PROLE

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— Ah! Estou tão feliz! — Comemorei, girando pelo quarto, com os braços abertos, enquanto Solis sorria.

Era manhã e eu estava me vestindo para os compromissos diários, como sempre, contudo, havia um fator essencial para determinar que aquela manhã já fosse mais feliz do que muitas outras: papai havia aceitado construir a estrada. Depois de tanta insistência eu venci o gigante. No dia anterior ele entrou no meu quarto, fez algum suspense e, depois de muito tempo de consideração, finalmente cedeu.

— Posso saber o motivo? — Solis me sentou em um banquinho para fazer o meu toucado.

— Meu pai aceitou o projeto da estrada. — Contei cheia de empolgação. Parecia um regozijo infinito.

Solis revirou os olhos como se aquele final já fosse o esperado por ela. Notei que ela mantinha em seu rosto um largo sorriso. Parecia até congelado.

— Nenhum de nós duvidava de que ele aceitaria, Ana. Apenas você. — Ela replicou.

Dei uma risada e a observei pelo espelho. Havia mesmo um brilho especial em sua existência e a pele estava nitidamente macia e viçosa. Tudo em Solis gritava alegria.

— Você está ainda mais radiante, minha amiga. O amor está lhe fazendo bem. — Futriquei com um sorriso de satisfação. Era mais do que excelente vê-la naquela condição.

O sorriso dela ficou mais largo, mostrando todos os seus dentes perfeitos e brilhantes.

— Não posso negar. — Concordou sem vergonha alguma. — Ontem eu e Tenebris estávamos conversando sobre os possíveis nomes para a nossa futura prole.

Seu rosto ficou corado enquanto ela falava. Eu sentia como se, a qualquer momento, ela fosse bater palmas e dar pequenos pulos de felicidade.

— Ooooh! — Tapei a boca soltando uma risada estridente. Sentia-me como uma menina diante de um assunto intrigante e constrangedor. — Quais serão?

— Será surpresa. — Falou, cheia de mistério. — Veremos primeiro o que dizem as tradições do nosso clã, depois escolhemos de fato.

— Que injusta! — Protestei, sentindo-me traída. Primeiro ela instigou a minha curiosidade e depois soltou a minha mão.

— Quando tiver os seus, se eles nascerem lobos, você vai entender. — Falou. Naquele momento eu senti um arrepio. Que mistério era aquele?

— Aposto que você vai me contar antes. — Afirmei. Era mais uma vontade do que uma certeza.

Ficamos em silêncio enquanto eu me encarava no espelho. Eu não tinha pensado sobre os nossos futuros filhos e sobre serem mestiços humanos ou mestiços lobos. Aquele assunto começou a me tomar.

— Nossos filhos poderão nascer humanos? — Perguntei com dúvida genuína.

— Sim. — Ela respondeu. — Nesse caso eles não precisam participar de nada relacionado à magia. Mas se nascerem lobos, estarão logo dentro do clã.

Comecei a ser tomada por certo pânico. Uma falta de ar que eu não compreendia. Era um sentimento de receio misturado com algo mais. Abaixei o olhar enquanto tentava compreender o meu coração.

Segui a rotina do dia. Vi Valenius logo que saí do quarto e sorri para ele. Depois apenas trabalhei. Mas um momento antes do almoço, parei para analisar aquele mal-estar. Antes de dormir, Valenius não estava lá. Tenebris estava em seu lugar. Entrei no quarto, e no silêncio da noite, comecei a desvendar aquele temor. Era um temor. Um medo de colocar no mundo outras criaturas que sofreriam como eu, ou que me deixariam sozinha, com o coração na mão. Crianças que poderiam sofrer com a ausência do pai, que poderiam ser atacadas.

Lembrei de toda a minha trajetória e me senti incapaz de sustentar aquela vida. Fui tomada pelo pânico e não consegui dormir. Eu estava assombrada pelo sofrimento de toda uma vida.

Ana Merak - Dever e HonraOnde histórias criam vida. Descubra agora