MEDO DA ESCURIDÃO

31 6 2
                                    

One shot de Gabi para Felipe

Corro como se não houvesse amanhã. O suor em meu rosto já se faz presente. Tento não pensar em nada além da minha estratégia. Meu rifle logo estará sem balas. Vejo uma rua iluminada à direita e sigo. Estou no caminho certo pelo menos. Posso ouvir os gritos assombrosos dos mortos. Malditos corpos mal cheirosos que adoram morder. Chega. Não tenho tempo pra debates internos.
Pego meu rádio que também não irá durar por muito tempo.
- Fischer, rua 17 lado oeste, à caminho da sede.
- Entendido. Prossiga, daremos cobertura.

Agora é a hora, a próxima rua é muito ampla, alguns zumbis andam sem rumo, não me perceberam, não posso em hipótese alguma fazer barulho. Eles são cegos, atraídos pelo som, e pelo cheiro, mas peguei algumas roupas de um cadáver sem vida e isso me ajudara se eu for rápido. O raciocínio dessas coisas é uma  bosta.
  Respiro fundo, agarro meu rifle precisamente. Não terei a opção de atirar. Pego a faca em outra mão, corro com o passo mais leve possível, consigo passar por alguns zumbis, poucos pareceram sequer  notar algo, mas nenhum me seguiu.
  Já posso ver alguns colegas a postos nos cantos da rua perto de saídas de emergência de nosso esconderijo. Sigo para a entrada principal que está à poucos metros de mim quando de repente os postes de luz se apagam e não enxergo mais nada à minha frente. Paro imediatamente. Não posso me mover. Não consigo nem respirar direito. Sufoco um grito, mas minha respiração ofegante esta alta o suficiente e já posso ouvir zumbis gritando atrás de mim. Eles são cegos, já convivem com a escuridão, então não a temem. Eu ainda não tenho controle do corpo e fico parado tremendo. Os zumbis não me assustam. Sinto uma mão me agarrar e a corto fora. Jogando e seguida a faca na direção do pescoço ouvindo por fim um grito da aberração. Que morreu por completo.
  Grito. Não sei o que fazer. Outras mãos me agarram.
"Dennis, vamos, corre!!"
"ele não responde"
"Levem ele daqui... Mas que merda, me dá a sub metralhadora"
"Dennis, vamos"

Eu ouço vozes e gritos, tiros também, ouço meu coração bater rápido demais, eu não enxergo, estou no escuro, preciso de luz. O que está acontecendo? Porque não há luz??? Eu não suporto isso, não posso respirar. De repente, não sinto meu corpo. Talvez seja melhor. Não pensar, nem respirar. Talvez eu acorde longe daqui?

-------------

- Comandante, ele desmaiou

Ótimo, era o que faltava, termino de metralhar mais uns 3 zumbis.

- Emily, leve ele, Christian vai te ajudar a carregar, vou abrir o caminho para a entrada da ala B. Fique atenta.

Não me conformo, no meio de um apocalipse zumbi, o homem que mata como ninguém, mais focado e preparado para as piores situações, que já arrancou um pedaço do pé para sobreviver, pode temer o escuro. Deixo a sub no pescoço com o suporte que me envolta e pego a Scar-H do chão. Tem lanterna e nem nisso ele conseguiu pensar. Ligo e atiro na cabeça dos zumbis abrindo caminho até a ala B onde tem um soldado também atirando. Fizemos barulho demais. Me junto ao soldado enquanto os outros entram com Dennis. Zumbis estão subindo a rua. O soldado entra e eu continuo atirando.

- No 3, eu vou entrar e você ira fechar essa merda em seguida, não pode haver erros. Pronto?
- Sim senhor!

- 1
Estou atirando nos zumbis o mais rápido que posso para ter controle do fluxo.
- 2
Um grupo enorme se aproxima, não há mais tempo
- 3!
Pulo pra dentro sem nem ligar para a escada que estava ocupada pelo soldado, ele fecha quase imediatamente, gira a trava de titanio e ficamos um tempo analisando a porta para ver se haverá problemas. Os momentos são tensos enquanto aguardamos os gritos se afastarem.

-----------

Acordo numa cama do ambulatório, tem soro na minha veia e não me lembro de muita coisa, além de que eu estava a caminho da sede depois de uma ronda.

- Ahh, você acordou! Que bom, você assustou todos, teve um ataque de pânico em meio uma renca de mortos vivos. Tivemos que te carregar.
Emily aparece me contando.

- Estou me sentindo bem. Já posso sair daqui? - tento mudar de assunto, não quero falar sobre isso. Estou me odiando por ter deixado acontecer.
- Ah, claro que pode. O chefe te espera no QG.

- Obrigado

Tiro as agulhas de qualquer e dou o fora. Vou caminhando e alguns me olham com certo receio, sou um dos mais importantes soldados aqui, não posso fraquejar dessa forma.
Chegando ao QG, a cara do comandante não é a das melhores.

- Que aquela porra que aconteceu não se repita. O senhor entendeu?? - diz ele com um tom perigosamente calmo. Fico sem ter o que argumentar e apenas assinto.

- Sim senhor.

Ele me encara, no fundo ele entende o que houve, mas não diz nada.

- Certo, iremos a um resgate amanhã ao amanhecer, Um homem e 3 crianças estão alojados numa casa no setor sul da cidade, exatamente na fronteira da área 16 com a 17 - o comandante aponta no mapa - iremos em 6 pessoas, o homem nos contatou, tem experiência com artilharia.

E de repente, todas as luzes se apagam no abrigo inteiro, e ouço um grito. Merda, temos zumbis aqui dentro. Me agacho no chão e as malditas lembranças começam a passar como um filme..

" - Mamãe, quando o papai vai chegar??
- Logo logo meu amor. - diz mamãe passando a mão nos meus cabelos.
  Papai tem que chegar logo, fiz um desenho nosso e ele vai adorar. Mamãe adorou também. Tem eu, papai, mamãe e meu irmãozinho que está dentro da barriga da mamãe.
Ouço o barulho da porta, deve ser o papai, vou esperar ele no meu quarto, vou ficar dentro do guarda roupa e assustar ele. Entro e espero. Que silêncio...
De repente mamãe grita, o que está acontecendo, as luzes se apagam e eu só ouço gritos e choro. Mamãe? Não posso sair, estou com medo. Olho pela fresta do guarda roupa mas está tudo escuro, estou tremendo, o desenho do papai está molhado do meu choro. Cadê ele? Agora ouço rosnados, parece que tem um animal no quarto, não vou sair daqui. Não posso. Tem algo la fora. Vou deixar quietinho, mamãe e papai vão vir me procurar.

-----  

- Ei, garoto. Venha comigo, saia dai. - uma mulher fala comigo e eu acordo, cade o papai?
- Quem é você? Cadê a mamãe? - digo chorando, quero meus pais.

- Você precisa vir comigo, meu nome é Carla, seus pais logo vão voltar, eles pediram pra e buscar. - ela diz com carinho. Saio do armario e ela me pega no colo. Já está de dia e o chão esta vermelho, acho que derrubaram tinta. Quando passo pela sala vejo alguns bonecos no chão embrulhados
  Ela me solta e pede pra ficar no meu lugar, ela vai conversar com uns moços e eu quero ver os bonecos. Vou ate um deles e tiro o pano, ele é igual ao meu pai. E a outra boneca igual à minha mãe. Porque? De repente eles abrem os olhos e eu grito. Papai me agarra e tenta me morder. Os homens atiram na cabeça deles e eu fico tremendo em choque. Meus pais? E meu irmãozinho.

- Ei, pequeno, olhe pra mim - Carla olha nos meus olhos mas não vejo mais nada.

- Eram eles não é? - sussurro chorando.

- Sim... - ela responde

- Meu nome é Dennis

Ela me olha com dó, adeus papai, adeus mamãe. "

Estou chorando, isso não pode acontecer de novo. Quando tudo se iluminar eu vou ter perdido tudo, perdido minha familia, eu não posso perder o que tenho, não consigo lidar com isso. Não aguento isso mais uma vez, minha respiração está se tornando difícil. Ouço gente gritando o longe. Calem-se.

- Dennis, recomponha-se, va salvar as pessoas, hoje você pode evitar o pior. Tome - diz meu chefe entregando uma Type-25 carregada equipada com lanterna. Eu tento pensar e no fundo do meu ser minha consciência parece despertar. Posso mudar isso, dessa vez posso evitar ver gente morta quando a luz voltar. Pego a arma. Dessa vez, eu vou salvar quem eu puder.

- Ninguém vai morrer se depender de mim.

Saio mirado e começo a atirar, hoje a noite vai ser longa mas a escuridão não vai vencer.

Amigo Oculto LiterárioOnde histórias criam vida. Descubra agora