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O jantar terminou e foram para os quartos respectivos. Pouco depois de se deitar, Sem
Medo ouviu o velho Kandimba chamá-lo de fora. Foi ver, vestido apenas com as calças. O
velho disse:
— Está aí um camarada que quer falar com o responsável. Como o outro ainda é novo,
vim chamar o camarada Comandante.
— Bem. Quem é?
— Está aí fora.
Sem Medo, resmungando interiormente, foi até à varanda. Olhou para o recém-chegado
e, embora a cara não lhe fosse estranha, era incapaz de saber onde o vira antes. O homem
avançou para ele, sorrindo.
— Que sorte! É mesmo o senhor Comandante que encontro. Conhece-me, não?
— Não vejo...
— Daquela vez que apanharam os trabalhadores que cortavam as árvores...
— Já sei – gritou Sem Medo. – És o mecânico. Que fazes aqui?
— Vim ter com vocês. Quero trabalhar no Movimento. Saí do kimbo ontem de manhã,
cheguei ao Congo sem problemas. Venho apresentar-me.
O Comandante ficou um segundo hesitante, depois, num ímpeto, abraçou-o.
— És bem-vindo, camarada. Como te decidiste?
— Bem, aquela conversa que os camaradas tiveram connosco começou a convencer-me.
Realmente nós somos explorados e devemos lutar. Mas o que me convenceu mesmo foi
quando os camaradas se arriscaram tanto para me devolver o dinheiro. Aí, sim, eu compreendi
tudo. Os camaradas eram mesmo para defender o povo. Comecei a ouvir a rádio, «Angola
Combatente». Aí aprendi umas coisas. Depois falei com os meus amigos, começamos a discutir
da situação e do MPLA. Achámos que podíamos trabalhar para o Movimento mesmo lá, sem
ninguém saber. Mas os camaradas não apareciam mais lá. Então eu vim fazer contato.
— Queres voltar para o kimbo?
— Posso ir lá, se os camaradas acharem bem, para fazer contato com os outros. Mas eu
queria mesmo era ser guerrilheiro. Mas nem sei mexer numa arma...
— Isso aprende-se.
— Há lá mais que querem vir, outros querem ficar lá e ajudar os camaradas.
— Isso também é muito importante. Camaradas que fiquem nos kimbos, para nos
darem informações e para ajudarem em tudo o que for preciso.
— O exército e a Pide fizeram muitas prisões, disseram que o povo tinha ajudado os
camaradas. Ficaram bravos porque houve muitos soldados mortos. Aí o povo ficou mais
revoltado. O povo está a compreender quem é afinal bandido!
— Depois falamos. O camarada já comeu?
— Não, nada.

mayombe (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora