encarar o abismo que existia em si mesmo aonde a dúvida e a culpa se alimentaram. Pensava ter criado nossa relação através de um domínio artificial e assim sentia que me libertar daquilo era o melhor pra mim, mesmo que aquilo estivesse claramente acabando com ele. Nunca imaginara que ter um poder seria tão custoso, mas para Heitor nos apagar da memória de alguém havia sido demais.

O garoto que sempre tentava se manter forte havia finalmente perdido uma luta para seu maior inimigo: ele mesmo. Acolhendo-o em meu abraço lembro de seus olhos vermelhos e em como não haviam surtido efeito em mim, aquilo deixava uma coisa clara, Heitor não era capaz de  usar seus poderes sobre mim, nem mesmo se tentasse.

-Eu te amo, de verdade.- digo em seu ouvido, ele por sua vez tenta dizer algo que se perde no choro, largo a cintura do garoto pra acariciar seu rosto que relutante me encara.- Eu te amo, não existe nada que vá mudar isso.

Em seguida o homem de abraça com força, como se tivesse medo que eu fugisse e beija minha cabeça carinhosamente.

-Obrigado por tudo, eu também te amo.

Meu Demônio (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora