FEDOR

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Acordei incomodada com o meu próprio cheiro. Depois da viagem eu não tinha me lavado e o quarto de meu pai era notoriamente mais quente do que o meu próprio. Inspirei um pouco mais forte enquanto abria os olhos e senti o puro fedor que vinha das minhas axilas. Arregalei os olhos, sentei-me na cama com brusquidão, atordoada, e dei de cara com o retrato dele. Senti como se meu coração estivesse se contraindo dentro do meu peito. Eu estava toda desajeitada, as roupas amassadas, emboladas e desatadas. Passei as mãos pelo rosto enquanto pensava que Valenius tinha feito o melhor que podia. Então contemplei em silêncio as lembranças da noite anterior e sorri, sentindo o peito se aquecer com o precioso cuidado de meu guarda.

Valenius era um cavalheiro. Um sentimento me percorreu no silêncio daquele quarto. Era intenso, saudoso e novamente presente. Fazia meu coração acelerar. Senti o rosto esquentando e quase morri sufocada por um instante.

Desci da cama, segurando os tecidos da roupa para não tropeçar, e caminhei até a porta. Girei a maçaneta e abri, olhei no corredor, só Valenius estava lá parado, como sempre. O pobre devia morrer de tédio.

— Bom dia, Ana. — Ele murmurou sem olhar para mim. Ouvir sua voz familiar era confortável para mim e deixava meu coração aquecido, principalmente quando podíamos nos expressar com maior pessoalidade.

— Bom dia, Valenius. — Abri a porta de vez e fui correndo até o meu quarto antes que outra pessoa me visse tão desarrumada.

A lareira do meu dormitório também estava acesa, espantando o frio de mais um dia de inverno. Ali era mais agradável do que o outro quarto ou eu apenas tinha me acostumado. Meu quarto também era consideravelmente maior do que o de meu pai.

Ouvi uma batida na porta e logo em seguida Solis pediu para entrar.

— Entre. — Autorizei-a enquanto sentia a garganta arranhar um pouco.

— Céus... Passou a noite na farra? Você está semelhante a um capacho. — A limpa e arrumada Solis me julgou sem piedade.

— Não sejas cruel, Solis. — Implorei em tom de brincadeira. — Tiro uma moeda do seu pagamento.

— Oh! Megera! — Sentou-me em uma cadeira e começou a desembaraçar meu cabelo com a escova. Estava cheio de nós.

— Eu soube que você não dormiu aqui... — Ela disse com cautela.

— A gente desse castelo é muito fofoqueira. — Reclamei, sentindo que tinha pouca privacidade.

— Quando é futrico lhe beneficiando tu não reclamas. — Ela apontou a minha hipocrisia.

— Dormi no quarto de papai, pois sinto a falta dele. — Resumi.

— Será recorrente? Posso pedir para limparem lá. — Falou.

— Não. Limpem, mas porque sujei e tem alguns de meus pertences por lá. — Pedi.

— Vou descer para pedir água. — Ela disse após desembaraçar meus cabelos.

— Diga à sua mãe que quero falar com ela após o desjejum, na biblioteca. Por favor. E avise na cozinha que caprichem, pois hoje estou faminta. — Pousei a mão sobre o meu estômago dolorido.

— Vão fazer toneladas de comida, pois Jis já está aqui. — Ela sorriu e saiu.

A noite foi ruim, a saudade fazia doer a alma tanto quanto o meu corpo que ainda não tinha se recuperado da viagem, mas eu não tinha tempo para descansar muito. Havia muitos dias que apenas Jis estava cuidando da Instituição Fēmina.

Após o banho e de me vestir de maneira decente, desci para tomar o café da manhã. Alin e Aleana estavam no corredor junto de Valenius. Pareciam ainda cansados da viagem, apesar de ele estar bem.

Ana Merak - Dever e HonraOnde histórias criam vida. Descubra agora