Solidão

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 Sophie

Flashback

Eu nunca havia me sentido assim antes. Já não tinha mais certeza do que iria fazer a partir daquele momento. Uma parte minha tinha ido, junto ao meu pai. Ele sempre foi e sempre será minha base. Talvez eu tenha o prometido que cuidaria de mamãe a sua falta e isso me pegou em cheio. Eu preciso dela, ainda mais agora, talvez ela esteja ainda mais triste do que eu, mas eu não sabia. Sentia falta de chorar nos ombros de alguém. Sentia falta de ter alguém.

— Voltei! — Todo instante entrava alguém em meu quarto, mas eu sempre esperava pela enfermeira de olhos azuis, sempre sorridente e prestativa. Eu gostava dela, muito mesmo. — Estou a procura de uma garotinha para fazer exames! — Eu pude ter soltado um sorrisinho nasal, mas foi apenas nervoso. Eu odiava exames. Por mais incrível que posso parecer esse era o ponto alto dos meus dias nesse hospital.

— Não, por favor! — Fiz manha ao tentar me levantar. Já se tornou parte da minha rotina fazer exames, mas até que parecia legal dar um role pelos corredores do hospital.

— Vamos! Sem gracinha, mocinha! — Me ajudou ao me sentar em uma cadeira de rodas. Seguimos em silêncio para fora do quarto. Eu particularmente gostava de passear pelos corredores. Eu sempre olhava para dentro dos quartos para ver se encontrava a minha mãe ou alguém que conhecesse, mas não encontrava ninguém.

— Você acha que podemos ir ver a minha mãe hoje? — Eu precisava saber sobre ela. Afinal eu tinha certeza que ela estava preocupada comigo também. Eu espero que ela esteja bem.

— Sophie, você é bem novinha para entrar onde ela está! — Ela nem sequer me olhou, mas eu pude ver o peso em seu olhar. As pessoas ao saberem de minha história ficavam assim, eu não gostava, mas gostava quando elas me abraçavam e sentiam compaixão, quando elas fingiam se importar.

— Mas você sabe me dizer se ela está realmente bem? —  A encarei e ela parou a cadeira em frente a costumeira sala cinza e fria.

— Você precisa pensar positivo! — Eu pensava positivo, o tempo todo, mas eu não posso viver assim, ao leu, sem respostas sobe ela. — Mas se você quiser eu posso tentar saber...

— Obrigada! — Ela afagou meus cabelos castanhos e curtos enquanto aguardávamos a liberação para entrar.


— Viu, foi bem rápido! — Ela sorriu estendendo a mão para me ajudar a levantar da cadeira de rodas e subir na minha cama. 

— Não, foi nada rápido! — Estava brava, aquilo demorou muito. — É porque não era você com trezentas agulhas no seu corpo! — Foi uma grande tortura.

— Que exagero! — Aqueles olhos azuis me encaravam, realmente aquela enfermeira estava me trazendo uma calmaria tão grande, ela seria uma grande amiga. Ficamos em silencio, enquanto ela escrevia algo em minha planilha.

— Você conseguiu noticias de minha mãe, ela está bem? — Ela me encarou com uma expressão mais ou menos preocupada, como se tivesse esquecido do que pedi para ela mais cedo. 

— Ainda não. Me desculpe. — A enfermeira loira se aproximou de onde eu estava. — Mas não se preocupe, tudo ficará bem! 

— Como não me preocupar? — Era como se quisesse chorar naquele momento, como se minha voz falhasse. — Ela é a única família que tenho! — Senti meus olhos ficarem cheios de água. Ela se sentou ao meu lado na cama, mas parecia não sentir o tanto que sinto, nem sequer parecia me entender. 

— Calma, eu te entendo! — Talvez ninguém entenda. — Eu irei saber sobre ela e te informarei, mas preciso de um tempo. Tudo ficará bem! — Ela me encarou por alguns instantes e eu senti compaixão em seu olhar. — Eu tentarei, agora! — A enfermeira falou com uma voz engraçada . Isso me fez sorrir. Ela ficou ali parada ainda me observando, mas logo saiu do quarto.

Ela saiu me deixando sozinha e era exatamente assim que me sentia. 

Minha mãe tenta ser uma boa mulher, mas tem algo que a impede. Não sei, mas eu sinto que estarei perdida. Talvez ela fique melhor agora, ela se comporte como uma mãe de verdade.

 Mamãe espero que você veja que a vida é curta demais. A alguns dias atrás papai estava aqui comigo, brincando. Me levou ao parque e andamos de patins, ficamos rindo, deitados na grama olhando o sol se pôr, mas hoje ele é apenas uma lembrança, uma das lembranças mais lindas que terei. 

Eu sofro por você mamãe. Quando te vejo bebendo, é como se fosse uma facada em meu peito. Eu sinto raiva, do que você está fazendo, não de você. Eu ainda te amo. Sinto muita raiva quando mamãe troca sua família por uma garrafa. Eu adoraria ver ela sozinha, talvez assim ela acorde, mas não consigo deixá-la partir. Se ela escapar dessa, eu a ajudo sair desta vida, é uma promessa. Lutarei com todas as forças para tirar ela desse vício. Eu me lembro ela estava alcoolizada no momento do acidente. Eu escutei o seu grito na hora da batida, foi horrível. Ela e meu pai discutiam muito. Ela foi para cima dele, e o carro saiu da pista, e entrou na contra mão. Então veio um clarão muito forte em meus olhos, e então um grito abafado da minha mãe, essa foi minha última lembrança.

 Mamãe, por favor, resista. Eu vou te ajudar a sair dessa. Eu gosto de você, por mais que você tenha começado tudo isso aqui dentro. Eu sei que você vai ser uma boa mulher, mas por favor mamãe deixe a garrafa de lado por amor a sua filha.

A enfermeira foi em busca, e ela conseguiu, as notícias não foram boas. Foram péssimas. Quando ela entrou pela porta novamente, depois de alguns minutos, sua afeição já não era muito boa. Eu sentia que algo estava errado, e senti em minha garganta um nó se formar.

— O que aconteceu? — Ela estava sem jeito, meio que desconfortável.  — O que aconteceu, me fale! — Já sentia o que estava acontecendo. Já sabia o que vinha pela frente. Não estava pronta.

— Calma! — Veio em minha direção. E me abraçou. — Só não sei como explicar isso.

— Não explique apenas diga, por favor! — Eu sabia de certa forma do que se tratava, o aperto em meu peito era forte. Não tinha espaço para pensar positivo. Isso doía mais do que tudo. Uma parte de minha tinha ido embora. Uma parte do meu coração foi destruída.

— Ela não resistiu, sinto muito, a cirurgia era de risco. Ela se foi, mas pode ter certeza que te amava muito. E ainda te ama, de onde estiver que esteja.... — Ela dizia coisas, mas parei de prestar atenção quando ela disse ela se foi. Como assim? Ela me deixou, não que fosse muito presente em minha vida, mas e agora o que será de mim? Já não enxergava, estava tudo escuro. Por que, mamãe? Por que me deixou? Só sentia minhas lágrimas, e só escutava meus pensamentos. Estava sozinha, estava sozinha para sempre.

get lost and find yourselfOnde histórias criam vida. Descubra agora