Eu Sei Quem Trama e Quem Tá Comigo

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No silêncio da madrugada, as ruas pareciam mais frias do que o normal. As luzes da cidade piscavam ao longe, ofuscadas pela névoa que subia lentamente do asfalto molhado pela garoa fina. Eu caminhava sozinho, com as mãos enfiadas nos bolsos, o capuz cobrindo parte do meu rosto. Já faz tempo que aprendi a não confiar nas sombras ao meu redor, e essa noite não seria diferente.

No fundo, sempre soube quem trama contra mim e quem realmente está ao meu lado. A vida na quebrada ensina rápido. Não dá espaço para ingenuidade. O mundo aqui não é um lugar onde os laços se formam por afeto, e sim por interesse. A cada esquina, há alguém de olho no que você tem — ou no que você é. Só que a questão é mais profunda: às vezes, quem trama está mais perto do que se imagina.

A realidade é essa. É cruel, é fria, mas não dá para se enganar. E quando você se permite baixar a guarda, alguém vem e puxa o tapete. Já passei por isso. Já perdi gente que eu achava que estava comigo. E já vi aqueles que eu achava que eram meus inimigos se revelarem verdadeiros aliados.

A lealdade é a moeda mais rara por aqui.

Davi, esse eu sei que tá comigo. Irmão de verdade, aquele que te estende a mão mesmo quando o mundo inteiro vira as costas. Não importa se estamos no meio de um tiroteio verbal ou enfrentando as sombras que se movem pelas vielas. Davi sempre esteve lá. E eu por ele. É isso que nos faz sobreviver — essa irmandade que transcende as merdas cotidianas.

Mas, ao lado de Davi, outros nomes surgem com menos certeza. O olhar de Guilherme, com seus olhos de cachorro sem dono, às vezes esconde mais do que revela. Ele tem aquele sorriso fácil, sempre pronto para agradar. Mas quem realmente está por trás daquele riso? Até onde ele vai por mim? Ou melhor, até onde ele vai por ele mesmo?

Já Ana Beatriz, bem, eu nem sei mais o que pensar. No fundo, sei que ela sempre foi movida por uma inveja amarga. Aquela rivalidade velada, que começa como admiração, mas logo se transforma em algo tóxico. Quando as coisas começaram a desmoronar, foi fácil ver que ela estava lá, observando de longe, esperando o momento certo para cravar o golpe final. Trama ou não, a linha é tênue.

O que mais me pega é o sentimento constante de desconfiança. Mesmo quando estou cercado por rostos familiares, a sensação de que alguém pode estar planejando minha queda nunca desaparece. Essa é a maldição de quem sobrevive num lugar onde o respeito é conquistado a duras penas, mas a queda pode vir num piscar de olhos.

Eu sei quem trama. Os olhares, os gestos, os cochichos, tudo entrega. Aqui, ninguém trama por motivos pequenos. Trama-se por poder, por status, por medo de perder o que tem — ou por querer o que o outro tem. E quando você está no topo, quando você é a voz que ecoa nas vielas, quando seu nome é sussurrado com respeito ou temor, é aí que os alvos aparecem.

Eu e Davi, nós sempre soubemos navegar esse mar de traições e alianças. Não somos santos, mas também não somos otários. Sabemos que o mundo quer o que é nosso, mas aqui é assim. O jogo nunca para. E quem para, cai.

Entre aqueles que tramam e aqueles que estão comigo, o que resta é a certeza de que, no final das contas, o verdadeiro inimigo raramente se apresenta de cara. E a verdadeira lealdade? Bom, essa é testada a cada nova tempestade que se aproxima.

A rua é fria, mas a mente tem que ser mais fria ainda. Hoje, sei com quem posso contar. Amanhã? Só o tempo vai dizer.

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