ESTRANHA

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Acordei em um sobressalto, espavorida, pois não tinha sonhado e, na minha percepção, eu ainda estaria sentada no colo de Valenius. Mas não, estava em minha cama e a luz da manhã entrava pela janela aberta. Caminhei até a janela e vi alguns membros da guarda passando lá embaixo. Lembrei-me de que era domingo, portanto, dia de Valenius ir visitar a família. Senti um vazio instantâneo. Naquele horário certamente Jis já tinha feito a celebração da missa. Refleti sobre a janela estar aberta, mas cheguei à conclusão de que foi porque passaram por ali para me vestir e eu estava dormindo. Coloquei uma roupa qualquer, prendi o cabelo em uma trança que joguei sobre o ombro, para frente, e fui procurar algo para comer.

— Bom dia. — Falei para Alin e Aleana que estavam ao lado da minha porta.

— Bom dia, senhora. – Responderam em uníssono.

— Já tomaram o desjejum? — Questionei com algum interesse.

— Sim, senhora.

Segui em silêncio pelo corredor. Arrastando-me, sentindo autocompaixão porque queria ao menos um abraço de Valenius, mas ele me abandonou no primeiro dia. Todos me largavam quando eu os amava. Bufei, de péssimo humor.

Senti um calor no coração quando entrei na sala de refeições e Jis estava lá.

— A benção. — Pedi.

— Deus a abençoe. — Ele fez uma cruz na minha testa para me abençoar.

— Como foi a celebração? — Perguntei porque estava interessada e porque queria ouvir pelo menos uma voz preenchendo aquele lugar solitário que eu chamava de lar.

— Filha... Estava vazia hoje. Acho que o frio desanimou os fiéis, mas não tem problema, pois Deus também os abençoa em casa. — Jis riu baixo o que me fez rir um pouco também. — Quer se confessar? Podemos voltar por lá.

– Há quanto tempo não me confesso? — Questionei olhando pelo canto do olho. Ele me fitava através da fresta de seus olhos semicerrados.

— Alguns meses. — Respondeu em tom acusatório.

— Não sou tão boa cristã. — Soltei uma risada carregada de culpa.

— Você está escondendo algo? — Ele indagou.

A minha mão tremeu e deixei cair a faca no prato.

— E-eu não. Por quê? — Enfiei um pão na boca e comecei a mastigar.

— Pois faz tempo que não se confessa, ora. Agora tenho certeza de que você está escondendo alguma informação. — Ele cruzou os braços.

— Quem esconde é o senhor, que nunca envelhece. — Mudei de assunto. — Quanto vigor para um velhinho.

Ele continuou me olhando, desconfiado. Fingi a mais pura loucura enquanto comia como uma indigente. Apesar da aventura que foi ter uma refeição com Jis, ainda preferia aquilo a nada. Aquela interação humana fez brotar um sorriso sincero no meu rosto. Era emocionante.

Passei na biblioteca e peguei a correspondência. Meu herbário também, pois queria escrever algo pessoal no último espaço. Algo que viesse do coração. Aquele herbário me acompanhou em todos os meus momentos até ali, enquanto eu crescia.

Arrastei-me até o meu quarto, onde era mais quente e eu me sentia confortável. O tempo se tornou nublado de repente, então abri a janela e gritei para fora:

— Entrem! Não fiquem aí, é uma ordem!

Ina, Aurel e Virgil sinalizaram que tinham entendido o recado. Em breve estariam tumultuando a porta do meu dormitório. Jogando algum jogo ou simplesmente falando da vida alheia. Eu torcia pela segunda opção para me tornar bem informada. Sentei-me à escrivaninha e abri o herbário. Encarei o papel sem uma inspiração concreta.

Ana Merak - Dever e HonraOnde histórias criam vida. Descubra agora