Capítulo 147: Pior que estar sozinho

1.1K 152 14
                                    


Paula estava exausta após realizar seu desafio, que fora relativamente fácil, mas trabalhoso de realizar. Precisava da piscina da sede, e após dar várias voltas no quarteirão, para se certificar de que ninguém estava de tocaia, entrou. Não havia ninguém ali, mas as luzes ficavam sempre acesas. Tirou a roupa, mergulhou nua. Foi até o fundo azul, subiu à superfície. Só então viu que não estava só.

— Japa?

Nayuri estava sentada nos sofás, abraçando os joelhos, fumando com a mão trêmula. Paula percebeu que ela chorava. Saiu da piscina, caminhando até a toalha, e em seguida até os sofás.

— Oi, gata — Japa forçou um sorriso.

— O que houve?

— A vida. É uma merda.

Paula enrolou a toalha no corpo e sentou-se ao lado dela, alisando seus cabelos escuros.

— Falhou em algum desafio?

— Não. Antes fosse.

Os dedos de Paula deslizaram para o rosto de Japa.

— Se quiser se abrir pra mim...

Japa suspirou, olhando com ternura para Paula.

— Minha mãe está com câncer. Meu pai a abandonou. Minha irmã está nos Estados Unidos.

— Nossa... Sinto muito.

— Ela precisa de mim — segurou o choro até onde conseguiu. — Mas logo agora? Logo agora que estou conseguindo chegar a algum lugar? Estou realizando todos os desafios, estou me dedicando, tentando ser forte... Paula, eu queria mais que tudo me libertar do passado, ser... independente, mas... — chorou, recuperou o fôlego e continuou: — Todos os meus relacionamentos foram um desastre. Eu sempre fui pegajosa, ciumenta, insegura... Mas era por medo de ficar sozinha.

— Fiquei sabendo do que seus pais fizeram com você. Imagino o quanto foi traumático... Eu sei o que é ter traumas...

— Mas olha pra você. Feiticeira. A invicta. Quem me dera ser forte como você... Qual o segredo?

Paula continuou acariciando o cabelo de Nayuri enquanto pensava no que dizer. Era crucial ganhar a confiança dela e ser vista como amiga, mas ela realmente queria ajudar.

— Valentina me apresentou a um poeta fantástico. Charles Bukowski. Ele foi um bêbado miserável a maior parte da vida. Vivia em puteiros e era fadado a ser um ninguém. Mas lá pelos cinquenta anos publicou o primeiro livro. E hoje é um ícone da literatura. Em um dos seus poemas, o meu favorito, ele diz que o isolamento é uma dádiva. "Todos os outros são um teste à sua resistência, ao quanto você realmente quer alcançar o que almeja". Eu nunca tive medo de ser sozinha. Aprendi que a melhor forma de conseguir as coisas é não precisando de ninguém.

— Mas... É minha mãe...

— Minha mãe apenas me colocou no mundo — O semblante de Paula tornou-se duro, rancoroso. — E nem foi intencionalmente. E fez da vida que me deu um inferno.

Nayuri engoliu em seco. Era como se Paula estivesse narrando sua vida em vez da própria.

— Deixa eu ver teu celular — Paula estendeu a mão.

Nayuri retirou o aparelho do bolso e o desbloqueou, entregando-o a Paula, que digitou algo e então o devolveu:

— Outra coisa que ele escreveu sobre a solidão.

Japa leu a página de internet aberta, com um texto de Bukowski:

Existem coisas piores que estar sozinho, mas geralmente leva décadas para entender isso. E quase sempre quando você entende, é tarde demais. E não há nada pior que ser tarde demais.

— Já é meu poeta favorito — Japa balbuciou impressionada com as palavras, relendo em seguida. — Como se lê o nome dele mesmo?

— Bukowski — Feiticeira se levantou, desenrolando a toalha, pronta para voltar à piscina. — Charles Bukowski.

Japa terminou o cigarro e já acendeu outro. Admirou as belíssimas nádegas de Paula enquanto esta caminhava, rebolando involuntariamente.

— Tem uma frase famosa que carrego como filosofia — Nayuri disse, soltando a fumaça dos pulmões.

Paula parou de andar e olhou para trás.

— Acho que é de Shakespeare, mas já vi outros autores levanto crédito por ela, então, não sei ao certo — tragou mais uma vez, e liberou a fumaça. — Me ajudou muito. Serve pra todos nós aqui do Clube. Pra fugir do imposto de renda — riu. — E pra não atrair tanta atenção. Mas não vale só pra dinheiro. Vale pra tudo. Talvez seja útil pra você também.

— Qual a frase?

— "Tenha mais do que você mostra, fale menos do que você sabe".

Paula sentiu um arrepio. Fitou o olhar e o sorriso de Nayuri, tentando decifrar se ela estava apenas retribuindo as sábias palavras de Bukowski ou se estava brincando com ela, dizendo claramente que sabia de algo.

Ela me viu. Droga.

— Você sempre fala menos do que sabe? — Paula sorriu.

— Por incrível que pareça. Falo muito, mas nem sempre falo tudo. Aprendi a guardar as melhores cartas para o final.

— Vou me lembrar disso. Da frase.

— Olha só — Japa sorriu. — Consegui dizer algo interessante à Feiticeira.

Paula sorriu. Continuou a andar e mergulhou na piscina, onde desfez o sorriso e deixou o rosto expressar o que condizia com seus pensamentos.

############################

Isso vai dar merda.

Clube Proibido [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora