Capítulo 34: Trato

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— Bati! — vibrou Antunes, o sexagenário negro de cabelos brancos colocando os jogos feitos sobre a mesa.

— Deve estar roubando — acusou Libório, da mesma faixa etária, olhos claros cansados atrás das lentes dos óculos.

— Eu tenho culpa se vocês têm catarata e não enxergam direito? — Antunes deu uma risada comemorativa.

— Por que não pega seu andador e sai comemorando pela casa? — resmungou Jacó juntando as cartas para embaralhar.

— Morram de inveja da minha virilidade.

— Eu ouvi "morram de inveja da minha idade"? — zombou Libório.

Os três riram alto.

— Pergunte pra Paulinha — provocou o negro. — Ela sabe da minha virilidade.

— Olha o respeito! — ralhou Miranda sentada na sala. — Jacó, defenda sua neta!

— A audição da velha está uma maravilha — admirou-se Libório.

— Mais respeito, Morgan Freeman, ou vai perder os dentes — ameaçou Jacó mostrando o punho.

Antunes colocou a mão na boca e retirou a dentadura.

— Pode levar, tenho uma reserva.

Gargalharam alto. Miranda também riu, balançando a cabeça.

A idosa ouviu um carro estacionar em frente ao sobrado. Ouviu o apito do veículo sendo travado. A porta da sala foi aberta. Era Paula, com a roupa de academia da noite anterior.

— Malhou a noite toda?

— Pode-se dizer que sim — disse se agachando e beijando a bochecha da avó.

— Já almoçou, minha princesa? Já são duas da tarde.

— Já, sim, dormi na casa da Anabela.

— Dormiu lá sem ela saber? — a velhinha ergueu uma sobrancelha.

Paula deixou os ombros caírem.

— Ela passou aqui de manhã, não foi?

— Ontem à noite. Você ficou de dormir lá depois da academia. Ficamos preocupados.

Seu celular havia descarregado. Como moravam perto devia ter imaginado que ela passaria por lá.

— Desculpa, vó. Não queria preocupar você.

— Sem contar que se está chegando com essa roupa, não foi trabalhar de novo. Filha, você foi demitida? Pode confiar em mim.

Paula sentou-se ao lado da vó, passou a mão em seus cabelos brancos.

— Confie em mim, vó. Não estou envolvida com nada que deva se preocupar.

— Não mesmo?

— Não. Prometo.

— E esse carro novo, querida? Não quero me meter em sua vida, fizemos um trato, mas não pode deixar a mim e seu avô no escuro desse jeito. Amamos você e não queremos que se meta em problemas...

Paula beijou-lhe a testa.

— Pode deixar. Quando for a hora certa, eu conto tudo.

Assim que pensar em uma boa desculpa pra isso tudo. Não estou com cabeça agora...

Andou em direção à escadaria, que ficava na sala de jantar, onde o avô e os dois melhores amigos jogavam baralho.

— Reunião do asilo?

— Sua avó te deu o sermão? — averiguou Jacó.

— Sim, vô — beijou a testa dele.

— Que ótimo, assim eu não preciso mais.

— Cadê o meu? — Libório ofereceu o rosto para ela beijar.

— Cheio de células mortas. Eca — ela sorriu.

— Paulinha, diz pra eles o que você passou a noite fazendo comigo lá em casa — demandou Antunes, sorriso buliçoso.

— Claro que sim. Troquei seu soro e seu penico umas três vezes. Ah, e aferi sua pressão e troquei sua frauda geriátrica.

O avô e Libório explodiram na gargalhada, caçoando do amigo. Paula subiu as escadas, entrou no quarto, trancou a porta e jogou-se na cama, olhando para o teto. Já estava com o remédio em mãos, havia passado na farmácia de Tenório. Mas a mente estava em colapso. As palavras de Devassa ainda a perturbavam. Já não sabia mais o que fazer.

Mas tinha um desafio para estudar. Restava-lhe pouco tempo.

Maldita Devassa.

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