Música Carai

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Capítulo 63: Música

A música sempre teve um lugar especial no coração de Gabriel. Enquanto driblava pela quadra da favela, não eram apenas os gritos da torcida que ecoavam em sua mente, mas também as batidas das músicas que tocavam nas festas e nas esquinas. Ele cresceu ouvindo Racionais MC's, suas letras carregadas de verdade e realidade, que falavam sobre a vida na favela, a luta e a resistência. Era impossível não se sentir inspirado por aqueles versos que retratavam sua própria história. Gabriel sonhava em ser como eles, em ser um porta-voz da sua comunidade, alguém que, através da música, pudesse expressar o que muitos sentiam, mas não conseguiam dizer.

Às vezes, em meio ao silêncio da noite, ele sentava na laje da casa e deixava a mente fluir. Os versos começavam a surgir, histórias de superação, dor e esperança. Ele queria ser um rapper, um poeta das ruas, alguém que trouxesse à tona as questões que o povo enfrentava todos os dias. O sonho de ser um cantor como os Racionais ou até mesmo como o MC Kevin, que falava da realidade com tanta autenticidade e emoção, pulsava forte dentro dele.

As letras que ele criava eram um reflexo da vida na favela: a luta diária, as perdas, mas também a camaradagem e a força da comunidade. Gabriel queria fazer as pessoas sentirem cada palavra, cada rima, como se fosse um soco no estômago. Ele queria que elas ouvissem e se vissem nas suas músicas, assim como ele se via nas músicas que ouvia. Havia um poder na música que ele queria dominar, um poder de transformar dor em arte, sofrimento em superação.

Em sua mente, ele se via em palcos lotados, com o microfone na mão, a multidão cantando suas letras. O sonho de ser um grande cantor não era apenas sobre fama; era sobre dar voz a quem não tinha, sobre mostrar que a realidade da favela era digna de ser ouvida. Ele queria que sua música alcançasse os corações das pessoas e que as fizesse refletir sobre suas vidas.

Gabriel sabia que a vida na favela exigia escolhas difíceis. Muitos de seus amigos estavam se perdendo nas promessas ilusórias do crime e da violência, mas ele queria um caminho diferente. A música era sua salvação, sua forma de escapar da dura realidade. Ele passou a se dedicar cada vez mais, escrevendo letras, ensaiando rimas e criando melodias nas horas vagas. A música tornou-se sua companheira, seu refúgio, um meio de se conectar consigo mesmo e com sua história.

Ele se lembrava de quando juntou coragem para cantar em um pequeno evento na comunidade. O nervosismo tomou conta, mas quando começou a cantar, as palavras fluiram como um rio. A conexão com a plateia foi instantânea. As pessoas se identificaram com suas letras e a energia do momento foi indescritível. Era ali, em cima daquele palco improvisado, que ele percebeu que a música poderia ser uma forma de resistência, uma maneira de contar ao mundo que existia vida na favela além das estatísticas.

Mas a luta não era fácil. Gabriel enfrentava desafios diários, desde a falta de recursos para gravar suas músicas até as críticas de quem achava que ele deveria focar em algo mais “realista”. Mas ele estava determinado. Para ele, a música e o futebol andavam juntos; ambos eram formas de expressão, maneiras de se libertar das correntes que a sociedade tentava impor.

Com cada letra que escrevia e cada rima que criava, Gabriel se aproximava mais de seus ídolos. Ele sonhava em um dia dividir o palco com os grandes, em fazer parte da história do rap e do funk, e mostrar que a favela também tinha talento, resistência e, acima de tudo, voz. E assim, enquanto continuava a driblar no campo, Gabriel também fazia música, construindo seu caminho, tijolo por tijolo, verso por verso. Ele estava determinado a transformar seu sonho em realidade, não apenas para ele, mas para todos aqueles que vivessem e sonhassem como ele.

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