Eu Também Não Consegui Fugir Disso aí

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Capítulo 64: Eu Também Não Consegui Fugir Disso Aí

Eu não consigo escapar da realidade que me cerca. A cada dia que passa, sinto que estou preso em um ciclo que parece não ter fim. A vida na favela é uma luta constante, e, por mais que eu tente, sempre tem algo que me puxa de volta para as ruas, para o crime, para o que eu jurava que nunca faria.

Lembro do dia em que tudo mudou. Estava com os meus amigos, jogando bola na quadra, quando um mano mais velho chegou com uma proposta tentadora. Ele falava de grana, de carros, de uma vida que parecia tão distante, tão diferente da minha. No início, eu resisti. Tinha o sonho de ser um rapper, de levar a voz da favela para o mundo. Mas a pressão era forte, e a tentação estava ali, bem na minha frente, como um ímã que me puxava.

Eu vi os caras da minha quebrada entrando nessa, e pensei que poderia ser diferente, que poderia me manter firme. Mas, cara, a realidade bateu na minha porta. A grana não entrava, as contas não paravam de acumular, e a música, que deveria ser meu escape, parecia distante, cada vez mais longe. Foi aí que eu me vi fazendo escolhas que nunca pensei que faria. O crime não estava nos meus planos, mas, às vezes, você precisa sobreviver.

Então, eu me envolvi. Era só um pequeno “trabalho”, eu dizia a mim mesmo, algo para me ajudar a pagar as contas e voltar a focar na música. Mas logo percebi que não era tão simples assim. O dinheiro rápido vem com um preço, e eu estava prestes a pagá-lo.

Cada vez que eu olhava para os rostos dos meus amigos, via a dúvida nos olhos deles. Uns se perguntando se eu ainda era o mesmo, outros se perguntando como eu poderia ter me deixado levar. O peso da culpa começou a me consumir, mas ao mesmo tempo, havia uma adrenalina, uma emoção que eu não conseguia ignorar. Era uma luta interna que eu não conseguia vencer.

Meus dias começaram a se confundir. Eu ainda sonhava em ser como os Racionais, em ser a voz da favela, mas cada passo que eu dava me afastava desse sonho. As letras que eu escrevia, as rimas que criava, agora estavam manchadas pelo que eu fazia. Como eu poderia ser um poeta da resistência se estava me perdendo em algo tão sujo?

O mundo do crime é sedutor, eu aprendi isso da maneira mais difícil. Ele te abraça, te faz sentir importante, mas é uma ilusão. A vida que eu sonhava para mim estava se desvanecendo, e eu me via cada vez mais preso nas armadilhas que a sociedade criou para mim e para os meus. Cada vez que eu saía para "trabalhar", uma parte de mim morria. Eu estava me afastando do que realmente importava.

E foi assim que a vida me pegou. Eu não consegui fugir disso aí, e, quando percebi, estava completamente imerso em uma realidade que eu sempre tentei evitar. Olhando para o espelho, não conseguia mais ver o garoto que sonhava em ser o próximo Neymar ou um rapper famoso. Agora, tudo que via era um reflexo de escolhas ruins, de um caminho que eu não queria seguir, mas que, de alguma forma, estava se tornando o único que eu conhecia.

A música ainda estava dentro de mim, mas as letras que eu escrevia agora tinham um peso diferente, uma dor que eu não conseguia mais ignorar. A vida na favela, a violência, as drogas, tudo isso fazia parte de mim, e eu estava lutando contra uma maré que parecia impossível de vencer. A luta era real, e a vida na favela, como eu aprendi, não era um mar de rosas. Era um campo de batalha, e eu precisava decidir de que lado eu realmente estava.

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