De Ana Clara para Rosie
A maternidade é uma coisa linda. É o que todos me dizem quando conto que tenho cinco filhos.
Realmente, a maternidade é linda, vista de fora. Não me entenda mal, eu amo o que faço, eu amo meus filhos, mas ser mãe é cansativo. A maior parte das vezes eu não sei o que estou fazendo. Cria-los é como jogar na loteria, eu escolho os números e rezo para que estejam certos. A diferença é que o prêmio não é o dinheiro, é criar um filho descente para esse mundo.
É incontável o número de vezes em que eu achei que estava acertando na tomada de decisões, mas quando fui ver o resultado, apenas piorei a situação. Não existe um manual de como criar suas crianças, e nem mesmo deveria. Uma coisa que aprendi depois do terceiro filho, é que para cada um a criação é diferente, pois cada filho é um filho, e cada um vai interpretar meus conselhos e minhas ordens de um jeito distinto. E não adianta eu ficar frustrada e comparar um ao outro, só vou acabar machucando a todos, inclusive a mim mesma.
Existem pessoas – aquele tipo que ama dar palpite na vida dos outros – que me chamam de louca, ou corajosa. Amo essa palavra, corajosa, como que se para tudo na vida precisasse ter coragem. Não, precisa-se apenas de vontade e persistência. Mas enfim, julgam-me por ter cinco crianças. Muitos dizem – pelas costas, óbvio – que tenho tantos filhos porque ficava entediada. É rir para não chorar. Qual a necessidade de se intrometer e palpitar na vida dos outros? Eu tenho cinco filhos porque eu escolhi, porque eu amo o que faço, porque eu amo meus filhos, não é o suficiente?
Mas acho que a melhor parte são as pessoas que amam palpitar no meu modo de criar minha prole. "Deixa comer um docinho vai, só um brigadeiro." Quando digo que não darei doces antes dos dois anos, que é o indicado pelos médicos. "Não deixa ele fazer isso, é perigoso." Quando digo que meus filhos me ajudam na cozinha. Mas nunca abrem a boca para dizer que estou fazendo um bom trabalho como mãe. A única pessoa que me diz isso é minha esposa.
Minha esposa, ela que me incentivou a escrever essa carta. Eu não acredito em Papai Noel, ela não acredita, nem mesmo meus filhos, pois já deixei bem claro desde o início que você era uma invenção. Mas ela disse que me ajudaria a relaxar de todo esse estresse que é a véspera de natal. Acomodar toda a família dentro de casa, cozinhar o suficiente para todo mundo, manter a árvore no lugar, decorar o exterior da casa, comprar os presentes certos para todos da família. Só de pensar a veia na minha testa volta a pulsar.
Então você, Papai Noel, está sendo meu psicólogo ouvinte, tecnicamente, pois o que quero lhe pedir, você não pode me dar – parte porque você não existe – e acho que ninguém pode.
Eu só quero uma coisa, desde a primeira vez que olhei para o rosto de meu primeiro filho. Fazer um bom trabalho como mãe. Criar pessoas que no futuro irão mudar o mundo, mesmo que com pequenos gestos. É isso que eu quero de natal, Papai Noel.
***
Então quer dizer que não existo, minha filha? Ho Ho Ho! Vamos ver como está sendo o seu natal.
Gabriela, a mãe que escrevera a carta, continuava estressada, preparando os últimos detalhes da ceia. Enquanto Léia, a outra mãe, a tentava acalmar a todo custo.
– Você escreveu mesmo aquela carta? Parece tão estressada quanto antes. – Léia a olhava carinhosamente com seus olhos cor de esmeralda.
– Já falei que escrevi meu bem. Mas eu tinha te falado que não ia dar em nada. A única coisa que aquela carta fez foi gastar minha energia em algo inútil. – Gabriela mexia com veracidade a panela onde estava cozinhando a farofa. Seus cabelos dourados estavam presos num coque bem firme, coberto por um lenço.
Inútil, Gabriela? Assim você me deixa magoado. Sei que não acredita em mim, mas eu acredito em você.
A ceia estava na mesa, e todos haviam sentado em seus respectivos lugares. Todos os quitutes preparados pelas mães estavam com uma aparência apetitosa. Mas não posso falar do sabor, por isso, deixo a palavra com um de seus filhos.
– Mães, essa ceia tá maravilhosa. Qual o segredo? – A filha do meio, Michelle, disse com a boca cheia. Ok, talvez eu tenha colocado uma pitada de um segredinho meu nas receitas de Gabriela.
– O segredo é ser educada e não falar de boca cheia filha. – A mulher de cabelos dourados, que agora os havia soltado, dirigia um olhar duro para a cria.
– Não precisa ser tão dura hoje minha querida. – Interveio Léia, com sua voz doce e apaziguadora. – É natal, vamos aproveitar e afrouxar um pouco as rédeas.
– Tudo bem. Mas não se acostumem. – A mãe cedeu, voltando a saborear sua refeição.
A ceia na casa dos Pereira fora excepcional. Com meu segredinho, todos elogiaram a refeição, incluindo a mãe de Gabriela, que era exigente com o que comia, e nunca falava bem de nada, fora toda elogios para a comida que a filha fizera. Todos os filhos comeram até não aguentar mais, e ainda assim, sobrou comida.
Depois da refeição, se reuniram em volta da árvore de natal, que ainda estava inteira e em pé, e abriram seus presentes. Todos adoraram o que ganharam, mas o mais significativo foi o de Gabriela. Ela e sua esposa ganharam o mesmo presente, para não ser injusto, mas para a mulher de cabelos dourados foi muito mais significativo. Uma xícara, onde se encontrava escrito de canetinha "Para a melhor mãe do mundo." com letras de tamanhos e fontes diferentes, que indicava que fora escrito por todos os filhos. Gabriela chorou, e toda a família a abraçou, a aura de amor podia ser sentida de longe naquele momento, eu me senti amado enquanto observava a família em um de seus momentos mais sentimentais.
Na hora de dormir, que já havia passado um pouco por conta das festividades, Gabriela subiu antes de Léia para o quarto, pois a esposa a mandara ir descansar enquanto arrumava parte da bagunça, e não permitiu que Gabriela movesse um braço para ajudar.
Em seu quarto, a mulher de cabelos dourados viu um bilhete em cima da cama. Era uma folha rasgada de um caderno, onde se encontrava escrito tudo o que Gabriela precisava ler.
"Você está fazendo um ótimo trabalho."
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Amigo Oculto Literário
Short StorySorteio entre amigos do grupo do Whatsapp ajudando escritores, em que cada participante recebe em sigilo o nome de outro a quem deve presentear com uma one shot.