De Ariane Fonseca para Leo Pitol
10 – O último adeus
Noah chega em casa anestesiado de tanta alegria, com um sorriso que não consegue esconder nos lábios. Não havia dúvidas. Ele amava Gael de todo seu coração. Adorava seu jeito tímido e despojado ao mesmo tempo, aqueles cabelos azuis gritantes e seu olhar terno. Passou algum tempo afastado por medo de assumir quem é, por medo de sua família, contudo, isso não iria mais acontecer. Amar não é vergonha. A vida é muito curta para ser desperdiçada. Luana estava longe de ser a pessoa que o faria feliz.
Ontem depois de visitar Helena eles foram para o apartamento de Gael, aproveitando a ausência da mãe, e passaram a noite se amando de todas as formas possíveis. Se o beijo já o tinha enfeitiçado, sentir o calor do corpo daquele garoto o fez ficar totalmente gamado. Não há voltas depois de todas as juras e toques da noite passada.
— Onde você estava, Noah? — uma voz firme e irritada interrompe seus pensamentos após fechar a porta da sala.
— Helena se acidentou, fui visitá-la. — omitiu.
Estava decidido a enfrentar a família por Gael, mas faria uma coisa de cada vez. Primeiro, terminar com Prodígio, depois deixar tudo às claras.
— Luana está atrás de você, falou que sumiu sem dar notícias. Já disse que não te quero com essa tal de Helena e aquele menino do cabelo azul.
— Gael, mãe. O nome dele é Gael. — responde cansado, revirando os olhos.
— Você estava com ele, não estava Noah? Pensa que eu sou idiota. Não vou pedir de novo para ficar bem longe daquele garoto.
Noah não queria jogar tudo no ventilador de uma vez, porém, não via mais como aguentar sua mãe falando daquele jeito do homem da sua vida. Daquele que o fazia sorrir sem motivo, sentir um frio na barriga e as mãos suadas.
— Estava! Se quer saber, estava e voltarei a estar. Não vou mais manter um relacionamento de fachada com Prodígio só porque é filha da sua amiga. Só porque você não aceita um filho gay! — grita desesperado, soltando tudo que tinha vontade de falar.
— Você não vai mesmo! Eu não admito você desonrar o nome da nossa família ficando com aquele menino. Além de homem não é da nossa classe social. Luana sim é a pessoa certa para você!
Noah sentia-se enjoado. Como a sua própria mãe poderia lhe desejar a infelicidade? Ela sabia que ele não gostava de Prodígio. Dessa vez seria firme, seja qual fosse a ameaça, não cederia aos caprichos da sua família por aparência.
— Nem adianta, mãe. Pode me ameaçar, tirar minha mesada, me trancar aqui em casa. Em vou dar um jeito de ficar com Gael. Sabe por quê? Ele é o amor da minha vida, me completa e faz feliz.
— O que você sabe do amor, moleque? É uma criança ainda.
— Com certeza, sei mais que a senhora que casou por interesse e agora é assim amarga e infeliz.
Fez-se silêncio por um breve momento até que um grande estralo invade o ambiente. Noah levou um tapa na cara de sua mãe e passa as mãos no rosto para aliviar o susto. Ela nunca tinha perdido a paciência nesse nível antes, mas o filho não se arrependeu de dizer algumas verdades.
— Se você gosta desse menino como diz, escuta só que falarei uma única vez: some de perto dele. Tenho como acabar com sua vida em um telefonema.
— Do que a senhora está falando? — questiona Noah acreditando ser mais um blefe.
— Quando o pai de Gael foi embora e abandonou sua mãe, deixou a família cheia de dívidas. A pobre mulher teve que hipotecar todos os bens e pedir um empréstimo no banco do seu pai. Tudo que eles têm está em nossas mãos. O valor é muito alto e a coitada mal consegue pagar as prestações. Vive renegociando.
— Não. Você não faria isso. Deixá-los sem nada por puro capricho.
— Não só faria, como arruinaria qualquer possibilidade deles se reerguerem nessa cidade. Gael teria ódio de você por ser filho da família que destruiu a sua.
— Eu sou seu filho, merda! — grita transtornado. — Como pode não querer minha felicidade?
— Precisamos manter o respeito e a tradição do nosso nome.
Sem forças para discutir, Noah sobe as escadas e deixa a mãe na sala. Não acredita como sua alegria pode se transformar em terror em tão pouco tempo. Será que sua mãe teria coragem de acabar com a vida de Gael? Ele sabia que sim. O amava demais para permitir que passasse necessidades e perdesse o que tem.
Deitado em sua cama, agarra o travesseiro e se permite chorar. Chorar intensa e desesperadamente pelo amor que jamais irá sentir novamente. Esse tipo de sentimento só bate na porta uma vez. Queria se despedir do amado, entretanto, tinha que fazer Gael o odiar com todas as forças e se afastar. Com ele por perto era difícil pensar com a cabeça e manter os planos.
Pega o celular e passa os dedos delicadamente na foto tirada hoje de manhã, quando o garoto do cabelo azul dormia despreocupado ao seu lado. Sorriu com lágrimas nos olhos e confessou baixinho dando um beijo na imagem: Eu te amo para sempre, Gael. E é por esse amor que vou fazer isso.
Usou a mesma foto e um programa de edição de imagens do celular para dizer o adeus definitivo a Gael. Ele não perdoaria isso de forma alguma. Terminou rapidamente e apertou enviar para todos os grupos do seu WhatsApp antes de desistir. Voltou a deitar na cama e o soluço tomou conta do seu corpo. Noah tremia dos pés a cabeça e seu coração se sentia despedaçado.
Do outro lado da cidade, um Gael feliz conversava com o anjo da guarda quando recebeu uma mensagem. Seu sorriso ampliou de tamanho ao ver quem era o remetente, mas rapidamente se desfez. Não podia ser. Faltou-lhe o ar e a visão ficou embaçada. Teve vontade de vomitar e correu para o banheiro com o aparelho nas mãos. Forçou-se para olhar de novo.
A imagem era de hoje de manhã, enquanto dormia. Saliva saindo de sua boca e uma camisa de força davam o tom de loucura para a foto. Do outro lado um Jordan vestido de médico com um chicote na mão. Na descrição em letras grifadas: O riquinho domou o esquizofrênico.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Amigo Oculto Literário
Short StorySorteio entre amigos do grupo do Whatsapp ajudando escritores, em que cada participante recebe em sigilo o nome de outro a quem deve presentear com uma one shot.