Entre o Tempo e a Memória

0 0 0
                                    


Gabriel:

O tempo na favela é uma linha tênue, onde as memórias se entrelaçam como raízes de uma árvore antiga, profundas e marcadas pelo sofrimento. Cada dia que passa é uma nova oportunidade, mas também uma lembrança das batalhas travadas. “Entre o tempo e a memória,” eu pensava, “nós encontramos o significado da nossa luta.”

Caminhando pelas ruas, cada esquina trazia consigo ecos do passado. Os risos de crianças brincando, as vozes das mães chamando pelos filhos, e as histórias sussurradas nas vielas. Cada momento se tornava uma peça do quebra-cabeça que formava minha vida, e eu sabia que, para entender meu presente, precisava revisitar meu passado.

“Às vezes, sinto que o tempo é um ladrão,” eu dizia para a Ana, enquanto nos sentávamos em um dos bancos da praça. “Ele leva nossos sonhos, nossas esperanças, e deixa apenas as cicatrizes.” Ela olhou para mim, um sorriso triste nos lábios. “Mas também nos dá sabedoria, Gabriel. Cada lembrança é um ensinamento. O que somos hoje é fruto do que vivemos.”

Assim, lembrei das tardes em que eu passava na laje, observando o pôr do sol, sonhando em ser mais do que a vida me oferecia. Era ali, entre os telhados, que eu conheci a essência da minha poesia. “Recordo das promessas feitas a mim mesmo,” continuei, “de nunca deixar o tempo me vencer. Sempre que olho para o passado, vejo a luta de cada um de nós, a força que temos para continuar.”

As memórias não eram apenas lembranças; eram também feridas abertas que nunca cicatrizariam completamente. Lembrei do Júnior, meu amigo que se foi muito cedo. “O Júnior tinha sonhos grandes, e a vida não deu tempo para realizá-los,” eu disse, a voz embargada. “Mas ele me ensinou que a memória é o que permanece. Eu carrego ele comigo em cada verso que escrevo, em cada batalha que enfrento.”

Ana assentiu, compreendendo a profundidade do que eu dizia. “E você, Gabriel, é um guerreiro. As memórias são suas aliadas. Elas te empoderam, te lembram de onde você veio e para onde quer ir.” Eu sabia que ela tinha razão. Cada lembrança, mesmo as mais dolorosas, moldavam quem eu era.

Naquele momento, decidi que precisava colocar essas memórias em palavras. “Vou escrever um poema sobre o tempo e a memória,” eu disse, pegando meu caderno. “Preciso capturar essa essência, essa luta que nos define.”

“Entre o tempo e a memória, eu caminho,
Com os olhos voltados para o passado e o futuro em meu caminho.
As lembranças me guiam, como luz na escuridão,
E me mostram que a vida é uma eterna transição.”

As palavras fluíam, e eu me sentia mais próximo da verdade. O tempo pode roubar muitas coisas, mas a memória é nossa defesa. “Eu sou a voz dos que se foram, dos que lutaram e não desistiram,
E em cada rima que escrevo, a história continua a ser dita.”

Os ecos das memórias ressoavam em minha mente, cada um carregando o peso de uma vida, de uma história. A favela era mais do que um lugar; era um lar repleto de memórias, de amores e de perdas. E enquanto o sol se punha no horizonte, percebi que, mesmo que o tempo passe, nossas memórias nunca nos abandonam.

“Entre o tempo e a memória,” eu sussurrei para mim mesmo, “eu escolho viver. Eu escolho lembrar. Eu escolho ser a voz da favela, a voz de todos nós.”

---

Negro DRAMAOnde histórias criam vida. Descubra agora