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O Comissário mediu as palavras, antes de falar.
— Penso que deveríamos aproveitar esta ocasião. Podíamos apanhar os trabalhadores,
recuperar a serra, que é leve de transportar, destruir o buldozer e o camião. Era uma ação que
fazia efeito e era esse o nosso objetivo. Porquê mudar?
O Chefe de Operações interrompeu:
— Nós somos militares. Nós devemos combater o inimigo. Por isso penso que a
primeira ação nesta área devia ser militar. Os soldados devem andar à vontade na estrada. Esta
picada vai de certeza dar à estrada. Uma emboscada era muito melhor. Os trabalhadores? Não
vejo qual o interesse. Se ainda fosse para os fuzilar... Mas não. Para os politizar! Vocês
acreditam que vamos politizar alguma coisa? Aqui só a guerra é que politiza.
O Comandante disse:
— Comissário, sei que uma operação política e económica tem interesse. O problema é
o seguinte: se destruímos estes aparelhos, a ação militar está estragada, pois os tugas ficarão
prevenidos de que andamos por aqui...
— Claro – cortou o Comissário. – Mas isso será mais uma razão para que eles andem na
estrada. São forçados a aumentar as patrulhas, pois aqui há população e eles querem cortar-nos
dela. Eles andarão ainda mais e teremos pois mais oportunidade de lhes dar porrada. Qual é o
problema? Não mataremos vinte na primeira emboscada, pois estarão mais atentos? Bem,
mataremos dez. A guerra popular não se mede em número de inimigos mortos. Ela mede-se
pelo apoio popular que se tem.
— Esse apoio só se consegue com as armas – disse o Das Operações.
— Não só. Com as duas coisas. Com as armas e com a politização. Temos de mostrar
primeiro que não somos bandidos, que não matamos o povo. O povo daqui não nos conhece,
só ouve a propaganda inimiga, tem medo de nós. Se apanharmos os trabalhadores, os tratarmos
bem, discutirmos com eles e, mais tarde, dermos uma boa porrada no tuga, então sim, o povo
começa a acreditar e a aceitar. Mas é um trabalho longo. De qualquer modo, esta ação pode não
impedir que se faça também uma emboscada.
— Questão de tempo e de comida – disse Sem Medo.
— Os camaradas aceitarão passar um pouco de fome, se lhes explicarmos o interesse da
coisa.
— Bem – disse o Comandante –, vamos fazer como tu queres. Vamos rodear os grupos,
aprisioná-los, destruir o que se puder, apanhar a serra, etc. Depois recuamos com os
trabalhadores e estudaremos a possibilidade de se voltar à estrada para fazer a emboscada. Eu
vou com dois camaradas pôr-me na picada, para lá do camião. Se ele fugir, nós varremo-lo. Se
aparecer tropa, vinda da estrada, nós travamo-la. Vocês vão cada um do lado que
reconheceram. Evitem fazer barulho. Cerquem-nos e, às dez em ponto, prendam-nos. Acertem
os relógios. O lugar de encontro é aqui, se não houver novidade. Se o tuga aparecer,
encontramo-nos onde dormimos ontem.

mayombe (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora