Uma Negra e uma Criança nos Braços

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Capítulo 69: Uma Negra e uma Criança nos Braços

Meu olhar se perdeu no horizonte, na mesma linha onde o sol se despedia do dia, e a escuridão começava a tomar conta da quebrada. Era um daqueles momentos em que o tempo parecia parar, e tudo que restava era a memória. A imagem da minha mãe, uma mulher negra e forte, me abraçando enquanto eu, ainda uma criança, me sentia seguro em seus braços. Era uma cena que se repetia em minha mente, um retrato gravado na minha alma.

Lembro-me da minha mãe como uma verdadeira guerreira. Ela trabalhava duro, sempre fazendo o possível para garantir que tivéssemos algo pra comer e um teto sobre nossas cabeças. Era ela quem me ensinava a valorizar cada pequeno momento, mesmo quando a vida parecia nos dar as costas. "Gabriel", ela dizia, "não importa o que aconteça, nunca se esqueça de quem você é e de onde você veio." Essas palavras ecoavam em mim como um mantra, uma bússola que sempre me guiava, mesmo nos momentos mais sombrios.

Naquela época, eu era apenas um menino, mas já entendia o peso do mundo nas costas da minha mãe. Ela tinha um brilho nos olhos que iluminava nossos dias, mas, por trás daquele sorriso, havia uma luta constante. Lembro de vê-la sentada à mesa, a expressão cansada, mas determinada, enquanto contava os trocados que tinha feito vendendo comida na rua. Eu olhava pra ela e sentia um aperto no coração, desejando que tudo fosse mais fácil, que ela pudesse descansar.

Era uma noite chuvosa e fria quando tudo mudou. A tempestade lá fora parecia refletir o caos que se instalava em nossas vidas. A lembrança daquele dia ainda me assombra. Estávamos em casa, e eu brincava com alguns brinquedos quebrados, quando a porta se abriu abruptamente. Ouvimos vozes altas, gritos, e minha mãe imediatamente me puxou pra perto dela. Ela me segurou com tanta força que quase me machucou, mas eu entendia. Era o instinto dela de proteger, de manter o filho a salvo, mesmo quando tudo ao nosso redor desmoronava.

O som da sirene cortou a noite, e a realidade bateu à porta. Havia policiais, agitação e medo. Vi a expressão de pânico nos olhos da minha mãe, e aquele olhar eu nunca mais vou esquecer. Ela se tornou um escudo entre mim e o mundo, e eu sabia que, por mais que tudo estivesse fora de controle, eu estava a salvo nos braços dela.

"Fica aqui, Gabriel", ela disse, sua voz tremendo um pouco. "Nada vai acontecer com você. Eu prometo." Era uma promessa que ela fez com todas as forças que tinha, mesmo que a vida estivesse prestes a testá-la de maneiras que eu não conseguia imaginar.

Aquela noite foi longa. Os gritos e o som de tiros ecoavam do lado de fora, mas a única coisa que eu conseguia ouvir era o coração da minha mãe batendo forte, como se estivesse lutando contra a tempestade que se aproximava. Eu estava assustado, mas o calor do corpo dela me dava uma sensação de proteção que eu não poderia explicar.

O tempo passou, e depois de muitas horas, a calma finalmente voltou. A tempestade foi embora, mas a noite deixou suas marcas. Vi minha mãe exausta, seus olhos cansados, mas ainda firmes. A força dela era uma luz que iluminava nosso caminho em meio à escuridão. Naquele momento, percebi que, embora as lutas fossem muitas, sempre haveria amor em nosso lar.

E assim, enquanto eu crescia, levei aquela cena comigo. A imagem de uma negra e uma criança nos braços, uma mulher que desafiou todas as adversidades e nunca deixou de lutar. A força da minha mãe se tornou a minha força, e eu sabia que sua história era a base da minha. Essa era a essência do que significa ser parte da quebrada: um ciclo de luta, amor e resiliência que ecoa através das gerações. E enquanto eu escrevia minha própria história, carregava comigo as lições dela, um legado que nunca seria esquecido.

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