Filha

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Sophie

Minha filha, Sophie! As palavras ricochetearam pelo meu corpo e se apunhalaram em meu coração. Lutando contra as lágrimas eu sai correndo do quarto de Demi, eles não me notaram, mas isto é muito novo para mim, isso ainda me dói.

Existe duas formas de lidar com o medo, você pode correr dele ou você pode enfrenta-lo. Tudo o que é novo me assusta, não que eu não goste de novidades, pelo contrario, mas isso não é uma simples novidade, é uma nova vida. 

— Sophie, você está bem? — A voz de Demi ecoava do outro lado da porta, me fazendo despertar do meu mar de pensamentos. — Posso entrar? — Sua mão estava girando a maçaneta, percebi que estava com os olhos marejados por lágrimas, as limpei rapidamente.

— Claro! — Eu sabia que ela entraria de qualquer forma, abri a porta para ela. Wilmer também estava lá. Não fingi que estava tudo bem. Os encarei.

— Sophie, você está chorando?! — Eu nunca gostei de chorar na frente dos outros, isso me faz parecer que sou fraca. Sorri tentando mostrar que estava tudo bem, mas continuei os encarando com a cara de choro, percebi que Demi também estava chorando a pouco tempo atrás.

— Foi por conta do que aconteceu? — Encarei Wilmer e neguei em silêncio. Um frio na boca do meu estômago tomou conta do momento.

— Não. — Se aproximei dos dois. — Na verdade, eu escutei Demi me chamando de filha! — Vi o brilho dos seus olhos sumindo e apesar de parecer ter gostado do termo, senti medo. Demi se aproximou de mim e eu fiquei com medo da sua reação. — É tudo muito novo para mim! — Ela assentiu.

— Eu te entendo, Sophie! — Wilmer me deu sua mão. Demi se abaixou a minha altura. 

— Eu não quero uma mãe nova! — Talvez isso tenha soado de maneira rude, pois os seus olhos se tornaram brilhantes por lágrimas cristalinas que se formavam. Ela endireitou sua coluna e repousou seu pescoço sobre o ombro de Wilmer. 

— Demi e eu nunca iremos substituir seus pais! — Eu os olhei. Imaginei que estava sendo muito má agradecida, Wilmer respirou fundo. — Naquele hospital Demi e eu, nos apaixonamos por você, uma menina muito especial que havia sofrido uma fatalidade, sua história naquele momento me comoveu, eu não poderia te deixar sozinha. — Senti o pesar cair sobre meus ombros e me sentei na cama. Eu deveria agradecer mais. — Fui te conhecendo aos poucos e a cada dia você se tornava uma parte minha. — Poderia já estar emocionada por Demi ter me chamado de filha, mas nesse momento, eu não continha o nó que havia se formado em minha garganta. Ninguém nunca se importou tanto. — Onde eu estaria com a cabeça, em deixar uma parte minha para trás? — Ele brincou querendo me fazer rir e conseguiu. — Sophie, eu já te vejo como minha filha e eu te amo! — Levei minhas mãos ao rosto e meu choro se intensificou. Em tempos que não ouvia um eu te amo de alguém e nesse momento foi arrebatador. Senti alguém se sentar ao meu lado, mas não tirei as mãos de meu rosto, eu estava envergonhada por chorar. — Eu não peço nada em troca, fora que me obedeça e fique longe de garotos por um bom tempo e seja uma filha estudiosa. — Senti sua mão acariciar meus cabelos e as mãos de Demi sobre os meus braços. Demi gargalhou e também pude sorrir com a sua brincadeira. 

Era uma das poucas vezes na vida que me senti especial, que me senti amada.

— Eu amo vocês! — Demi me abraçou de lado e eu tirei as mãos do rosto a abraçando de volta e por um breve momento senti o melhor abraço do mundo. — Só que ainda é difícil pra mim me ver parte desta família...

— Sophie, você faz parte desta família! — Demi rebateu.

— Você faz parte de nós agora! — Eu não saberia explicar isso, eu nunca iria saber como colocar em palavras aquilo que estava sentindo. Não era algo como não estar ali, ou não me sentir bem naquele lugar, pelo contrário eu os amava. Eu não queria esquecer aqueles que me colocaram no mundo, eu não posso tirar isso deles, apesar de sentir que seria a solução dos meus problemas.

— Will pode nos dar licença? — Ele assentiu. Beijou o topo da minha cabeça, como fazia com quem ele amava. 

Me levantei e fui até a janela do quarto. O reflexo da piscina estava ainda mais vibrante. Demi se aproximou e observou o quanto a água era cristalina, como suas lágrimas. Mexeu em meu cabelo, o que de alguma forma me tranquilizou.

 Eu te chamei por esse rótulo, filha, pela primeira vez. Não existe nenhum pretexto para isso, é simplesmente porque você é isso para mim. Você não é minha filha adotiva. Você é completamente e para sempre minha filha. — Enquanto ela penteava meus longos fios, lágrimas escorriam pelo meu rosto. Sentia falta disso, desse toque, desse cuidado e eu tinha com ela. — Quando eu dei à luz seus irmãos, me tornei uma mãe, aprendi a amá-los como uma mãe ama. Num momento eles não existiam, e no próximo momento eu os amei mais do que a vida. O dia de hoje não é assimHoje me lembra mais quando me casei com o seu pai. Nós nos conhecemos. Então eu me apaixonei por ele, sabia que passaria o resto da minha vida com ele. E então veio o dia do casamento. Os papéis foram assinados, os nomes foram mudados, cerimônias foram feitas, mas eu não o amava mais do que eu amava no dia anterior. Ele era o mesmo. Eu era a mesma. Nada tinha mudado. Mas tudo tinha. Depois desse dia, nós pertencemos um ao outro, oficialmente e para sempre! —  Aquelas palavras me machucavam mais do que tudo o que já havia me acontecido durante toda minha vida. Parecia facas que penetravam meu coração, era tão doloroso e maravilhoso ouvir. Estava feliz e ao mesmo tempo incerta de tudo. Eu a amava, mas ainda era estranho para mim. — Acredito que nossa família a partir de hoje está completa. Talvez outros se juntem a esta pequena família. Mas, eu sei, eu sei que não importa o que aconteça, nós somos uma família agora. Para sempre! — Lágrimas ainda escorriam pelo meu rosto. Demi percebeu, eu me virei. Ela estava em lágrimas assim como eu. Suas mãos acariciam minhas bochechas. Ela ficou um tempo me olhando, sem dizer nada. — Se você aceitar, eu posso me tornar sua mãe, e você minha filha, embora isso já seja real para mim! — Eu a encarei, ela me entendeu, com um simples olhar eu pude perceber isso. — No seu tempo! — Seu sorriso fez o quarto brilhar. Me aproximei e a abracei, com toda minha força e amor. — Um dia você vai entender que amor de mãe não vem da barriga, vem da alma.

— Eu te amo, Demi! — Fechei os meus olhos e deixei minha alma falar. Demi me apertou em seu colo, como se nossa união em forma de abraço pudesse curar todas as feridas e podia, pelo menos as minhas, no fundo o que eu mais precisava era de um abraço assim.

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