OURO

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Todos os dias eu verificava A Árvore, como tinha feito antes do nascimento de Arge, o meu pequeno e bravo filho. Tinha a personalidade da mãe, aquele herdeiro engenhoso de mente criativa.


Cheguei no espaço sagrado mais uma vez naquela manhã, sendo recepcionado por um caminho de flores miúdas, douradas, de dezenas de pétalas miúdas, com cheiro doce e leve, como um talco perfumado. O meu coração acelerou. Aproximei-me da Árvore enquanto a sua copa se enchia de flores grandes e douradas, todas com centenas de pétalas miúdas e centros reluzentes, cintilando entre muitas folhas verdes e viçosas. A Árvore estava brilhando mais do que o sol. O tronco da Árvore brilhou, ficou tomado por arabescos que subiram da base até a copa. Aos poucos o espaço entre eles se abriu e o nome da nossa criança surgiu com os símbolos que indicavam a sua natureza.


Meus olhos ficaram cheios de lágrimas. Agradeci beijando aquele solo sagrado.


Voltei para o castelo, correndo mais do que o vento. Gritei por Ana desde o jardim e a encontrei no escritório, respondendo algumas cartas. Ela estava trabalhando sem parar. Tinha um aspecto muito bom e saudável durante aquela gestação. Estava sempre corada e repleta de energia. Não reclamava de dor, era cheia de apetite e parecia muito forte também. Ficava em movimento o dia todo e não tinha quem conseguisse acompanhar seu ritmo, mesmo com aquela grande barriga onde gestava mais um fruto do nosso amor. No início eu tive medo. Chorei escondido várias vezes com medo de perdê-la, mas com o passar do tempo vi que ela estava melhor do que nunca. Melhor do que eu. Segundo Pricila, ela era mais saudável do que todos nós.


Ana se levantou surpresa e com feição preocupada. Sua barriga estava quase maior do que ela. Ana era tão competente no que fazia que até para estar grávida se tornou insuperável.


— Por que você está chorando? — Ela plantou as mãos nos quadris e franziu o cenho.


Dei um beijo em seus lábios.


— É de alegria, meu amor! ALEGRIA!


— Doidivanas. – Ela sorriu, passando uma mão na barriga e a outra no meu rosto. — O seu pai está maluco.


A criança estava se mexendo, eu ouvia. Ajoelhei-me no chão e encostei o ouvido, abraçando a barriga. Ana fez um cafuné no meu cabelo enquanto ria.


— Eu não sou maluco, minha filha. — Respondi cheio de orgulho. — Minha pequena loba. O papai espera ansiosamente por você.


Olhei para cima e vi Ana surpresa, com as mãos sobre a boca. Aos poucos seus olhos se tornaram marejados também.


— Aurilupus. — Revelei com a voz brilhante de felicidade. O nome soou como uma bênção quando pronunciado. — Seu nome é Aurilupus.


As lágrimas de Ana, brilhantes de alegria e emoção, caíram sobre nós enquanto ela sorria largamente.


— Auri Lwana. — Ela passou a mão sobre o ventre com o olhar sonhador de quem está completa. — Eu sabia que seria.


Tínhamos combinado que se nascesse fêmea, se chamaria Lwana. Então Aurilupus Lwana para os humanos se chamaria Auri Lwana.


***


Ali estávamos três. Meu sogro, meu filho e eu, esperando o nascimento da minha criança. Pricila e Solis ajudavam no parto e Jis chegaria em breve. Meu sogro sorria e esfregava as mãos de contentamento por presenciar a chegada de mais uma neta. Seus cabelos estavam embranquecidos e os vincos de alegria em seu rosto eram profundos.


— Mal posso esperar para ver o rosto da criança. — Ele disse para Arge. — Aposto que se parece comigo!


O meu filho sorriu, eles eram muito amigos.


— Eu também acho, vovô! — Arge respondeu dando alguns pulinhos felizes. Estava ansioso pela chegada da irmã.


— Dessa vez vai sair mais parecido comigo, o pai, pois você é sua mãe toda. Não nega a raça. — Reclamei apenas por divertimento.


O meu filho e o meu sogro riram.


— Seu pai é bobo e ciumento. — Meu sogro redarguiu.


Fiquei calado, pois ouvi quando ela chegou ao mundo. A minha loba já tinha nascido, sem esforço algum da mãe, em um parto fácil e, segundo Ana, quase sem dor. Ela dizia que era como se Auri tivesse caminhado por um portal para fora de si. Nem as lobas eram tão felizes naquela experiência. Pricila aproveitou a oportunidade do parto e fez uma operação em Ana para que ela não concebesse mais. Ela tinha consentido com aquela ideia. Dois filhos já era um número bom o bastante para nós. Peguei o meu filho no colo e o abracei de felicidade, girando no corredor.


Quando pudemos entrar, fui até a cama ver se Ana estava de fato bem como parecia. Mas ela estava ótima, sorrindo e gesticulando sem nenhum gemido. Quase não tinha sangrado também. Meu sogro estava reluzente de tanta felicidade ao ver a filha naquele bom estado. Sempre teve fé de que tudo terminaria bem.


Auri era mais um milagre em nossa vida.


Beijei a testa de Ana e assisti com ela enquanto Borjan erguia a recém nascida no colo. Naquele momento Ana chorou. Chorou muito. Era como se houvesse uma aura em torno dos dois. Uma aura dourada.


Borjan sorria largamente. Muito feliz enquanto mostrava Auri para Arge.


— Qual é o nome? — Ele questionou a nós.


— Auri Lwana, pai. — Ana respondeu enquanto segurava na minha mão e sorria orgulhosa.


— Auri do vovô... — Ele sacudiu o bebê. Então ficou surpreso. — Oh! Abriu os olhos e não estão embaçados.


Borjan correu para nos mostrar. Ficamos todos emocionados, mas ele estava muito mais porque tinha sido a primeira pessoa que a nossa filha tinha visto no mundo. E ela estava sorrindo também.


— Olhos verdes, exatamente iguais aos meus. — Ele falou, feliz e comovido.


Olhei para Solis e Pricila, e vi que ambas estavam chorando no canto.

Ana Merak - Dever e HonraOnde histórias criam vida. Descubra agora