NOIVA

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— Pare com isso, Ana. — Pedi enquanto fumava um pouco para afastar o nervosismo.

Ela estava linda, com um vestido inteiramente bordado com flores coloridas. Um tipo muito comum na região, que ela julgara adequado para a ocasião. Seu cabelo foi preso no topo da cabeça com um enlace de tranças grossas onde estava preso um véu que ia até a altura de sua cintura e tinha borda rendada. Usava brincos pequenos com pedras vermelhas e seu costumeiro medalhão. Andava de um lado para o outro retorcendo os dedos e sem focar o olhar.

— Não consigo ficar calma, pai. A placidez me recusa como morada, — Ela expeliu o ar e colocou as mãos espalmadas sobre a lombar. — Meu estômago está queimando.

Sorri miúdo porque ela era uma criatura muito graciosa. Apesar de crescida, meu sentimento era de ver sempre uma criança.

— Você não ficou nervosa para receber beijos de um qualquer em sua alcova... — Impliquei com tom neutro. Na verdade, relembrei com certa amargura, mas não tinha tanta diferença naquele contexto.

Ela me lançou um olhar de reprimenda, como se tivesse ouvido o maior dos ultrajes. Soltei uma gargalhada. Às vezes o jeito dela me lembrava muito o de Barakj. Eu sentia saudades daquele velho e ainda mais de minha esposa. Todos os dias eu esperava por ela, olhando pelo menos uma vez para o horizonte distante. Lira amaria participar desse momento e eu gostaria de ter o talento de Ana para registrar tudo, para quando ela voltasse. Porque Lira voltaria, eu sabia que ela voltaria. E quando ela pousasse, com suas enormes asas, eu correria para pegá-la em meus braços e a encheria de beijos. Derramaria todo o amor que eu tinha represado no peito.

— Pai...? — Ana estava estalando os dedos.

— Sim, filha? — Atendi ao seu chamado.

— No que estava pensando? — Perguntou com tamanha curiosidade que parecia ter esquecido de sua própria impaciência.

Eu evitaria falar na mãe dela para não deixá-la triste. Eu sabia que ela estava lembrando, mas não era a lembrança que trazia a dor, era falar dela.

— Nas custas desse casamento. Precisaremos arcar com ele, pois você escolheu um pobre, para seguir a cartilha da filha rebelde. E eu, quero, e mereço, uma bela festa. — Falei. De fato, eu queria. Era a minha única filha e a única da família que estava ali. Todo o dinheiro que tínhamos serviria de que se não pudesse fazer aquilo. Queria casar Ana com mais luxos do que uma rainha jamais poderia ter.

— Papai, não seja deselegante! Evite assuntar sobre ouro, pelo menos por hoje. Você sabe que Lunais e Fortarius são camponeses. Já me serve um matrimônio simples, celebrado por Jis. — Declarou convicta. Eu sabia que era verdade. Ana já estava enjoada da boa vida, não se fascinava mais com facilidade.

— Para mim não serve. — repliquei, disposto a ganhar aquela queda de braço. — Além disso, você está equivocada e esquecida de que o pai da noiva é quem paga a festa.

Ela ficou desconcertada diante da informação que deixou passar. Eu tive vontade de rir. Era uma criança, seria sempre a minha criança.

— Não precisa gastar muito... — Tentou ser solícita.

— Não seja ridícula, filha. Um dia você se casaria com alguém, então já estava nos planos. Além disso, os vilões, os camponeses, nossos vizinhos e amigos quererão comemorar também. Além da família, é claro. Temos parentes distantes, mas temos. Felizmente não precisamos correr. — Lancei um olhar sugestivo sobre sua castidade e ela permaneceu inabalada. Não estava desesperada com o tempo.

Ana Merak - Dever e HonraOnde histórias criam vida. Descubra agora