pag36

76 2 0
                                    

— É preciso saber retardar o prazer... Depois sabe melhor.
Os guerrilheiros abraçaram-se, como quando enfrentavam um perigo qualquer. Depois,
o Comissário, Lutamos e Mundo Novo partiram, cautelosamente, para junto do caminho.
Demoraram uma hora a chegar lá, com a preocupação de escutarem os ruídos e evitarem partir
os paus secos. Anoitecia, quando se sentaram a dez metros do caminho, invisível pelas
ramagens e pelo crepúsculo. Abraçaram-se às lianas, cobriram-se com as folhas que dos seus
braços nasciam, e prepararam-se para ali passar a noite.
Foram acordados pelas primeiras vozes que se libertavam do espaço limitado da sanzala,
para se irem combinar ao orvalho que avivava o verde das folhas. Sacudiram o torpor dos
membros e do corpo doído pelas raízes, sobre as quais se deitaram. Avançaram na noite para o
caminho. Emboscaram-se ao lado dele. Cada cão que ladrava trazia-lhos a impressão de ladrões
esperando a vítima. No entanto, eles esperavam um homem para lhe entregar o seu dinheiro.
Estranha situação que leva o que dá a esconder-se, pensou Mundo Novo. Só o colonialismo
poderia provocar tal aberração.
As vozes aproximaram-se. Dois homens conversavam, caminhando. Impossível ver-lhes
a cara, na escuridão. Não poderiam pará-los, para lhes perguntar quem eram. Os homens
chegaram à frente deles e Lutamos compreendeu que falavam do combate. O Comissário
segurou no braço de cada companheiro, indicando-lhes que nada fizessem. Os homens
passaram. Lutamos segredou aos outros que nenhum dos homens era o mecânico.
— Como sabes?
— Pela voz.
Quinze minutos depois, um vulto desenhou-se na obscuridade quase total. Era uma
mulher que ia para a lavra. Deixaram-na passar.
Já clareava, quando distinguiram a uns dez metros o rosto inteligente do mecânico.
Vinha com outro trabalhador, o velho que tinha uma perna defeituosa. Ao passarem junto
deles, o Comissário chamou baixinho:
— Malonda!
O interpelado virou-se para eles, atónito e assustado. Lutamos surgiu então da ramagem
com que se camuflava.
— Somos nós. Venham aqui só um minuto.
Os trabalhadores reconheceram Lutamos. Hesitaram, olharam para trás, em direção da
aldeia, depois interrogaram-se, mudos. Lutamos repetiu o convite e os homens decidiram-se a
entrar na mata.
Os guerrilheiros afastaram-se com eles alguns passos do caminho.
— Trouxemos-lhe o seu dinheiro – disse o Comissário. – Um dos nossos camaradas
tinha-o roubado. Vai ser julgado e castigado. Está aqui o dinheiro.
— Vieram só por isso? – perguntou o coxo. – Mas era perigoso...

mayombe (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora