One da fobia, tema Altura, da Ellen.
É No Medo Onde Somos Reais
“Só tenho esse caderno de anotações comigo, sinto que vou enlouquecer se não começar a anotar botar o que eu sinto para fora. Eu não devia ter subido aqui, que insanidade! Eu sou muito idiota por simplesmente vir aqui em cima com meus amigos apenas para provar que somos corajosos. Isso tudo não passou de um acidente causado por pessoas idiotas, estamos presos, em um posto de caça. A escada quebrou quando subimos e Anderson mal conseguiu chegar até aqui, me sinto feliz por ele não ter morrido. Faz muito frio durante a noite, esqueci que estamos entrando no inverno. A altura também não ajuda, estamos mais altos que algumas árvores da planície e até agora ninguém chegou para nos ajudar. Não tem sinal no celular. Não tem sinal para ninguém. Isso é normal? Percebi que o posto está muito velho. Ninguém aparece! Já faz três dias que estamos presos aqui em cima. ”
– Estamos realmente presos aqui, não é? – Erica perguntou, estava mais pálida do que o normal, dava para perceber que não estava bem. Na verdade, ninguém estava. Todos nós estávamos morrendo de fome.
– Nossos lanches já acabaram, precisamos fazer alguma coisa! – Anderson reclamou, bastante exaltado e cuspindo saliva.
– Foi o filho da puta do Ramon que deu essa ideia de idiota! Ninguém estaria aqui se não fosse por ele! – Erica apontou para um jovem assustado que estava quieto, sentado no canto da sala e olhando para suas mãos.
– Nós só precisamos descer. – Sugeri, olhando para baixo. Um frio se alastrou em minha barriga e eu imediatamente dei um passo para trás. Era apenas um buraco no chão, pelo qual as pessoas desciam pela escada, que agora estava quebrada.
– O que foi que o instrutor disse? Não saiam da trilha e não entrem nas velhas estruturas do parque. – Erica colocou a mão no rosto e começou a chorar.
– Alguém precisa descer. – Anderson levantou e começou a andar em direção a Ramon. – Você! Você nos colocou aqui e é você que vai tirar a gente daqui! – Anderson tinha quase um metro e noventa, parecia que ele ia esmagar o pobre do Ramon.
– Eu não posso! Olha a altura disso! Não tem como...
– Cala a boca! Faça algo de útil, seu merda! – Ele colocou nosso amigo em frente ao buraco, com a mão nas suas costas. Anderson mal piscava, já Ramon estava tremendo de medo. – Olha como Erica está! Você vai deixar ela ficar assim?
– Eu tô bem, Anderson, deixe ele ir embora! – Erica implorou, chorando. Olhou diretamente em seus olhos, tentando enxergar algo além do irracional que habitava nele. É isso o que nos tornamos diante da fome e da insegurança.
– Não. – Anderson empurrou Ramon, não deu para ver muita coisa além do corpo dele passando pelo buraco. O som do impacto do corpo dele no chão se espalhou pelo ambiente, não houve mais um som algum, provavelmente ele estava morto. Um grito agonizante e forte veio em seguida, arrepiando toda minha pele.
– Porra! Ah não! Ah não! – Ramon gritou, desesperado. Corri até o buraco e coloquei a cabeça para ver o que aconteceu. Suas pernas estavam fraturadas de forma que o osso saia pela lateral.
– Agora tente procurar ajuda! – Anderson gritou e foi até o canto da sala, sentou e começou a chorar.
Ramon gritou por ajuda por horas, ninguém foi socorrê-lo, nem mesmo a gente. Ficamos sem dizer uma única palavra por horas, anoiteceu e amanheceu novamente e nem um de nós dormimos.
‘-‘-‘
“Novamente estou aqui, tentando escrever nesse papel. Não dá mais para fazer nada, todos nós estamos com muita fome, Ramon está lá embaixo, apodrecendo. Mais dois dias se passaram, Anderson continua encolhido naquele canto e Erica está desmaiando toda hora. Não dá mais. Simplesmente, eu desisto. “
Fechei o caderno de anotações e o atirei pela grande janela que servia para observação. Ele não foi muito longe, pois já estava muito fraca para fazer qualquer coisa. Arrastei-me até a borda da entrada e fechei os olhos.
– Não. – Ouvi a voz de Erica, bastante fraca. – Não faz isso, eles vão nos encontrar, só... espera.
Eu não estava raciocinando bem, naquela hora, aquela altura imensa parecia tão convidativa que dava pra senti-la me chamando para perto.
– Puta merda! – Ouvi uma voz masculina assustada, abri meus olhos e percebi que alguém encarava o corpo de Ramon, era um dos velhos que instruíam na trilha.
– Nos ajuda, por favor! A escada quebrou! – Gritei, reunindo minhas últimas forças e recuando para trás. Me encostei do lado de Erica e sorri. – Vai ficar tudo bem agora.
– Não importa quanto tempo passe, eu nunca vou esquecer esse som irritante que o vento faz aqui em cima.
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Amigo Oculto Literário
Short StorySorteio entre amigos do grupo do Whatsapp ajudando escritores, em que cada participante recebe em sigilo o nome de outro a quem deve presentear com uma one shot.