pág 91

47 4 0
                                    


do Comissário, isso era injusto. Vamos lá nós saber o que é justo ou injusto, quando há
mulheres no meio!
Não foi por causa duma mulher que Caim matou Abel? Se não o diz, a Bíblia escondeu
pudicamente a verdade.
Ao voltar à casa do Comando, Sem Medo encontrou o Comissário preparando o
sacador. Este mirou-o. Sem Medo notou o olhar vazio e teve medo. Inútil tentar esconder ou ir
com meias palavras, era o momento de agir.
— Onde vais? A Dolisie?
O Comissário não respondeu. Embrulhou o cobertor, meteu-o no sacador e apertou as
correias. O Comandante pôs-lhe a mão no ombro.
— Não queres ir bater um papo?
O outro não respondeu. Meteu o sacador às costas, pegou na arma e no cantil.
— Comissário, responde, onde vais?
O Comissário virou-se para ele, mexeu os lábios e, repentinamente, deu-lhe as costas e
saiu. Sem Medo pegou na AKA e foi atrás dele.
O Comissário caminhava rapidamente. Ultrapassou a sentinela, atravessou o rio, tomou
o atalho para Dolisie. O Comandante seguia-o a dez metros de distância. Marcharam quinze
minutos, atravessando os rios a vau. O Comissário parecia não se aperceber da presença de
Sem Medo. Vai cego e surdo, pensou este. É um perigo caminhar assim no mato.
No entanto, o Comissário parou e virou-se para trás.
— Que queres, Sem Medo?
— Vou contigo.
— Porquê?
— Não me disseste onde ias. Eu sou o Comandante, tenho o direito e o dever de seguir
quem arranca da base ilegalmente. Ou mesmo prender, se julgar necessário.
— Eu não vou fugir.
— Quem mo garante?
— Não sou um desertor.
— Estás em estado de deserção, pois não avisaste onde ias.
— Sabes muito bem onde vou.
— Não sei, porque não fui avisado. Pensa que é burocracia, mas é o meu dever.
— De qualquer modo – disse o Comissário – estou-me marimbando. Considerem-me
desertor, se quiserem. Se pensas que tenho muito respeito pela vossa organização...
— Não podes condenar a organização pela atitude reprovável dum responsável.
— São todos a mesma coisa. Aproveitam sempre do fato de serem responsáveis para...
— Tu também és responsável, Comissário!

mayombe (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora