CIRCO DO TERROR

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   One shot de Bia para Egle

Bia correu. O pavor da menina a fazia correr sem ver onde ia. Estava escuro e o caminho era duvidoso. Ela não queria saber disso. Apenas corria!

    Seu medo começou quando ela ainda era criança. Seus tios a levaram ao circo. O espetáculo era lindo, ainda se permitia os animais no show. A mágica lhe chamou atenção, mas o palhaço, lhe deu medo. Ele ficou perto dela, dava susto quando estava distraída e a cutucava para comprar as bolhas de sabão que ele vendia.

    Todos riam, pensando que ele estava brincando, mas em Bia, um pavor crescia, fazendo-a querer correr daquele lugar. Assim, a menina cresceu e nunca mais fora ao circo. Até agora.

    Em seus vinte anos, fez a pior coisa que poderia. Contou aos seus colegas de faculdade o seu pavor de palhaço. Todos riram dela, claro. Como alguém poderia ter medo de algo tão bobo e inofensivo? Como esse medo se explica? Não se explica, apenas existia.

    A faculdade recebeu um palhaço para fazer propaganda do circo que estava na cidade. Toda vez que Bia passava por ele, ela se encolhia, quase tremia. Quando ele lhe entregou o folheto, ela andou, sendo mal educada, em não pegar o papel. Suas amigas perguntaram o porquê e ela contou. Aquilo foi o suficiente para caçoarem dela. O namorado de Bia, defendeu-a, deixando todos quietos. Mas em sua cabeça havia um plano, que colocaria em ação naquela semana.

    Silvio, marcou com ela no centro da cidade. Lá havia um terreno grande, que recebia parques itinerantes. Ela não sabia o que encontraria, mas se arrumou para uma bela noite ao lado de seu amor. Escolheu uma calça jeans skiny, uma blusa azul justa, deixando seu colo bonito a mostra no decote em v e, como estava um vento frio, um casaco branco. Nos pés calçou um sapato preto de salto, assim ficava da altura do rapaz. E deixou o cabelo solto, pois Silvio gostava.

    Ele também se arrumou. Vestiu calça jeans, blusa polo branca, que marcava seus ombros largos e peito definido. Penteou o cabelo liso e passou perfume. Entrou no carro e foi encontrá-la, mas estacionou na esquina adiante e esperou. Como marcaram às dez da noite naquele sábado, não havia ninguém naquela área do centro. No carro, havia um casal de amigos, fazendo parte da brincadeira e esperando a reação de Bia ao ver o que havia ali.

    Chegando lá, ela parou, empacou. Por que Silvio fez isso com ela? Marcar no lugar onde o seu medo começou? Após quatorze anos, não superara o medo de palhaço e estar em frente ao circo, fazia suas pernas tremerem, a respiração ofegar e suas mãos suar. Quando voltou a raciocinar, pegou na bolsa o celular e ligou para ele.

    - Alô – dentro do carro, vira a reação de torpor dela, fez um gesto para silenciar a risada dos amigos, no banco detrás.

    - Onde você está? – a voz de Bia era de quem ia chorar.

    - Você já chegou? – ele também achou engraçado o medo dela.

    -Sim.

    - Estou dentro do circo te esperando. Entra aqui, tenho uma surpresa para você. – ele falou com voz macia, como se fosse levá-la para a cama. Ela sempre caía na dele, ficando animada só de ouvir.

    - Tudo bem – ela sorriu, respirou fundo e entrou no circo, de lona vermelha e amarela, totalmente vazio e escuro. Com o celular ainda na escuta, ela falou. – Onde você está?

    -Bem aqui, atrás de você. – Bia gritou quando virou e o celular caiu no chão.

    Então ela correu, indo mais fundo no circo, sem ver o caminho e tropeçando na arquibanca. Sentiu uma mão agarrar o seu cabelo, fazendo parar no meio do picadeiro. De repente, as luz se acenderam e ela viu o palhaço triste e com roupas rasgadas. De seu pescoço, escorria sangue de um corte preciso, na horizontal. Ele gargalhou ao ver o horror nos olhos da menina. A maquiagem borrada completava o visual do palhaço.

    Do lado de fora, Silvio começava a se preocupar com Bia. Havia tempo que ela entrara no circo e sumira. Saiu do carro e foi para a entrada, quando ouviu um grito vindo lá de dentro. Tentou entrar mas não conseguiu. Gritou por ela, mas a mesma não ouviu. Ele correu, tentou entrar por trás, a essa altura o casal estava ao seu lado, preocupado também. Porém, nada poderiam fazer.

    Bia se viu em um espetáculo de horror. Apareceram outros dois palhaços. Um gordo, que mancava e o sangue sujava a roupa colorida, na altura de seu peito. Outro, alto, que não tinha um dos braços, deixando a mostra suas carnes internas. A menina foi posta em cima de um salto. Enquanto ela chorava, eles faziam o show. Riam dela, enquanto o gordo andava de monociclo, o alto, tentava fazer malabarismos e aquele que a pegou, dava cambalhotas. Bravo! Bravo!

    Aqueles palhaços, foram mortos há cinquenta anos, pelo dono daquele mesmo circo, porque simplesmente não fizeram as crianças rirem. Seus espíritos ficaram presos à lona, que ainda era usada e fora apenas restaurada. O circo era um negocio de família, passando assim de pai para filho. Sempre à noite, eles apareciam para fazerem o seu show. Mas nessa Bia tivera o azar de aparecer, pois eles não queriam mais risadas, e sim vingança e morte.

    Ela chorava, paralisada pelo medo e por não saber o que fazer. No momento dos agradecimentos à arquibancada vazia, ela tentou correr de novo, dessa vez para os bastidores, mas sem sucesso. Uma bolinha acertou-lhe a perna, enquanto o palhaço gordo foi para a sua frente. Nesse momento, o palhaço que a agarrou trazia detrás da lona, a mesa do atirador de facas. Bia foi presa nela e desesperada, gritou um pouco mais.

    Lá fora outro circo se armava. Silvio não conseguiu entrar e começando a ficar desesperado, chamou a policia, passada uma hora de tentativas e gritos ouvidos lá dentro, mas não conseguiram fazer nada. O show já havia começado e era apenas para Bia, a garota com medo de palhaços. Quando tentavam entrar, eram empurrados por ninguém, quando tentaram rasgar a lona, essa parecia concreto. Até as balas voltaram quando os policias atiraram.

    Enquanto isso, outra parte do show começava. A mesa girava com Bia fixa e apavorada. Aquilo lhe enjoou, quando ouviu uma faca ser atirada. Esta parou no meio de suas pernas, outra bem perto de sua mão e mais uma encostada a sua orelha. Bia gritava e chorava, não havia mais nada o que pudesse fazer, a não ser orar. E foi o que ela fez. O show continuava, mesmo assim. Logo uma faca atingiu sua coxa esquerda. Dessa vez, os palhaços macabros aplaudiram. Outra faca, acertou em sua mão direita e outra em sua barriga. Bia sangrava, chorava e gritava naquela mesa giratória. Já tinha medo de palhaço, agora era morta por eles. Bia desmaiou.

    No dia seguinte, tentou abrir os olhos mas não conseguiu. Ouvia pessoas ao seu lado chorando, pedindo para que acordasse logo. Vozes conhecidas e nenhuma risada macabra. Mas apagou de novo. De noite, abriu os olhos e viu uma televisão, tentou olhar ao redor e viu-se no quarto de um hospital, de parede amarela claras. Ao seu lado, havia um rapaz na cadeira, dormindo.

    Olhou para o seu corpo, estava no oxigênio, com a coxa e mão enfaixada e com dor na barriga, mas não pôde vê-la por causa da camisola e da coberta. Fechou os olhos, aquela noite fora real. Meu Deus! Silvio percebeu que ela acordara pela sua respiração. Com um olhar, misto de raiva e duvida, ele entendeu o que queria. Contou-lhe então, como tentou entrar no circo, como fez de tudo para tirá-la de lá, mas quando ele já perdia as esperanças e começara a chorar, no momento exato que desmaiou, o circo pegou fogo. Do nada e sem explicação.

    Todos que estavam ali fora, policiais e alguns curiosos, viram quando o fogo lambeu a lona, feito cortina se abrindo para o show. Assim viram também o que acontecia lá dentro, e o pânico se espalhou, pessoas correram e foram empurradas, mas Silvio só pensava em tirar a Bia de lá. O fogo espantou os palhaços e conseguiram tira-la de lá.

    - Agora você acordou – ele concluiu feliz a historia, beijando sua testa.

    Como estava de mascara, revirou os olhos ao mesmo tempo em que suspirava aliviada. Estava viva, mas ainda tinha pavor de palhaços, agora maior ainda. O que aconteceu com ela tinha um culpado. Senão tivesse saído de casa para...

    Bia encostou a mão no ombro dele, que a abraçava. Como não podia falar, chamou-lhe a atenção e com a mão boa, mostrou-lhe o dedo do meio. Depois fechou os olhos e descansou mais um pouco...

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