Viagem Internacional

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De Taiane para Rebeca

Do lado de dentro do avião o barulho me deixava em dúvida se eu estava realmente viajando de férias, ou se aquilo era um treinamento de guerra. Tudo trepidava de maneira intensa e meu cérebro tentava não entrar em pânico, afinal não era a minha primeira viagem de avião, tampouco a minha primeira turbulência. Era apenas a minha primeira viagem internacional com meu marido. Tudo estava perfeito até ali. Roupas de frio, luvas, botas, Dicionário Português/Espanhol.... Toda uma preparação. Por isso minha mente não se conformava que eu simplesmente morreria ali, naquele avião caindo aos pedaços. Deus devia ter um propósito para mim naquela viagem.

Tentei focar nas coisas maravilhas que nos esperavam quando desembarcássemos na Argentina, mas eu só conseguia pensar que a qualquer momento o avião desmontaria e eu cairia de paraquedas no meio da neve. Não era bem assim que eu queria ver a neve pela primeira vez...

–Tem alguma coisa estranha nesse avião. – Meu marido constatou.

– Sério? Não me diga, Senhor-não-sente-nada. Está com medo do avião cair?

Ele olhou-me com divertimento.

– Não é isso, Beca.... – Levantou a sobrancelha e murmurou calmamente – Você reparou nas aeromoças?

– O que tem elas? – Procurei, mas haviam sumido para dentro da cabine – Estão com medo?

– Não... – ele riu –  São horrorosas.

Eu apertei os olhos.

– Cadu! Não estou acreditando que, de todos os problemas nesse avião, você está preocupado com a aparência das aeromo...

Parei a frase quando uma delas saiu por detrás da cortina. Estava tão eufórica com a viagem, com a expectativa de encontrar o novo, que não havia me dado conta quando entrei no avião. Ele realmente tinha razão. As diferenças daquelas aeromoças para as brasileiras, iam além da língua. Até tentavam seguir um padrão: saia secretária, camisa formal, coque. Mas em plena turbulência (ou era uma trepidação normal, não tinha como precisar), elas andavam de um lado para o outro, meio atrapalhadas. E era uma visão totalmente disforme. A começar pelo próprio coque torto que parecia ter sido feito à mão, seguido pela pintura no rosto, que talvez a Elke Maravilha tivesse sido a maquiadora, além da meia-calça furada e o sapato preto sujo. E, como última constatação, a aeromoça mais nova devia ter uns 50 anos. O que era aquilo afinal?

– Também estou me perguntando o que significa isso... – Cadu murmurou, como se estivesse lendo meus pensamentos.

– Soa preconceituoso se eu disser que elas são... velhas? – Perguntei fazendo uma careta de arrependimento.

Ele gargalhou.

– Combina bem com esse avião – respondeu entrelaçando nossas mãos, encostadas no braço da poltrona – A propósito, não coma nada... vai que a comida está mofada?

Eu gargalhei.

– Que grande enrascada nós entramos. Malditos pacotes de viagens baratos, despertando nosso pior lado crítico e preconceituoso.

Ele sorriu.

– Prefiro você preconceituosa do que achando que vai morrer, minha pequena chama. – E soltou uma piscadela, apertando minha mão.

Cadu amava usar meus livros como referência, só para eu me derreter ainda mais por ele.

– E eu prefiro você olhando para as aeromoças argentinas, do que as brasileiras... ­– disse, divertida. – É mais seguro.

– Só tenho olhos para você, minha escritora favorita. – ele apontou com a cabeça para as aeromoças – E para coisas engraçadas como essas... Será que elas topam tirar uma foto com você? A gente precisa registrar isso, se contar para nossos amigos vão achar que é mentira.

Amigo Oculto LiterárioOnde histórias criam vida. Descubra agora