Capítulo 2: Seguida

7.8K 443 77
                                    



Era a oitava vez que Paula pressionava a função "soneca" do despertador de seu celular. Foi quando, num lapso de lucidez olhou o horário. Deu um pulo e um grito, já tirando a roupa enquanto corria para o banheiro; escovou os dentes embaixo do chuveiro, e menos de dois minutos depois estava colocando o uniforme da loja, calçando a sapatilha, apanhando a bolsa e saindo às pressas em direção à garagem, onde estava o carro que Anabela, que pedira emprestado na noite anterior. Seus avós ainda estavam dormindo, com certeza.

Uma hora e dez minutos depois, estava no shopping, indo o mais rápido que conseguia até a loja de roupas em que trabalhava, no segundo andar, a Requinte.

O olhar de desaprovação de sua gerente foi de amedrontar. Tentou ignorá-la enquanto caminhava até o ponto, enxugando o suor da testa.

— Meia hora atrasada, Paula. De novo.

Valda era uma mulher baixa, de meia idade, com meio quilo de maquiagem para esconder as rugas; o cheiro forte de sua enjoativa colônia a acompanhava como um campo de força.

— Não vai mais acontecer, dona Valda.

— Olhe pra sua cara!

Olhe pra sua!, disse apenas em pensamento.

— Suada, com olheiras, sem maquiagem!

Paula teve vontade de passar o dedo no rosto dela para pegar um pouco de pó compacto emprestado, mas apenas baixou a cabeça, como boa funcionária.

— Eu peguei um engarrafamento e...

— Não é da minha conta, garota. Agora arrume esse rosto e esse cabelo para não assustar os clientes, e já ao trabalho! — deu as costas e se afastou, de nariz empinado.

Paula segurou uma gargalhada.

— Vai assustar os clientes, sua feia — sussurrou Magda, surgindo atrás dela, rindo baixinho.

— Melhor mesmo — concordou, divertida. — Devia fazer como ela e mergulhar o rosto num balde de maquiagem pra esconder minha feiúra.

As duas riram, baixo. Paula foi até o banheiro, lavou o rosto, sacudiu a cabeça, fazendo suas madeixas negras dançarem quase que em câmera lenta, como nos comerciais de xampu. Seus cabelos não precisavam de escova ou pente. Sorriu, orgulhosa. Estava acostumada com sua beleza incomodar outras pessoas, principalmente as feias, e até mesmo homens. Soprou um beijo para seu reflexo no espelho, piscou para si própria e voltou ao trabalho: ser bonita e sorridente. Era de praxe homens entrarem na loja apenas para verem-na de perto, ouvirem sua voz, arriscarem pedir seu número. Paula quase sempre negava, mas às vezes, após avaliar bem o cliente, pegava o contato para caso precisasse futuramente. Nunca se sabe, pensava.

— A bruxa mascarada deve ter te denunciado pra dona Dolores um milhão de vezes — comentou Magda aos sussurros, referindo-se à gerente.

— "Bruxa mascarada" — Paula riu. — Você consegue ser quase tão cruel com ela quanto a natureza foi.

Magda não era bonita, mas tinha um charme que compensava; era o tipo de mulher que chamava a atenção depois de começar a falar. Sentia certa inveja da beleza estonteante de sua colega de trabalho, mas era mais admiração que qualquer coisa.

— Mas sério, sua louca, se continuar atrasando assim, vai acabar sendo demitida.

— Tive uma noite longa — disse Paula bocejando. — Porém, bem proveitosa — sorriu e deu uma piscadela. — Só queria algo pra comer; na pressa, não tomei café.

Clube Proibido [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora