One shot de Thiago para Kiel
A noite gélida cedia espaço para o silêncio eterno que bem lembrava o de uma catacumba, mesmo sendo aquela floresta conhecida pelos levantes de bruxas reunidas com intuito de agradecer a deusa Lua pelas conquistas.
A floresta, tomada pela putridão e aura maligna já não era frequentada pelos homens a séculos, e os poucos que arriscavam na mesma, jamais voltavam para contar, ou perdiam uma essência do que um dia foram.
De décadas para cá, as florestas germânicas nada escondiam além do vazio inexorável.
Do silêncio ensurdecedor.
Do medo avassalador.
Brunilda, uma jovem bruxa corria pela floresta morta, enquanto as árvores murmuravam palavras de escárnio e desejos obsenos para com a garota criada em um vilarejo pouco distante de Bavaria.
O vestido negro, recoberto com sangue alheio era fétido e longe da pureza suficiente para invocar as mais complexas obras do livro das trevas, sendo que as próprias páginas repeliam seus toques.
As pernas, exaustas e sem sequer energia para seguir adiante, imploravam por descanso, e Brunilda não ignoraria tamanha dor.
"Preciso parar. Não aguento mais", pensou. Ao mesmo tempo, recolheu-se dentro de um tronco apodrecido grande o suficiente para uma jovem.
O corte no ombro esquerdo estava recoberto dos longos cabelos negros e sujos dela, e a dor era tamanha que valeu-se de uma centopéia que passava no local para cobrir sua ferida.
- Euq a etrom assop son rinu - e a centopéia passou a ser parte da pele rasgada que enfim estava curada, com um feitiço de agregação.
Seu estômago doia, e o vazio dele só não causou-lhe vômito porque sequer água ali havia.
- Pare! Quantas mais irá matar? - Brunilda ouvira as lamúrias de uma outra mulher qualquer, não muito longe dali.
Brunilda ficou tentada a se levantar, mas a caça as bruxas era exponencialmente arriscada para que ela ousasse dar as caras, ainda mais ferida por uma criatura do além, fruto de uma conjuração errônea.
- Trouxestes isso para nós, ainda que meu irmão não habites mais esse plano - ouvira uma outra voz, de uma menina da qual ela conhecia e temia.
Os passos, cada vez mais intensos, porém ritmados deixavam claro que não havia pressa, e Brunilda esgueirou-se para descobrir a situação.
Entretanto, não precisou promover um esforço maior, uma vez que as duas colocarem em seu campo de visão.
De um lado a jovem Maria, com seus quinze anos de idade e grande psrte deles dedicada a vingança contra todas formas de magia, do outro, Hlin, uma mulher de meia idade que bem podia ser a mãe de Maria.
Ambas encaravam-se e tinha consciência da morte iminente, como também nenhuma chance de fuga.
Hlin utilizou um feitiço terreno que percorreu as cada folha caída, como o vento fazia nas noites vindouras do inverno e atingiu as pernas de Maria, caindo de joelhos.
Não havia nobreza ou piedade alguma em sua ação, mas para detê-la, não havia restrições para os artifícios usados.
Maria parecia envolta numa corrente de dor e vergonha, agora com as pernas sangrando e ossos expostos, escondidos pelo longo vestido de um pano muito humilde outrora ganho por viajantes.
Hlin até pensou em deixa-la morrer ali, sozinha e talvez devorada por algum animal selvagem, mas seria piedade por demais e vingar suas irmãs bruxas era uma obrigação.
- sahlof meqofus asse atorag - e uma fileira de folhas circundou-a.
Maria, lançou sue braço esquerdo a frente e socou-a com poder suficiente para atordoa-la. Porém, seu braço possuia uma coloração esquerveada como uma folha vivida, e de proporções assustadoras: cada fibra muscular era evidente e as unhas mais pareciam espinhos grossos.
Maria debruçou-se para seu corpo adquirir outra forma, de Ogro, por conta dos feitiços lançados a muito tempo, quando era criança.
Sua pele tomou toda uma coloração escura e asquerosa para uma simples jovem, seguida pelos olhos vermelhos que afogavam-se no mar de sangue, seguidas das dores.
Cada músculo transformado causava-lhe um espasmo e caso houvesse uma ameaça, certamente derrubaria-lhe nesse instante, mas Brunilda e Hlin estavam incapazes de lutar.
Pasma, Brunilda viu o corpo de Maria agigantar-se num emaranhado de músculos que há tempos rasgaram-lhe as vestes e acresciam o terror mais puro.
Um terror que as bruxas constumeiramente proviam aos seres humanos, mas por conta das tolices de uma bruxa anciã, tornaram aquela presa, uma frágil menina, o receptáculo das trevas.
A transformação durou muito menos tempo do que a última vez e o demônio estava de pé: uma criatura de feições femininas formadas, com seios e genital expostas, grandes asas com pontas de ossos e cada uma das dobras das mesmas, cabelos flamejantes com formatos de víboras sempre atentas e as unhas resultantes de extensões dos ossos.
O demônio perfurou o estômago de Hlin como se brincasse com uma boneca de pano maltrapilha e largada, até transpassa-la perto da coluna servical, causando um grito de dor engolido pela bruxa que recusava-se a sofrer parada.
As palavras não vinham a boca de Hlin e ela viu-se forçada ao feitiço mais complexo aprendido até então: o ritual de sobreposição.
Seus olhos reviraram-se ao cair no emaranhado da magia negra e os músculos mantinham-se tensionados o suficiente para ser dada como morta, mas ela seguia ali.
Hlin viu a si mesma de um ângulo mais alto e soube do feitiço completo, mas faltava-lhe algo: controle.
Os pensamentos e controle daquele corpo não eram seus, mas sua alma estava dentro de Maria, e foi então que tudo fez sentido: Maria apenas brincava com sua alma, agora presa a ela.
Deliciosamente, Maria devorou o corpo de Hlin como um reles dejejum e vangloriou-se da alma entregue a si.
Brunilda não lamentou-se da perda de uma irmã. Na verdade, apenas si mesma era importante num momento como aquele.
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Amigo Oculto Literário
Short StorySorteio entre amigos do grupo do Whatsapp ajudando escritores, em que cada participante recebe em sigilo o nome de outro a quem deve presentear com uma one shot.