Capítulo 131: Carregada

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Assim que chegou da faculdade, Japa fez o que sempre fazia: colocou o som bem alto, deu atenção a Yoko e em seguida foi tomar um banho demorado. Tinha conseguido realizar dois desafios no mesmo dia e o próximo estava encaminhado para o dia seguinte. Estava indo bem, muito bem, sabia. Ao ouvir a campainha, apressou-se em se enrolar na toalha para ir atender. Ao abrir a porta, sua surpresa não poderia ser maior.

— Muito ocupada? — perguntou Devassa com uma sacola na mão e a bolsa no ombro.

— Não... — balbuciou.

— Trouxe um mimo pra Yoko — ergueu a sacola de papel. — Posso entrar?

Nayuri ficou meio segundo completamente sem reação, tentando encontrar as câmeras da pegadinha. Mas apressou-se em abrir caminho:

— Pode entrar, claro.

Ao ver Sara, Yoko imediatamente correu para se esfregar nela, tal qual fazia quando Japa chegava em casa.

— Também senti sua falta, pretinha — disse a loira se abaixando para passar a mão na gata. — Olha o que eu trouxe pra você — abriu a sacola, tirando de dentro alguns biscoitos crocantes. Yoko prontamente avançou sobre o primeiro que ela ofereceu.

— Ela adora essa marca — Japa comentou, ainda atônita com a inesperada visita.

— Não se preocupe, não está envenenado — Sara disse pegando um dos biscoitos e jogando na boca, mastigando em seguida.

Japa abriu um sorriso.

— Eu sempre faço isso. Se eu gostar dou pra ela. Se não, provavelmente ela vai detestar.

Sara se levantou, estendendo a sacola para Nayuri, recebeu prontamente.

— Obrigada.

— De nada.

Após uma pausa constrangedora em que Japa aguardava Sara dizer o real motivo da visita, esta finalmente falou:

— Pode ir se vestir, se quiser. Não vou fugir com a gata. Prometo — beijou os dedos cruzados.

— Quem é você e o que fez com a Devassa que eu conheço?

Sara riu.

— Nem sempre sou um monstro. Às vezes eu durmo.

Japa riu.

— Tá, eu vou me vestir. Volto em um instante.

— Sem pressa.

— Quer algo pra comer ou beber?

— Quando você voltar.

— Beleza.

Japa saiu, meio desengonçada, em direção ao próprio quarto. Vestiu-se rapidamente, pensando freneticamente no que poderia significar aquela visita. Penteou o cabelo enquanto voltava para a sala.

— Uísque?

— Pode ser.

Japa foi até a cozinha, que muito lembrava um Pub. Serviu dois copos. Sentou-se na poltrona perpendicular ao sofá em que Devassa estava sentada. Não houve brinde. O clima de constrangimento ainda pairava.

— Acho que quase todos os membros moram sozinhos — refletiu Sara. — Parece ser um dos requisitos.

— Eu tenho a Yoko.

— Pelo menos isso.

— Você tem uma filha.

— Não conta. Não vive comigo.

— Deve ser horrível.

— A gente acostuma — deu um sorriso triste. Estava claro que não havia se acostumado.

— Ao menos ela é bem tratada?

— Eu me certifico disso.

— Eu te admiro, sabia?

Sara olhou-a nos olhos.

— Por quê?

— Você é durona, uma máquina. Não baixa a cabeça pra ninguém. É tipo aquelas anti-heroínas, ou aquelas vilãs bem massa, entende?

Sara riu como se ouvisse um comentário engraçado de uma criança.

— E tenta esconder que tem um bom coração, mas tem — Japa continuou.

— Eu não entendo você, menina — Sara estreitou os olhos encarando-a como se a analisasse. — Você devia me odiar. Pâmela acha que vai se vingar em algum momento, mas eu não tenho pressentimento ruim algum com relação a você.

— Eu te odiei quando achei que você fez aquilo com a Yoko. Mas não consigo guardar rancor. Eu tento aprender. E graças a você estou indo bem. Depois de tudo que você me disse, sabe?

— Sua bondade me incomoda. É como um cãozinho que você bate mas que logo vem com o rabinho balançando pra você.

— Vou tomar isso como elogio... eu acho.

Sara riu.

— Você tem que admitir.

— Adoro cãezinhos — Japa disse fazendo uma careta infantil de fofura.

Japa foi buscar a garrafa de uísque. Devassa bebeu o resto que tinha e deixou que a outra preenchesse o copo até a metade.

— Sobre ser "durona" — Sara começou. —, é essencial em nossa "profissão" — fez as aspas com os dedos. — Nos envolvemos com estranhos o tempo todo. E querendo ou não somos vistas como mais vulneráveis. Apesar de o Clube garantir que nossos alvos são limpos, eu sempre tomo minhas precauções. E para não acontecer o que aconteceu com o Negão, eu sempre carrego isso — Sara abriu a bolsa, tirando de dentro uma pequena pistola preta.

Japa gelou ao ver a arma.

— É uma Taurus. Pequena, mas letal. Pode pegar — Sara ofereceu sobre a mão espalmada.

— Está carregada? — Japa recebeu-a, maravilhada e temerosa ao mesmo tempo.

— Claro. Não tem utilidade se não estiver.

— Poderia usar só para intimidar?

— Desse tamaninho é capaz de acharem que é de brinquedo. A função é uma só: atirar quando necessário.

Japa manuseou-a por alguns segundos, então apontou-a para Sara, com uma expressão de triunfo.

— Será que funciona mesmo?

— Não brinque com fogo, menina — Sara disse, impassível.

— Aff — Japa segurou a pistola pelo pequeno cano e entregou-a pelo cabo. — Não tem graça tentar intimidar você. Não tem medo de nada.

— Tenho medo de muitas coisas — guardou a pistola na bolsa.

— Nem imagino você com medo.

— É o maior triunfo que alguém pode ter. Parecer invencível.

A conversa continuou, logo entrando no âmbito família. Japa contou sua história, sobre a traição do pai até entrar para o Clube.

— Temos mais em comum do que eu imaginava, então — Sara observou. — Ambas temos pais estrangeiros e mães brasileiras. Nossos pais são babacas e nos traumatizaram de alguma forma.

— Não sei muito sobre você. Tinha muita curiosidade de conhecer sua história, Devassa.

— Outro dia, talvez. Tenho que ir — levantou-se.

— Já?

— Tenho compromisso. Yoko!

A gata caminhou até a loira e esfregou-se em sua perna. Sara se agachou para retribuir o carinho.

— Tchau, gatinha — e se levantando. — Obrigada por me receber.

— Seja bem vinda.

Japa acompanhou-a até a porta e viu-a andar até o elevador. Fechou a porta, sorrindo. Sentiu-se realmente bem com a visita. Especial, até.

Ficou então pensando na pistola.

Clube Proibido [completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora