53- Tiro Certeiro

3K 410 126
                                    

Depois de nossa conversa e já com a promessa de nos encontrarmos na manhã seguinte, Heitor e eu seguimos nossos rumo para casa.

Observo o relógio em meu celular, passavam poucos minutos além das dez horas da noite, bem, para alguém que tinha até a meia-noite, era um bom horário. Esperava que aquilo contasse como um ponto positivo para conseguir a permissão do meu pai para a trilha da dia seguinte.

Enquanto caminho levo em conta alguns detalhes, precisava ser convincente, nossa cidade se formava em uma planície cercada de montanhas cobertas por matas, e nessas haviam diversas trilhas, o simples fato de escolher uma trilha que levava a uma capela já seria motivo para ter meu pedido negado, meu pai não gostava de contato com outras igrejas. A uma esquina de casa percebo uma coisa, meu pai não sabia aonde Heitor morava, sorridente entro pela porta.

Minha mãe assistia TV solitária, ao perceber minha presença sorri.

-Já voltou querido?- indaga ela.

-Pois é. O Heitor teve que ir pra casa mais cedo.- digo pondo as mãos nos bolsos, minha mãe era quem mais ficava presente em casa, precisava ter ela convencida de nossos estudos.- Por conta da discussão da semana passada ele perdeu uns dias de aula e agora está com a matéria atrasada, atualizei um pouco do que aconteceu e prometi ajudar ele a acompanhar o restante.

-O Heitor não tem nenhum outro amigo que possa ajudá-lo?- questiona, percebo o que a mulher quer dizer, ela buscava um motivo para nos afastar.

-Não, ele não tem, e você deveria ter vergonha de perguntar uma coisa dessas. O Heitor acabou de ir no nosso culto, fez a parte dele, nunca me faltou com o respeito, e se vocês estão irritados com a mãe dele, deveriam antes me perguntar sobre ela, eu mal conheci a mulher, ela geralmente cuida da casa e só passava para ver se estávamos estudando direito.- digo irritado. Mesmo que algumas partes fossem mentira, não conseguia mais suportar a ignorância deles quanto a Heitor.

-Hum, entendi.

-Aonde o meu pai está?- indago mudando de assunto.

-Ele está no escritório, mas não sei se é uma boa idéia interrompê-lo.- diz receosa.

-Eu preciso conversar com ele.- digo me virando na direção da escada, meus passos ecoam pelo corredor até a porta do escritório, ouço a voz abafada do homem em seu interior, sem cerimônia adentro lhe  encontrando ao telefone.

-São Paulo? O senhor não acha que é muito longe para uma ca...- o pastor então se atém ao perceber minha presença, seu rosto tenta soar mais ameno.- Eu te ligo mais tarde.

Ele em seguida desliga o telefone e pigarreia tentando se recompor.

-Filho, eu pensei que ainda estava com o seu amigo.- diz, a palavra "amigo" sai de uma forma amarga de sua boca.

-Eu estava, mas já colocamos em dia os assuntos atrasados da escola, ele perdeu uns dia de aula e mudou de escola faz pouco tempo, nada importante, mas ouvi você no telefone, o que tem em São Paulo?- indago curioso, o homem fica visivelmente nervoso.

-Ora, não é nada demais. Só um... Seminário.- afirma ele.

-Mais um?- estranho, -Vocês participaram de um poucas semanas atrás.

-Eu sei, mas a igreja tem cobrado isso dos seus pastores, sabe? Preparo, é importante para enfrentar certas coisas.- afirma evasivo.

-Que tipo de coisas?- indago, meu pai se levanta, roda a mesa e se posta diante dela.

-Sabe, Gabriel. Existe muito a ser feito nesse mundo, ele está infestado pelo mal, aberrações e imoralidades...- começa ele, eu sabia aonde queria chegar.

-Falta de caráter.- afirmo ácido.

-Sim! E é nosso dever como pessoas de bem defendermos o caminho da verdade e dos bons costumes. A mãe do seu colega por exemplo, é uma mulher que não entende o seu papel.- De má vontade assinto, podia não ter a melhor relação possível com Cassandra, mas não achava justo desprezá-la.

-Mas isso não significa que o Heitor seja ruim, você não pode julgar alguém pelo seu parentesco.- digo rebatendo sua opinião.

-Talvez não, mas é como dizem: Diga com quem tu andas...- começa ele deixando para que eu complete sua frase.

-Pois bem, Heitor tem andado comigo e você pôde ver o que ele fez, estava na igreja ao meu lado, talvez a companhia não traga apenas frutos ruins. - afirmo lhe contrariando, o homem me encara sério, então suspira.

-Esse Heitor, ele foi a igreja por vontade própria?- indaga curioso.

-E por que mais viria?- questiono.- Eu nunca obriguei ninguém a vir.

-Hum, interessante.- diz pensativo.

-Mas não foi pra isso que eu vim aqui, estava pensando em aproveitar o dia de amanhã fazendo uma trilha e queria a sua permissão.- digo já exaltado com a conversa, o pastor estreita os olhos desconfiado.

-Trilha? Isso por acaso não é a desculpa para ir à casa do garoto, não é mesmo?- questiona.

-Não.- digo sério.

-Mas ele vai?- questiona, não respondo nada, o homem sorri vitorioso.- Como eu imaginei. Sabe Gabriel, eu prefiro o seu silêncio do que a sua mentira, pode ir fazer a trilha com seu amigo, mas eu quero uma foto do caminho a cada meia hora, pra garantir que não estão na casa daquela mulher horrível.

Encaro meu pai atônito, não conseguia acreditar que ele havia nos permitido. Pelo visto Heitor havia sido certeiro indo ao culto, sorrio.

-Está bem, eu mando as fotos.- afirmo, e dito isso sigo para o meu quarto feliz, tinha minhas condições, mas aquilo não era um problema, eu estava livre para correr com Heitor, correr e muito mais.


Meu Demônio (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora