19- No Pulo Do Gato

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-De castigo, Heitor? -questiono intrigado.- Você não é um pouco velho e grande demais pra isso?

Mesmo depois de conhecer sua mãe e assistir seu temperamento em prática aquilo não parecia fazer sentido, porém ao encarar o enorme homem a minha frente percebo que talvez não a conhecesse tão bem, Heitor parecia ter sido reduzido a um menino, seu rosto estava ruborizado e seu olhar desviava do meu, cruzava os braços de forma desconcertada.

-Eu... Eu...- tenta se explicar mas falha, então simplesmente se cala.

-Está tudo bem, se precisa ir vá em frente, nos vemos amanhã na escola.

-Obrigado, - diz ele se levantando e seguindo na direção da porta, podia parecer precipitado da minha parte, mas esperava um beijo seu, porém logo entendo o quão urgente era pra Heitor ir para casa, ele desaparece da cozinha, suspiro. Porém alguns instantes depois retorna.

-Gabriel, antes de ir, pode me passar seu número? Assim podemos nos falar até lá.

-Posso, claro.- digo prontamente e lhe passo meu contato. Então com um último sorriso sem jeito ele se despede e parte.

Finalizo meu café encarando as paredes, os acontecimentos daquela manhã tinham de deixado fora área, não sabia o que fazer em seguida.

Bem, eu não sabia, mas havia alguém que já tinha tudo em mente, estava reunindo a louça quando a campainha toca novamente, naquele ponto do dia já nem sabia pelo que esperar.

-Abre a porta, Gabriel.- grita Abigail, sem nem deixar tempo para que eu siga até a porta.

Corro para atendê-la, assim que abro ela entra sem cerimônias.

-Voltei!- anuncia ela.

-Oi, a quanto tempo.- brinco.

-Oi nada, meu lindo. Eu demorei uns minutinhos pra não parecer tão indiscreta, mas já está bom...- inicia diz seguindo na direção da sala e se jogando no sofá.

-Espera! Você estava vigiando a casa?- questiono.

-Óbvio!- exclama.- Mas isso não vem ao caso, quero saber todos os babados, vi gente entrando, gente saindo, enfim, coisas que vai me contar tintim por tintim.

Suspiro, sabia que seria inútil discutir com Abigail, então simplesmente me ajeito no sofá ao seu lado, nos minutos seguintes lhe conto a maior parte dos acontecimentos, deixo de fora apenas alguns detalhes, como a cicatriz brilhante de Heitor e suas explicações acerca de não ser totalmente​ humano, sabia que falar aquilo soaria bobo, além de que Abigail provavelmente não seria tão compreensiva quanto eu.

-Hum, achei tudo muito interessante, mesmo que o bonito não queira me contar dos amassos que vocês dois deram.- diz em seu comumente usado som de indireta.

-Amassos?- questiono confuso.

-Ah, pelo amor de Deus, pára! Você está com o pescoço todo chapiscado com chupões e vai querer fazer a desentendida pra cima de mim? Não ouse, Gabriel, se tem uma coisa que você faz mal nessa vida é mentir. Fico só imaginando a desculpa que vai inventar os seus pais quando eles perguntarem sobre essas marcas.

Nesse exato momento meu sangue gela, podia sentir minha pele se tornando pálida enquanto minha alma sem esperança abandonava meu corpo.

-Meu Deus.- digo cobrindo a boca chocado, em momento nenhum havia passado pela minha cabeça o fato de que meus pais certamente cobrariam uma justificativa para aquilo, e nem a verdade serviria, muito a idéia de ter me perdido aos beijos pelas ruas da cidade com alguém, aquilo significaria o fim de qualquer possibilidade futura de sair novamente. - Eu estou lascado.

-Talvez.- diz Abigail pensativa enquanto tamborila os dedos no queixo.

-Talvez? Eu estou frito, eles devem estar chegando a qualquer momento.- digo já começando a entrar em desespero.

Nesse momento o rosto de Abigail se ilumina, a garota morde a unha vermelha de seu indicador, seus lábios formam um grande sorriso travesso e um pouquinho diabólico.

-Certo, estou indo embora, beijo.- diz seguindo na direção da porta, apressada.

-Ei, espere aí, você praticamente gritou que tem um plano com esse sorriso e simplesmente vai embora... Sem me contar nada?- indago quase indignado.- Vai me deixar sozinho pra morrer?

Abigail levanta o dedo pedindo silêncio, penso em argumentar mas logo desisto.

-Eu realmente tenho um plano, é claro que tenho, mas não vou te contar até o momento certo. Isso vai ser o seu castigo por me julgar quando estava vigiando sua casa.- diz ela soando punitiva, então parte me deixando com o coração na mão, amassado entre os dedos.

Naquele ponto tudo o que me restava era esperar, que meus pais chegassem e não reparassem em nada ou que Abigail trouxesse alguma de soluções mirabolantes.

Os minutos pareciam horas, já passava do meio dia e tudo dentro de mim já se contorcia de uma forma estranha. Uma mistura de ansiedade e impassibilidade, uma parte de mim queria acabar logo com isso enquanto a outra queria que aquele momento nunca chegasse.

Eis que depois de muita espera a campainha toca, engulo em seco, tento ajeitar a gola da camisa para que as marcas ficassem menos aparentes, o que provavelmente era inútil naquele ponto, sigo na direção da entrada e giro a maçaneta com minhas mãos trêmulas, abro o porta me mantendo por detrás dela.

Meus pais adentram de forma apressada, me cumprimentando sem que consiga entender qualquer palavra inicialmente. Fecho a porta atrás de mim, pronto para o massacre de perguntas que viria a seguir.

-Se comportou bem, filho?- questiona minha mãe.

-Deu tudo certo enquanto estávamos fora?- indaga meu pai.

Estou prestes a me virar quando a campainha toca novamente, apressado abro a porta, sem cerimônia Abigail adentra novamente como se aquela fosse a primeira vez e se vira na minha direção.

- Bom dia Gabriel, como está a sua alergia?- questiona preocupada.

-O que você está fazendo aqui?- questiona meu pai exaltado, Abigail não era a garota favorita dos meus pais, sempre haviam deixado isso claro, sua presença ali geralmente não era bem-vinda.

-Alergia?- indaga minha mãe, porém esta com um ar de preocupação, Abigail imediatamente se curva em sua direção, percebera que aquele era o ponto fraco na relação.

-Sim senhora, estávamos ontem a noite visitando os estandes de flores, haviam várias espécies super diferentes, e aparentemente o seu filho e alérgico a uma delas, deve ter passado a mão na hora de cheirá-las e passou no pescoço, coitado, ficou todo empolado, olha como está ainda hoje.- diz seríssima apontando para as manchas em minha pele.

-Oh, coitadinho.- Minha mãe vem em minha direção e me abraça.- Ainda está coçando muito?

-Não...- Respondo atônito ao plano de Abigail, então percebo que minha reação fôra pouco convincente- Digo, ontem foi horrível, mas hoje já está melhor, só ficaram as manchas mesmo.

-Ah, que bom. -Diz ela me soltando.- E o dono dessas flores, aonde está?

-Senhora, a festa das flores está no fim, ele já foi embora provavelmente.- explica a garota prontamente.

-Acho bom mesmo, se ainda estivesse por aí ele iria me ouvir.- afirma exaltada

-Isso aí.- incentiva Abigail, quem a ouvia falando jamais imaginaria que tudo não passava de uma grande mentira. Aquilo deixava claro uma coisa, Abigail era esperta, jamais seria pega no pulo do gato.

-Está bem, garota. Já viu o Gabriel, agradecemos a preocupação, agora pode ir embora.- diz meu pai rígido. A mensagem era clara, ele a queria fora dali, e principalmente longe de mim.

-Tudo bem, estou indo, tchau senhor e senhora, e tchau Gabriel, até amanhã na escola.- percebo um sutil deboche quanto ao fato de que nos veríamos no dia seguinte, querendo meu pai ou não. E com isso ela parte.

Abigail, por mais estranho que parecesse chamá-la assim, era meu anjo da guarda, por conta dela estava seguro para mais um dia. Mal podia esperar para correr pro quarto, lhe agradecer e ouvi-la se gabando.

Meu Demônio (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora