— O Lutamos com quem vai? – perguntou o Das Operações.
— Comigo – disse Sem Medo.
O grupo do Chefe de Operações afastou-se imediatamente. Os outros dois grupos
foram juntos até próximo dos trabalhadores. O Comandante, Lutamos e Teoria avançaram
então ao longo da picada, para fecharem o cerco. A serra zumbia e cobria os ruídos das folhas
pisadas. Mesmo os pássaros estavam desorientados e não fugiam.
O Comissário avançou prudentemente, seguido dos seus homens. As folhas secas
estalavam sob as botas, mas os estalidos eram abafados pelo ruído da serra devastando o
Mayombe. Os guerrilheiros encavalitaram-se num enorme tronco caído. Deixara de respirar,
monstro decepado, e os ramos cortados juncavam o solo. Depois de a serra lhe cortar o fluxo vital, os machados
tinham vindo separar as pernas, os braços, os pêlos; ali estava, lívido na sua pele branca, o gigante que antes
travava o vento e enviava desafios às nuvens. Imóvel mas digno. Na sua agonia, arrastara os rebentos, os
arbustos, as lianas, e o seu ronco de morte fizera tremer o Mayombe, fizera calar os gorilas e os leopardos.
Os guerrilheiros dispersaram para avançar. A serra mecânica – abelha furando um morro
de salalé – continuava a sua tarefa. Havia o mecânico, que acionava a serra, e o ajudante, com a
lata de gasolina e de óleo; mais atrás, quatro operários com machados. Todos tão embebidos na
tarefa que não repararam nas sombras furtivas. Nem protestaram, quando viram os canos das
pépéchás virados para eles. Os olhos abriram-se, o imenso branco dos olhos comendo a cara
toda, a boca aberta num grito que não ousou sair e ficou vibrando interiormente. O Comissário
e Ekuikui avançaram para a serra. Ekuikui encostou o cano da arma às costas do mecânico:
— Não mexe!
O mecânico olhou por cima do ombro e compreendeu rapidamente a situação. Fez
parar a serra. O silêncio que se seguiu furou os ouvidos dos guerrilheiros, subiu às copas das
árvores e ficou pairando, misturado à neblina que encobria o Mayombe.
— Todos para aqui, vamos! – ordenou o Comissário.
Juntaram os prisioneiros, revistaram-nos para procurar armas: retiraram dois canivetes.
— Há outros? – perguntou o Comissário.
— Ali – murmurou o mecânico, apontando o sítio para onde se dirigira o Chefe de
Operações.
— Soldados?
— Só no quartel. A dez quilómetros.
— O branco?
— Está no camião.
— Vamos. E não tentem fugir, ninguém vos fará mal.
O cortejo partiu em direção ao ponto de encontro. Muatiânvua vigiava o mecânico, que
carregava a serra. Os outros trabalhadores tremiam.
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mayombe (Completo)
RomanceA história do livro tem como cenário Angola nos anos 70, período que marca as lutas pela independência do país. No primeiro capítulo intitulado "A Missão", os guerrilheiros no Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) chegam à selva de Mayomb...