Capítulo 57: Pra Quem Vive na Guerra, a Paz Nunca Existiu
As ruas da favela eram um campo de batalha, um cenário onde a guerra se desenrolava dia após dia, sem fim à vista. Para nós, que respirávamos a poeira e a angústia do lugar, a paz era uma miragem, algo que só existia na mente de quem nunca havia conhecido o horror do que era viver ali. Acordar ao som de tiros, sirenes e gritos não era apenas parte do cotidiano; era a nossa realidade, nossa condenação.
Enquanto eu ajudava Luiz a se recompor, as memórias da infância me assaltavam. Lembro-me das tardes em que corríamos pelas vielas, brincando de esconde-esconde, acreditando que tudo era possível. Mas aquela inocência foi arrancada de nós, substituída pelo peso da sobrevivência. “A paz nunca existiu pra gente,” pensei, olhando para o céu nublado que parecia refletir a tristeza da nossa luta.
Luiz se apoiou em mim enquanto tentávamos nos afastar da cena do crime. Cada passo era um esforço monumental, e a dor que ele sentia ressoava em mim. “Mano, eu não sei se vou conseguir,” ele murmurou, a voz embargada. Aquelas palavras cortaram meu coração, mas eu não poderia deixar que ele sucumbisse. Não na minha frente.
“Vai dar certo, confia em mim,” eu disse, tentando me manter firme. Eu sabia que as palavras não eram suficientes para curar as feridas, mas eram tudo o que eu tinha. Em meio à guerra que travávamos, a esperança era um ato de rebeldia, um grito contra a opressão.
À medida que caminhávamos, as lembranças de amigos perdidos e sonhos esmagados invadiam minha mente. “Quantos já se foram por causa disso?” pensei. A resposta era dolorosa e esmagadora. Naquele momento, percebi que a paz era um luxo que não podíamos nos permitir. Cada dia era uma luta, e para quem vive na guerra, a paz era um conceito distante, um eco que ressoava em nossos corações feridos.
Chegamos a um beco onde algumas almas sobreviviam à sombra da opressão. A luz fraca das lamparinas mal iluminava os rostos cansados que se escondiam nas sombras. “Tô com você, irmão,” alguém disse, reconhecendo Luiz e oferecendo ajuda. A solidariedade entre nós, mesmo em tempos sombrios, era um sinal de que ainda havia humanidade naquelas ruas.
“Aqui, senta,” disse o rapaz, ajudando Luiz a se acomodar em uma parede fria. “Vou chamar alguém pra ajudar.” O gesto era pequeno, mas significava o mundo em um lugar onde a desconfiança e o medo frequentemente se sobrepunham.
Enquanto esperávamos, um silêncio pesado se instalou. O ar estava impregnado com o cheiro de fumaça e tristeza. “O que vai ser de nós?” Luiz perguntou, sua voz quase um sussurro. Eu não tinha uma resposta. A verdade era que a guerra nos havia moldado, e a paz parecia ser um sonho inalcançável.
“A gente vai ter que lutar,” eu disse, mais para mim mesmo do que para ele. Lutar contra o sistema, contra a desigualdade, contra a violência. Porque no final das contas, a verdadeira guerra era aquela que travávamos dentro de nós mesmos, a batalha constante entre a esperança e a desilusão.
O tempo passou como um rio turbulento, levando nossos sonhos e esperanças. Mas em meio a tudo isso, ainda havia um fio de resistência. Eu sabia que, mesmo na guerra, a luta pela vida era uma forma de resistência. “Pra quem vive na guerra, a paz nunca existiu, mas a luta nunca vai acabar,” eu pensei, decidido a seguir em frente, por mim e por Luiz.
A vida na favela não era um mar de rosas, mas era a nossa vida. E mesmo que a guerra fosse constante, ainda éramos guerreiros, e isso era algo que ninguém poderia nos tirar.
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Negro DRAMA
Ficción histórica"O Peso do Silêncio" é um romance visceral que mergulha nas profundezas da vida na periferia, inspirado no icônico "Negro Drama" dos Racionais MC's. A história acompanha Gabriel, um jovem negro que luta contra o sistema opressor que já o condenou de...