Hei, Senhor de Engenho, Eu Sei Bem Quem Você É

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Capítulo 79: Hei, Senhor de Engenho, Eu Sei Bem Quem Você É

O som da cidade ressoava como uma sinfonia caótica. Em meio a buzinas, gritos e risadas, eu andava pelas ruas, perdido em meus pensamentos. Então, ao avistar um grupo de homens bem vestidos, uma frase antiga surgiu em minha mente, como uma memória esquecida que agora se tornava clara: “Hei, senhor de engenho, eu sei bem quem você é.”

Aquelas palavras reverberavam dentro de mim. Eles eram os verdadeiros senhores da cidade, aqueles que controlavam o jogo, que decidiam quem vive e quem morre. Não era difícil perceber que, para eles, eu não passava de um mero peão no tabuleiro. Eles viam a favela como um lugar a ser explorado, um terreno fértil para os lucros e a ostentação. Para mim, no entanto, era a minha casa, onde cada esquina tinha uma história, onde cada rosto trazia consigo uma luta, uma vitória ou uma perda.

Enquanto caminhava, avistei um senhor de idade, sentado na calçada, seus olhos cansados observavam a movimentação da cidade. Ele sabia de tudo. Sabia das mentiras que os poderosos contavam, das promessas vazias e do desprezo que a elite tinha pelos que viviam na periferia. Me aproximei e perguntei o que ele achava de tudo aquilo.

“Gabriel,” ele começou, com uma voz rouca, “os senhores de engenho se vestem de terno e gravata hoje, mas seus corações são tão frios quanto antes. Eles ainda governam com a mesma mão de ferro, só que agora é por meio do dinheiro e da influência, não mais com chicotes e correntes.”

Ele falava com uma sabedoria que só os anos podem trazer, e eu escutava, absorvendo cada palavra. Aquele homem havia vivido em tempos em que a opressão era mais visível, mas o que me intrigava era a forma como ele comparava as eras. A opressão havia mudado de forma, mas permanecia enraizada na sociedade.

“Por que você se importa, garoto? Você tem uma vida a viver,” ele continuou, “mas se você quer mudar algo, comece pela sua voz. Cada palavra que você soltar pode ser uma chave para abrir portas que estavam fechadas para nós.”

Aquela conversa me deixou pensativo. Eu sabia que precisava usar minha voz, mas a questão era: como? A ideia de se levantar contra os senhores de engenho da atualidade me parecia uma tarefa monumental. Eu tinha apenas uma caneta e um caderno, mas, mesmo assim, uma pequena parte de mim acreditava que essas ferramentas poderiam ser poderosas.

Me despedi do velho, agradeci pela conversa e continuei a andar. No fundo, algo tinha mudado. A frase que antes ressoava como um eco de desespero agora se tornava um mantra de resistência. “Hei, senhor de engenho, eu sei bem quem você é” não era só uma acusação; era um convite à luta, uma chamada para que aqueles que conhecem a verdade se unam e façam valer suas vozes.

Eu olhei para o céu, sentindo a garoa fina que começava a cair, como se o universo estivesse me dizendo que era hora de agir. E eu estava pronto.

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