Era o nosso dever. O MPLA defende o povo, não rouba o povo – disse Mundo
Novo.
— Era melhor não virem – disse o mecânico –, não tinha importância.
— Tinha, sim – disse o Comissário. – Vocês podiam acreditar que nós somos bandidos,
como dizem os portugueses, e isso não é verdade.
— Mas podem ficar com o dinheiro – disse o mecânico. – Verdade! Ofereço ao MPLA.
Verdade mesmo, fiquem com ele.
O mecânico olhava nervosamente para trás, para o caminho. Murmuravam apenas, mas
um murmúrio pode ir longe, naquela mata. O Comissário agradeceu e guardou o dinheiro.
— Ouviram do combate?
— Sim – disse o coxo, com um sorriso. – Morreram muitos. Morreu um rapaz ali da
aldeia ao lado. Houve óbito ontem.
— Nós sempre dizemos para os angolanos desertarem do exército. As balas não
escolhem – disse o Comissário. – Foi o único angolano que morreu?
— Não. Houve outro. Mas esse era do Sul. Brancos é que morreram muitos. Um era
capitão.
— Como se chamava?
— Capitão Lima. Eles deram ordem para se procurar rastos em todo o lado, mas o povo
não está a fazer...
— E a vocês, fizeram alguma coisa?
— Interrogatório – disse o mecânico. – Muitas perguntas. Quantos guerrilheiros eram,
como era o chefe, onde foram, o que falavam, o que comiam, como eram as armas...
Mostraram fotografias, para ver se vocês eram aqueles das fotos. Nenhum era! Ficaram
zangados, foi com as minas. Que nós sabíamos das minas e que não dissemos nada. Mas nós
não sabíamos. Eles estão bravos... Puseram um da Pide aí na aldeia.
— Vocês sabem quem é?
— Sabemos, sim. Então porquê que veio só agora? É mesmo da Pide. Por isso que é
perigoso aqui...
— Sim, nós já vamos – disse Lutamos.
Surgiram vozes no caminho. Esperaram que os passos se afastassem, depois
despediram-se dos trabalhadores. Estes aproximaram-se cautelosamente do caminho, espiaram
dos dois lados e, não vendo ninguém, meteram-se nele. Os guerrilheiros tinham-nos seguido,
para verem se, de fato, iam sair da aldeia ou se a ela voltavam. Esperaram ainda uns minutos, os
nervos tensos, para se certificarem que os trabalhadores não os iam trair. Tranquilizados,
embrenharam-se na mata.
Quando chegaram ao local do encontro, os camaradas já estavam levantados.
— Então? – perguntou Sem Medo.
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mayombe (Completo)
RomanceA história do livro tem como cenário Angola nos anos 70, período que marca as lutas pela independência do país. No primeiro capítulo intitulado "A Missão", os guerrilheiros no Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) chegam à selva de Mayomb...