A Insana Vingança

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A vingança não nasce do nada. Ela é cultivada, alimentada pelas feridas mal curadas, pelo ódio reprimido, pela sensação sufocante de injustiça. Quando a vingança se instala no coração, ela não permite paz. Ela não oferece trégua. Só consome, exigindo ser saciada. E naquele momento, a vingança era tudo o que eu conseguia enxergar.

As palavras de Ana Beatriz ainda ecoavam na minha mente, cada sílaba impregnada de desdém, cada frase encharcada de desprezo. O riso dela, aquela risada debochada, tinha cravado uma estaca no meu peito. Eu não conseguia tirar aquilo da cabeça. Não conseguia esquecer o quanto ela tinha me feito sentir inferior, menos que humano. Como se minha dor, minha luta, não significassem nada.

Eu sabia que ela era uma garota privilegiada, que nunca tinha sentido o peso real do mundo nas costas. Ela andava pela vida com a confiança de quem nunca foi rejeitada, nunca foi desacreditada apenas pela cor da pele ou pela origem humilde. Para ela, o mundo sempre esteve de portas abertas. E era exatamente isso que me deixava tão furioso. Ela não tinha o direito de me julgar.

Mas naquele dia, não se tratava apenas dela. Ana Beatriz era o estopim, mas minha vingança não seria algo tão simples, tão direto. Eu queria que ela sentisse o que eu sentia todos os dias. Queria que, pela primeira vez na vida, ela soubesse o que era ser tratada como nada, como alguém que não pertencia, que não merecia estar ali.

Os planos começaram a se formar na minha cabeça como uma tempestade, caótica, intensa, mas clara. Eu sabia que precisaria ser calculista. A vingança que eu queria não era violenta. Não era física. Eu queria algo mais profundo, algo que a destruísse por dentro, assim como ela havia me atingido.

O primeiro passo era simples: expor a verdade. Ana Beatriz tinha muitas faces, e a que ela mostrava para o mundo era apenas a ponta do iceberg. Por trás daquela postura de menina perfeita, existiam segredos. Segredos que ela fazia de tudo para esconder. E eu sabia exatamente onde começar.

Rayssa, a amiga que Ana Beatriz fingia tolerar, sempre soube demais. As duas se mantinham próximas por conveniência, mas havia um ressentimento latente entre elas. Um ressentimento que eu podia usar a meu favor. Sabia que Rayssa não resistiria à tentação de ver Ana Beatriz cair do pedestal que ela mesma tinha construído.

Eu me aproximei de Rayssa, e não foi difícil convencê-la a compartilhar o que sabia. Com algumas provocações e promessas sutis, ela começou a abrir a boca. A verdade era que Ana Beatriz vivia uma mentira. Seus privilégios não eram tão perfeitos quanto ela fazia parecer. Havia dívidas. Havia desespero. E, acima de tudo, havia uma vulnerabilidade que ela escondia a qualquer custo: a pressão imensa que sua família colocava sobre ela, o medo constante de fracassar e perder tudo.

Era isso que eu precisava.

O segundo passo foi divulgar essas verdades. Não de maneira explosiva, mas de forma sutil, quase imperceptível, deixando que as fofocas fizessem o trabalho por mim. Eu queria que as pessoas começassem a questioná-la, a olhar para ela de forma diferente, a duvidar da perfeição que ela sempre ostentava. Eu queria que ela sentisse o peso de ser observada, julgada, como eu era todos os dias.

Com o tempo, os olhares começaram a mudar. As pessoas ao redor de Ana Beatriz começaram a se afastar, a murmurar pelas costas. O mundo dela, antes tão seguro e estável, começou a desmoronar aos poucos. E eu assisti, silenciosamente, enquanto isso acontecia, sentindo uma satisfação que eu sabia que não deveria sentir, mas que era impossível de negar.

Ela começou a se fechar, a se isolar. Sua confiança, antes inabalável, estava rachando. E foi aí que eu soube que a vingança estava completa. Eu a tinha levado ao mesmo lugar onde eu estive por tanto tempo: sozinha, desconfiada, insegura.

Mas, no fundo, a satisfação que eu senti foi passageira. Porque, ao final de tudo, a vingança nunca cura a ferida. Ela só aprofunda a dor. E, olhando para ela agora, mais frágil do que nunca, eu percebi que, ao destruí-la, eu também havia destruído uma parte de mim.

Porque, no final, a vingança não devolve o que foi tirado. Ela só nos faz perder mais.

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