No Amor

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No amor, tudo parecia diferente. Era como se, por alguns instantes, o peso do mundo não existisse. Não havia cobrança, não havia drama. Apenas a sensação pura e crua de ser visto, de ser compreendido sem palavras. No amor, eu podia ser eu mesmo, sem as máscaras, sem a necessidade de brilhar ou me esconder. Era uma trégua da batalha cotidiana, um alívio momentâneo.

Mas o amor também carregava suas complexidades. Porque, mesmo quando a gente ama, as cicatrizes da vida permanecem ali, à espreita, prontas para aparecer quando menos se espera. E com Maria, era assim.

Ela era diferente de todas as meninas que eu já havia conhecido. No jeito de andar, no modo de falar, havia algo nela que me fazia sentir que, no meio de tudo o que estava errado, havia algo certo. Um espaço onde eu podia existir sem ser julgado, sem ser questionado.

O problema é que eu nunca soube como me entregar completamente a isso. Sempre que chegava perto de algo mais profundo, mais íntimo, o medo tomava conta. Medo de que, no fundo, ela me visse como todos os outros viam — como algo quebrado, imperfeito. Eu me perguntava se, algum dia, alguém poderia realmente amar todas as partes de mim, inclusive aquelas que eu mesmo tinha dificuldade em aceitar.

Ela era paciente, claro. Mais do que eu poderia esperar de alguém. Mas eu sabia que, em algum momento, minha distância emocional cobraria seu preço. No amor, como em tudo, havia um custo, e eu tinha medo de não estar disposto a pagá-lo.

Naquela noite, estávamos sentados no telhado da casa dela, como costumávamos fazer nos dias em que o mundo parecia nos engolir. O céu estava claro, as estrelas brilhando como pequenos pontos de luz, distantes, mas presentes. Eu sabia que ela estava esperando algo de mim. Talvez uma palavra, um gesto, algo que mostrasse que eu estava realmente ali, com ela, de corpo e alma.

Mas, como sempre, as palavras ficaram presas na minha garganta. O silêncio entre nós crescia, mas não era incômodo. Era como se ambos soubéssemos que havia algo maior que nós ali, algo que não precisava ser dito.

"Você pensa no futuro, Gabriel?" ela perguntou, quebrando o silêncio. Sua voz era suave, mas carregava um tom de curiosidade genuína.

Eu respirei fundo, tentando formular uma resposta que fosse honesta. "Penso. Mas não como você. O meu futuro parece... incerto. Sabe? Como se eu estivesse caminhando em cima de uma corda bamba, sem saber se vou cair ou chegar do outro lado."

Ela assentiu lentamente, como se entendesse o que eu estava dizendo. "Eu também me sinto assim, às vezes. Como se o mundo estivesse sempre esperando que a gente tropeçasse."

O modo como ela falava, sempre com essa profundidade, me atraía de uma forma que eu não conseguia explicar. Ela não era só bonita — era forte. Forte de um jeito que não era agressivo, mas resiliente. Era como se, no amor, ela soubesse exatamente quem era, enquanto eu ainda me perdia tentando descobrir.

"Mas, no meio disso tudo," ela continuou, "eu penso que talvez a única coisa que realmente importa seja o que a gente sente. Porque o resto... o resto pode mudar a qualquer momento."

Eu sabia que ela estava certa. No final das contas, o amor era o que nos mantinha de pé, o que dava sentido a todas as outras lutas. Mas, ao mesmo tempo, o amor era o que me deixava mais vulnerável. E, por isso, eu tinha tanto medo de me entregar.

"Você acha que é o bastante?" perguntei, hesitante.

Ela olhou para mim com aqueles olhos que pareciam enxergar mais fundo do que eu gostaria. "Acho que o amor é a única coisa que realmente temos de verdade, Gabriel. Porque, no final das contas, tudo o que o mundo nos tira, o amor devolve. Mesmo que seja só por um momento."

Sua resposta me atingiu como um soco no estômago. Porque, no fundo, eu sabia que ela estava certa. Mas saber disso não tornava as coisas mais fáceis. Se o amor era realmente tudo o que tínhamos, então havia um peso enorme em ser amado. E eu não sabia se estava pronto para carregar isso.

Ela se aproximou, repousando a cabeça no meu ombro, e, por um instante, o mundo inteiro desapareceu. Não havia estrelas distantes, não havia drama. Apenas nós dois, no silêncio confortável de quem sabe que, mesmo com todos os medos e incertezas, o amor estava ali.

E talvez, no fim das contas, fosse isso que importava.

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