Lux In Tenebris

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One de Ana para Caren.

A primeira coisa que você precisa saber sobre anjos e demônios é: eles nunca se deram bem.
E é exatamente por isso que anjos e demônios nunca, de fato, se relacionaram afetivamente. Nós, híbridos dessas duas criaturas, fomos um experimento, um experimento de laboratório cruel, dolorido, desesperador, insano, perturbador e, para mim em especial, também responsável por me fazer sentir. Meu nome é Aurora, ou Lua Tenebris, e essa é a história de como eu me apaixonei, mesmo desafiando as leis da minha raça.
   Papai fazia 350 anos e, com isso, ganhava uma nova nomeação entre os demônios mais velhos. Ele era um dos mais velhos depois de Gox, nosso líder. 400 anos de idade, muito protetor e proporcionador de anos e anos sem guerra.
Então, o clima ficou estranho. Lembro-me de grandes olhos cor de mel me fitando. Eu podia ouvir seu coração mais acelerado do que deveria e o cheiro de medo exalava de seus poros. De jaleco um pouco acima do joelho, vez ou outra colocava a mão no bolso como se tentasse mexer em algo guardado ali. Até que o vi se aproximar de mim, pude vê-lo mais de perto.
Sorriso amarelado, olhos grandes e cabelos negros bagunçados com a franja cacheada caindo na testa.

— Desculpe. - sussurrou no meu ouvido como se estivesse prestes a fazer algo ruim. — Gostaria que tivéssemos nos conhecido de outra forma.

Ele puxou a seringa do bolso e tirou o ar que ainda restava nela. Pude sentir a ponta da agulha atravessando minha pele. O líquido vermelho quente que entrava em minhas veias me causava tontura. E então, apaguei. Não via mais nada, não escutava mais nada e nem sentia mais nada.

Uma enorme e completa escuridão. Eu estava morta, ou quase.

                     
          💉💉💉💉💉💉

Meus olhos estavam embaçados e meu corpo formigava. Braços unidos numa espécie de algema grudada na parede metálica na qual eu estava...presa?
Ainda podia sentir o odor de medo exalando por ali, mas não era tão forte quanto antes. Estava misturado, naquele momento, com uma espécie de cheiro adocicado e levemente enjoativo para minhas narinas. Ele estava lá, observando todos os meus não-movimentos.

— Não se preocupe, James. Não vai demorar muito até que eles se transformem logo. - ele sorriu provocativo quando se deu conta de que eu estava acordada. — Oh, olá! Vejo que nossa primeira cobaia acordou depois de tantos dias. Como se sente?

O homem de cabelos negros estava tão perto de mim que mesmo com a sensação esquisita de choques percorrendo todo o meu corpo, juntei forças existentes e inexistentes na intenção de que conseguisse atacá-lo. Meus pulsos ardiam quando eram cada vez mais pressionados pela algema gelada, mas tudo que eu gostaria era de poder sair dali.

— Ei, ei! Vamos com calma. - tirou outra seringa do bolso do jaleco e eu gelei como nunca. — Não quero ter que usar isso em você de novo, certo? Ainda vai sentir um pouco de dormência no corpo, mas os choques logo vão parar.

— Quem é você? - indaguei — E porquê estou aqui?

— Oh, o porquê. Bem, nós precisávamos de alguns de vocês e os outros para uma espécie de experimento secreto. Agora você é metade anjo, metade demônio.

Permaneci estática como uma das malditas estátuas de Medusa.

— E-eu n-não... TIRE ISSO DE MIM! - foi tudo o que consegui dizer antes de começar a chorar.

Espere. Eu estava chorando?

Demônios não sentem, demônios não choram.

— Isso não pode estar acontecendo. Não, não, não pode. Pelo menos você consegue ser útil e me ajudar a limpar a droga do meu rosto? - e tirou do bolso da calça jeans um lenço de papel e passou delicadamente pelo meu rosto molhado. Vez ou outra desviava o olhar, tentava não manter algum tipo de contato visual.

Amigo Oculto LiterárioOnde histórias criam vida. Descubra agora