pág 51

71 4 0
                                    


O Comissário partiu para a escola do Movimento, em que Ondina ensinava, a um
quilómetro da saída da cidade. Os camaradas da Base devem estar praticamente sem comida,
pensou. Uma raiva surda invadia-o gradualmente.
O passeio ao Sol ardente ainda enfureceu mais. Não estava habituado ao Sol, sempre
escondido na sombra protetora do Mayombe. Ingratidão tinha ido para a cadeia, mas precisava
de informar André da decisão do Comando e combinar com ele qual o regime que Ingratidão
deveria seguir. E André escondia-se...
A escola encontrava-se numa elevação, escondida por arvoredo. As várias casas de
adobe espalhavam-se num raio de 50 metros, servindo de escola e hospital. Mais para cima,
havia casas de pau a pique, que eram o internato.
As crianças estavam nas aulas. Ondina também. Esperou por ela, cumprimentando as
pessoas, perguntando por André. No entanto, Ondina foi avisada que ele chegara e saiu da sala.
— Chegaste ontem, já sei.
— Sim. Mas tenho andado atrás do camarada André. Ele não aparece.
Ondina estava amuada, era evidente. Ele tentou segurar-lhe a mão, ela evitou, olhando
em volta.
— Que tem? – disse ele. – Todos sabem que somos noivos...
— É melhor não. Espera um pouco, eu vou já acabar a aula. Vens almoçar comigo?
O Comissário hesitou, desviou os olhos.
— Tenho de ver se apanho o camarada André à hora do almoço.
— Quer dizer que vais já para Dolisie? – perguntou ela, friamente.
Os camaradas tinham fome, ele viera por isso e por Ingratidão. Não viera por Ondina.
A custo respondeu:
— Tenho de seguir daqui a pouco. Não temos comida na Base...
Ondina não replicou. Virou-lhe as costas e partiu para a sala. O Comissário ficou vendo-
a, o chapéu guerrilheiro a passar duma mão para a outra, o nome dela atravessado na garganta.
Foi visitar os camaradas feridos, passando tempo, passando a esponja sobre a atitude dela. Ele é
que se sentia culpado.
O sino finalmente tocou e Ondina saiu, rodeada pela gritaria dos pioneiros libertos. O
Comissário dirigiu-se com ela para o quarto. Ondina habitava um quarto da única casa de
cimento, quarto que partilhava com uma aluna mais crescida, Ivone.
— Porque não vais a Dolisie? – perguntou ela bruscamente, quando chegaram ao
quarto.
— Ainda é cedo. O André só lá deve estar à uma hora.
Esperou que ela o convidasse e depois sentou-se na cama. Ondina ficou de pé, fingindo
arrumar as coisas, dominando a irritação.

mayombe (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora