Sexta-feira, mais de uma semana havia se passado desde a última vez que havia visto Heitor, preocupado mandava mensagens para o garoto mas raramente ele as vizualizava, porém nunca respondia, bem, exceto uma. No segundo dia depois de passar a manhã anterior com Abigail desabafando envio uma mensagem para Heitor.
"Oi, não sei como está, posso ir na sua casa para conversarmos?" Peço, sua resposta vêm com uma mensagem direta.
"Não, me desculpe mas não estou afim de conversar, estou sem cabeça pra isso" diz ele, estranho sua postura.
''Tem certeza?"
"Talvez fosse bom desabafar e estou com saudades"
"Seja o que for, podemos dar um jeito"Mando várias mensagens porém o garoto não responde nada, suspiro frustrado, não queria invadir seu espaço.
"Tudo bem, quando quiser conversar estou aqui. Te amo" digo finalmente, insistir seria um erro, ele não precisava de mais um incômodo.
Minha rotina naqueles dias também mudara drasticamente, em casa bloqueava basicamente todo e qualquer contato possível, minha mãe em toda oportunidade possível fazia questão de tentar me convencer a ver o lado do meu pai. No fim das contas mesmo sem ter discutido com Cassandra ela era tão culpada quanto meu pai pelo que havia acontecido, seus ideais eram tão podres quanto os dele.
Havia passado a almoçar em horários alternativos, até mesmo passar fome era melhor do que ouvir suas investidas contra a "amizade" de Heitor.
Na sexta-feira anterior meu pai tentara me convencer a ir ao culto e pela primeira vez meus pais ordenaram um culto sem minha presença, aqueles poucos porém longos dias haviam feito de mim uma pessoa ácida, minha saliva parecia ter se tornado veneno. O que sentia em raiva dentro de casa eu sentia em tristeza quando estava fora.
Abigail tentava me animar mas havia chegado a um ponto em que quase preferia ficar sozinho.
A vida não era mais a mesma, no fim nem ao menos sabia se podia chamar aquilo de vida, eu basicamente existia, e era isso que estava disposto a mudar naquela sexta-feira. Havia deixado Heitor ter seu tempo, mas depois uma semana sabia por experiência própria que o garoto estava em um exílio, não me importava se teria que entrar a força, iria na casa de Heitor vê-lo.
O alarme que anunciava o fim do horário letivo soa como um sinal de liberdade para aulas que nem ao menos havia tentado prestar atenção.
Eu e Abigail saímos pelos corredores, ela não parecia ter tanta pressa para sair quanto eu, relutante acompanho seu ritmo.
-Então, tem algum plano pra hoje a noite?- indaga ela pensativa.
-Eu? Não, meu pai deve querer que eu vá para o culto mas acho que não vou.- digo irritado com a idéia.
-Ele não vai ficar bravo?- indaga ela já ciente da situação.
-Problema dele.- digo fechando o punho.
-Esse é meu garoto!- exclama ela contente batendo em meu ombro.
Quando chegamos ao fim do pátio me despeço da garota e viro na direção ao portal do condomínio de Heitor, nesse momento perco a respiração.
Tímido e quase escondido por detrás dele o garoto está parado, me encarando, seus olhos trazem um misto de medo e dúvida. Ele vestia uma camiseta regata, bermuda e sapatos de exercício, parecia ter descido o trajeto até ali correndo. Sem perder mais um segundo disparo até ele, o homem da um passo para trás antes de abraçar sua cintura com força. Seus braços ao contrário permanecem retraídos.
-Hum... Oi.- diz com uma certa solenidade na voz.
-Eu estava com tanta saudade.- digo, ali em seu aconchego me atento em pequenos detalhes, seu cheiro, o calor de sua pele, seu coração batendo acelerado a respiração que ele parecia prender, tenso.
Tensão, Heitor estava receoso, por quê? Finalmente me desvencilho de seu abraço para encarar seus olhos, estes pareciam caídos e abatidos.
-O que foi?- pergunto sem jeito.
-Como assim o que foi?- indaga o garoto desviando o olhar.
-Você não está bem, está triste.- percebo em seu rosto.
-Não, eu estou bem.- diz ele fingindo um sorriso.
-Não minta pra mim.- digo, o garoto dá um passo para trás.- A sua mãe está sendo muito dura com você? Está te obrigando a ficar em casa? É por isso que está sem vir pra escola a tanto tempo. Me conte, por favor.
Heitor suspira incomodado.
-Não é isso, a minha mãe não me proibiu de nada, a culpa não é dela, eu só precisei de um tempo pra... Pensar nas coisas.- diz ele desconfortável.
-Eu entendo, o que meu pai disse deve ter machucado bastante, me desculpa.- peço, sabia que aquele jantar havia sido uma má idéia e que deveríamos tê-lo evitado.
-Não tem problema, o que ele disse nem me afetou tanto assim e...- começa ele tentando me animar porém se retrai, percebo que o garoto havia se traído nas palavras.
-Espera aí. Se não foi o que ele disse, por que se afastou?- indago, Heitor imediatamente fica nervoso, então põe a mão sobre meu ombro.
-Gabriel, eu prometo nunca mais sumir e fazer o máximo pra tentar consertar as coisas, mas por favor, esqueça isso, é algo que nem eu quero lembrar.- pede o garoto, lhe encaro, seu rosto suplicava por aquele voto de confiança, dou de ombros.
-Tudo bem, eu não importo contanto que tenha você.- digo sorrindo, ele retribui me puxa para um abraço.
Quando me solta, percebo algo mais em sua expressão, o garoto refletia sobre algo.
-Então...- começa ele.- Quando é o próximo culto do seu pai?
-Ah, é hoje a noite. Ele vai querer que eu vá mas se quiser fazer alguma coisa hoje a noite...- começo mas sou interrompido.
-Me espere por lá.- afirma Heitor, abrindo um sorriso.
-Como é?- pergunto confuso.
-Isso mesmo que ouviu, vou dar uma passada no sua igreja, se esse for o preço a ser pago pra poder te ver e dobrar o seu pai, que seja, por você vale a pena.
-Está bem.- digo atônito, não sabia o que pensar daquilo, não gostava da idéia de aproximar meu pai de nós, mas talvez aquele fosse um bom motivo para fazer com que ele confiasse em Heitor novamente.
O garoto então olha ao nosso redor, sem ninguém ali se aproxima e dá um beijo em minha bochecha.
-Está certo então, até hoje a noite.- diz se virando e correndo de volta para sua casa, lhe observo se afastar sem uma reação condizente com a situação.
-Até.- digo vendo seu sua silhueta sumir na esquina.
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Meu Demônio (Romance Gay)
RomanceGabriel prometeu a si mesmo nunca se apaixonar, o que as pessoas diriam se descobrissem que o filho do pastor é gay? Apenas a idéia de prejudicar seu pai o fazia estremecer. O tímido rapaz passa seus dias focado, deixando sua vida de lado enquanto...