em Angola, já não haverá necessidade de aparelhos rígidos, é esse o meu objetivo. Mas não
chegarei até lá.
— E entretanto o que fazes?
— Faço a guerra. Permito, pela minha ação militar, que o aparelho se vá instalando.
— E quando o aparelho se instalar, o que farás?
— Não sei. Nunca soube responder a essa pergunta. O que sei, o que queria que
compreendesses, é que esta revolução que fazemos é metade da revolução que desejo. Mas é o
possível, conheço os meus limites e os limites do país. O meu papel é o de contribuir a essa
meia revolução. Por isso vou até ao fim, sabendo que, em relação ao ideal que me fixei, a minha
ação é metade inútil, ou melhor, só em metade é útil.
— No fundo, é a minha posição – disse Mundo Novo. – Eu sei que o comunismo não
será conquistado já, comigo em vida, que o mais que conseguiremos é chegar ao socialismo.
São precisos muitos anos para vencer as relações de produção capitalistas e a mentalidade que
elas deixam. É a mesma posição!
— Não, não é. Tu estás na luta pela independência, preparando ao mesmo tempo o
socialismo. O teu móbil é político. Para ti, tudo se passa em função do objetivo político a
atingir.
— E tu?
— Eu? Eu sou, na tua terminologia, um aventureiro. Eu quereria que na guerra a
disciplina fosse estabelecida em função do homem e não do objetivo político. Os meus
guerrilheiros não são um grupo de homens manejados para destruir o inimigo, mas um
conjunto de seres diferentes, individuais, cada um com as suas razões subjetivas de lutar e que,
aliás, se comportam como tal.
— Não te percebo.
— Não me podes perceber. Nem te sei explicar, é tudo ainda tão confuso. Por exemplo,
eu fico contente quando um jovem decide construir-se uma personalidade, mesmo que isso
politicamente signifique um individualismo. Mas é um homem novo que está a nascer, contra
tudo e contra todos, um homem livre de baixezas e preconceitos, e eu fico satisfeito. Mesmo
que para isso ele infrinja a disciplina e a moral geralmente aceite. É um exemplo, enfim... Sei
apenas, que a tua posição é a mais justa, pois a mais conforme ao momento atual. Tu serves-te
dos homens, neste momento é necessário. Eu não posso manipular os homens, respeito-os
demasiado como indivíduos. Por isso, não posso pertencer a um aparelho. A culpa é minha.
Culpa! A culpa não é de ninguém.
— Estás desmoralizado, Sem Medo.
— Não – disse ele, olhando Ondina. – Estou angustiado, porque luto entre a razão e o
sentimento.
Ela ouviu e baixou os olhos. Mundo Novo estava demasiado ocupado em analisar o que
dissera Sem Medo.
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mayombe (Completo)
RomanceA história do livro tem como cenário Angola nos anos 70, período que marca as lutas pela independência do país. No primeiro capítulo intitulado "A Missão", os guerrilheiros no Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) chegam à selva de Mayomb...