Falo Pro Mano que Não morra e Também Não Mate

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Capítulo 53: Falo pro Mano que Não Morra e Também Não Mate

Gabriel:

A favela vive em um ciclo vicioso, onde a vida e a morte dançam em um ritmo frenético. “Falo pro mano que não morra e também não mate,” eu sempre dizia aos meus amigos, enquanto caminhávamos pelas ruas em meio ao cheiro de fumaça e promessa de perigo. As palavras pareciam simples, mas o peso delas carregava a história de tantas vidas perdidas.

Ouvindo as risadas e os gritos das crianças brincando, a cena era um contraste gritante com a realidade que muitos de nós enfrentávamos. Um dia, enquanto estava na esquina com o Luiz, o clima pesado parecia se intensificar. “Mano, eu sei que a vida é difícil, mas não vale a pena se deixar levar por isso. Morrer na favela não é um ato de bravura, é um desperdício,” eu falei, encarando-o nos olhos.

Luiz me olhou, seu semblante refletia uma luta interna. “É fácil falar, Gabriel. Você não tá na pele de quem precisa se defender.” Mas a verdade é que a defesa muitas vezes se tornava um ataque. Um ciclo que se retroalimentava, onde a resposta à dor era mais dor. “E você acha que isso vai mudar alguma coisa? O que seu mano tá fazendo agora pode te levar para um lugar sem volta,” eu insisti, a esperança que ardia em mim tentando apagar a chama da revolta.

“Eu só quero sobreviver,” ele respondeu, a frustração estampada em seu rosto. Eu entendi. O instinto de sobrevivência era forte, mas precisava haver um equilíbrio. “Sobreviver não é o mesmo que viver, Luiz. Não deixe que o medo e a raiva decidam seu destino.” Minhas palavras ecoavam, uma tentativa de reverter um futuro sombrio.

As ruas da favela eram um labirinto, e a saída nem sempre era visível. “Olha, quantas vidas se foram por conta disso? O Tico, o Peco… Eles eram manos como nós. E no final, o que restou? Só memória.” O silêncio caiu entre nós, pesado e reflexivo. Ouvíamos os sons da vida, mas a morte também pairava, como uma sombra que nunca se afasta.

“Então, o que você sugere?” Luiz questionou, sua voz um misto de ceticismo e curiosidade. “Viver com medo?” A verdade é que eu não tinha todas as respostas. O que eu sabia era que sempre havia outra opção, mesmo que fosse a mais difícil. “A gente precisa mudar essa narrativa, mano. A gente precisa viver por nós e pelos nossos, não deixar que o sistema decida nosso fim.”

Comecei a falar sobre os sonhos, as aspirações que muitos enterravam ao optar pela violência. “A gente pode ser muito mais do que isso. A vida é uma escolha, Luiz. Não deixe que o medo te faça escolher a morte.” Ele balançou a cabeça, ainda em dúvida, mas parecia que as palavras estavam começando a fazer sentido.

“E se a gente tentar?”, eu sugeri. “Fazer algo que não seja sobre dor e raiva? Um projeto, uma ideia. Qualquer coisa que mostre que podemos ser diferentes.” A ideia parecia quase utópica, mas era a única maneira que eu via para quebrar o ciclo. “Falo pro mano que não morra e também não mate, porque a vida, no fundo, é uma luta. E lutar pela vida é a maior coragem que podemos ter.”

Concordando com um aceno, Luiz respirou fundo. “Talvez você esteja certo, Gabriel. Tem que ter um jeito de mudar essa realidade. Precisamos mostrar que a favela não é só isso.” As palavras soaram como um compromisso silencioso entre nós, um pacto de que, independentemente das circunstâncias, haveria uma busca por algo mais.

A vida na favela é difícil, mas não é só dor. É também resistência, sonhos, e a luta por dignidade. “E quem sabe, um dia, a gente possa olhar para trás e ver que valeu a pena,” eu finalizei, sentindo que, ao menos por um momento, as sombras da morte se dissipavam um pouco mais.

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