O Acerto de Contas

120 14 1
                                    

Caio observava Irene hesitar à porta do quarto, como se carregasse o peso de anos de ressentimento nos ombros. Ela segurava a pequena filha nos braços, mas seu olhar estava fixo em Caio, cheio de algo que ele nunca havia visto antes - vulnerabilidade.

- Ela está bem? - Preocupou-se, enquanto admirava a loira embalar a filha nos braços.
Ela assentiu com a cabeça e o encarou novamente.

- Sim, ela está. Graças a você. - Reconheceu. - Nós podemos conversar? - A voz dela era baixa, quase suplicante.

Ele assentiu, ajustando-se na cama para se sentir melhor, mesmo que o pé enfaixado protestasse. Irene entrou, segurou firmemente a bebê em seus bracos e puxou uma cadeira para sentar perto dele.

- Eu não sei por onde começar - disse ela, entrelaçando os dedos nervosamente. - Mas preciso falar, Caio. Preciso que você me ouça.

Ele permaneceu em silêncio, permitindo que ela prosseguisse.

- Eu te machuquei. Sei disso. Desde que entrei na vida de vocês, fui dura, injusta... cruel, às vezes. - Ela fez uma pausa, como se as palavras ardessem ao sair. - E não era porque você merecia. Não era porque eu queria. - Seus olhos marejaram. - Era porque eu tinha medo.

Caio franziu o cenho.

- Medo?

[• Nova Primavera (MS), 1998 •]
A casa estava mergulhada em silêncio, exceto pelos sons distantes do vento contra as janelas. Depois de fazer Daniel e Petra dormirem, Irene andava de um lado para o outro no corredor, hesitante, algo tirava a sua paz, mas ela não sabia o que era, até parar diante da porta do quarto de Caio, antes de sentir o coração martelar no peito.
Antônio ainda não havia chegado em casa, e ela sabia que precisava agir. Empurrando a porta devagar, Irene entrou no quarto mal iluminado. Caio estava encolhido na cama, o rosto pálido e coberto de suor. Ela se aproximou com cuidado, tocando sua testa e sentindo o calor abrasador.

- Meu Deus... - Sussurrou, o pânico ameaçando tomá-la.

Ela saiu apressada, pegou um pano úmido e voltou, sentando-se ao lado dele. Com mãos trêmulas, começou a limpar seu rosto e ajeitar os cobertores.

Caio abriu os olhos lentamente e piscou, pensando reconhecê-la.

- Mamãe...? - murmurou, a voz fraca e sonolenta, do garotinho franzino de apenas sete anos.

Irene congelou. Por um momento, quis corrigir o engano, mas as palavras morreram em sua garganta. Ao invés disso, ela apenas sorriu, tentando esconder as lágrimas que ameaçavam cair.

- Shhh... está tudo bem. Eu estou aqui - sussurrou, enquanto continuava a passar o pano fresco sobre sua testa.

Ele fechou os olhos novamente, relaxando sob o toque dela. Irene ficou ali por horas, vigiando-o, trocando os panos e murmurando palavras suaves quando ele começava a se agitar no sono. Enquanto o tempo passava, a mente dela ficava cada vez mais turbulenta. Ela não deveria estar ali. Não deveria se apegar tanto a um menino que a lembrava constantemente de Ágatha, a mulher cujo lugar nunca conseguiria ocupar no coração de Antônio. Mas, naquele momento, nada disso importava mais do que mantê-lo seguro.

[• Nova Primavera (MS), 2024 •]

- Sim. Medo de nunca ser suficiente. Medo de sempre ser uma intrusa. - Ela desviou o olhar, encarando o chão. - Seu pai amava tanto a sua mãe... a Agatha... Eu via nos olhos dele. E você era parte desse amor. Uma lembrança viva de tudo o que eu nunca poderia ser para ele.

Antorene: The After Onde histórias criam vida. Descubra agora