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Posso discutir com o Comando?
— Vou ver.
O Comissário voltou para junto do Comandante e do Chefe de Operações. Momentos
depois, fazia sinal a Teoria. O professor levantou-se e uma dor aguda subiu-lhe pelo joelho até
ao ventre. Sentiu que não poderia ir muito longe. A escuridão relativa escondia-lhe as feições e
ninguém se apercebeu da careta. Procurou andar normalmente e aproximou-se dos três
responsáveis.
O Comandante Sem Medo contemplou-o fixamente, enquanto o professor se sentava,
gritando calado para esconder as dores insuportáveis. Estou arrumado, pensou.
— É inútil armares em forte – disse Sem Medo. – Topa-se bem que estás à rasca,
embora tentes esconder. Não vejo qual é o mal de reconheceres que não podes continuar. Serás
um peso-morto para nós.
Teoria esboçou um gesto de irritação.
— Eu é que sei como me sinto. Afirmo que posso continuar. Já fui tratado e amanhã
melhoro. É evidente que nada está partido, é só um esfolamento sem gravidade. Mesmo o
perigo de infecção está afastado.
— Se amanhã encontramos o inimigo – disse o Comissário – e for necessário retirar
rapidamente, tu não poderás correr.
— Querem que corra aqui para provar que poderei?
— Sou contra a tua participação – repetiu o Comissário. – Não vale a pena insistir.
O Chefe de Operações contemplava as sombras das árvores, deitado na lona. Ouvia a
conversa dos outros, pensando na chuva que iria cair dentro de momentos e na casa quente de
Dolisie, com a mulher a seu lado.
— É evidente que a razão objetiva está do lado do Comissário – disse o Comandante.
— No entanto, eu compreendo o camarada Teoria... Por mim, se ele acha que pode
continuar, não me oponho. Mas objetivamente o Comissário tem razão...
— E subjetivamente? – perguntou o Comissário.
— Subjetivamente... sabes? Há vezes em que um homem precisa de sofrer, precisa de
saber que está a sofrer e precisa de ultrapassar o sofrimento. Para quê, porquê? Às vezes, por
nada. Outras vezes, por muita coisa que não sabe, não pode ou não quer explicar. Teoria sabe e
pode explicar. Mas não quer, e acho que nisso ele tem razão.
— O problema é que se trata duma operação de guerra e não dum passeio. Num
passeio, um tipo pode agir contra toda a razão, só porque lhe apetece ir pela esquerda em vez
de ir pela direita. Na guerra não tem esse direito, arrisca a vida dos outros...
— Neste caso? Não, aqui só arrisca a sua, e mesmo isso... Sei que se for necessário bater
o xangui, Teoria parecerá um campeão. Não tem a perna partida, também não exageremos. O
enfermeiro diz que a coisa não é grave, só dolorosa. Passará depressa.

mayombe (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora