102°- Esquecimento

82 12 0
                                    

Quando terminamos de escolher as roupas que iríamos usar, nos aproximamos do balcão junto com a moça, a qual logo começou a dizer os preços e somar os mesmos.

Levei um susto interno com os mesmos e olhei para Katsuki, o qual estava com uma expressão tranquila no rosto enquanto tirava o cartão da sua carteira e colocava em cima do balcão.

Espera aí…

Peguei o meu cartão e também coloquei ali em cima, em seguida fingindo não ver a expressão dele de desentendimento para mim. 

– Amor, pode deixar que eu-

– Não, a gente divide a conta.- Sorri sem graça para ele. 

– Lembra do que eu disse no carro? É para você relaxar.

– Estou relaxando, mas pode deixar que eu te ajudo na conta.- Voltei a minha atenção para a mulher.- Pode dividir.

Escutei Katsuki bufar, mas nem liguei. Ele está ficando pirado, porque o cartão dele foi usado esse mês para pagarmos as contas e as compras. 

O meu ainda está bastante cheio, então daria para cobrir uma boa parte dessa compra e, o que sobrasse, eu pagaria em papel - algo que tenho a mais. 

Depois que saímos da loja com as roupas, guardamos as mesmas no banco de trás do carro e depois entramos no automóvel; isso tudo em silêncio e sem olharmos na cara um do outro.

Mas tudo isso não durou por muito tempo.

– Por que não deixou eu pagar tudo?- Ele perguntou.

– Porque eu sei que você não tem muito dinheiro no cartão.

– Foda-se! Se faltasse eu pegava o dinheiro da empresa e pagava!

– Tá ficando maluco, Katsuki?! O dinheiro da empresa é usado para você pagar o salário do pessoal que trabalha para você e pagar a puta conta que surge todo o mês lá!- Falei mais alto que ele. 

– E daí?! Eu estou me preocupando com você! Não quero deixar tudo nas suas costas!- Estacionou brutalmente em um lugar estranho.

– Não tem nada nas minhas costas, porra! A única coisa que tem é a construção da floricultura, mas eu estou conseguindo resolver sem enrolação!

– Não, você não está! Porque mesmo que você não veja, todo o dia está desgastada! Eu odeio te ver assim!- Bateu no volante.- Você até esqueceu que hoje a gente está completando mais um ano juntos!

Arregalei os olhos. 

– É por isso que eu estava querendo pagar aquilo para você! Por isso que eu também estava desgastado como você! Isso mesmo todo mundo da empresa me ajudando a lucrar muito mais!

Vi ele passar as mãos nos próprios cabelos e segurar os mesmos.

– Eu tinha restaurado todo o dinheiro do meu cartão com a sobra de dinheiro do MEU trabalho, {Nome}! Tudo para te satisfazer e te ver feliz hoje! 

Cruzei os meus braços, apertando tanto eles que as minhas unhas chegaram a cravar fortemente nos mesmos; enquanto isso, uma pequena lágrima escorria pela minha bochecha.

– E ainda assim você fez questão de, além de esquecer do NOSSO DIA, gastar o dinheiro que EU coloquei no SEU cartão para você conseguir pagar as tintas e as outras coisas da floricultura!- Deu um soco mais forte no volante. 

Eu não sabia o que dizer. 

– Tenho certeza de que você pensou que o dinheiro surgiu magicamente, né?!- Terminou tirando o sinto, saindo do carro e em seguida batendo a porta do mesmo.

Comecei a chorar, me perguntando como consegui chegar nesse nível, como consegui esquecer um dos dias mais felizes da minha vida, como consegui estragar tudo; ou, por que eu simplesmente não deixei ele pagar? 

Me inclinei um pouco sobre o banco do motorista, podendo ver ele pelo retrovisor do carro, com os braços cruzados e apoiado num poste.

Respirei fundo, limpei as lágrimas do meu rosto, tirei o cinto de segurança e saí do carro - fazendo isso tudo sem ter uma palavra sequer para falar para ele.

Mesmo assim, parei na sua frente, sentindo uma dor forte no peito por ele não direcionar seu olhar para mim, mas mesmo assim o abraçando segundos depois. 

O homem não retribuiu o abraço, nem sequer fez um movimento. Contudo, eu conseguia sentir o seu coração palpitando fortemente e sua respiração ficando desorientada, igual de quando começa a chorar. 

– Me desculpa.- Murmurei.- Sei que dizer isso não vai mudar nada do que aconteceu, mas ainda assim eu sinto necessidade de me desculpar.

Ele se manteve em silêncio e parado, e eu me mantive ali.

– Eu te amo, Katsuki.- O abracei com mais força.- Me desculpa, eu sei que falhei feio. 

Soltei ele para lhe olhar e limpei uma lágrima que escorria na sua bochecha naquele instante. Agora, seus olhos estavam totalmente vidrados em mim.

– Eu preciso voltar para a empresa.- Afirmou e voltou para o carro.

Fiquei parada ali por um tempo, pois fazia um tempo desde a última vez que ele me tratou assim, no caso, de uma forma seca que não retribuí sentimento nenhum além de frieza.

Mesmo assim, voltei para o carro, coloquei o cinto e deixei que ele me levasse de volta para a floricultura, mas que do nada parasse mais uma vez para podermos conversar. 

Entretanto, eu só pisquei e já estava fora do carro, olhando para o pessoal trabalhando com todo esforço possível ali em dentro. 

Ver isso fez eu concluir que, da mesma forma como ele iria voltar a trabalhar para tentar esquecer um pouco do que aconteceu, eu iria fazer justamente o mesmo.

Fui para dentro da floricultura e conversei com eles como se nada tivesse acontecido, ajudando a fazer a única coisa sem perigo: pintar as paredes. 

Estava me sentindo em uma terapia, pois a cada pincelada, era como se tirasse cada palavra da minha discussão da minha mente até não sobrar mais nada.

Contudo, tinha noção que, no período em que eu entrasse no carro e voltasse para casa, tudo iria voltar à tona e a sensação de quando ainda estávamos discutindo voltaria. 

Bom, pelo menos Kota não estaria lá naquele caos, seria doloroso ver o seu rosto assustado no meio de tudo aquilo. 

– {Nome}? Quer almoçar com a gente?- Kelly chegou em mim repentinamente.

– Claro.- Assenti. 

Então, lá fui eu junto com eles para o restaurante onde almoçaram todos os dias, conseguindo soltar algumas risadas por conta das piadas e comentários feitos pelos homens. 

Até que consegui esconder bem a minha vontade de voltar para casa e dormir na tentativa de acordar hoje de manhã cedo, tendo noção de que dia é e deixando as coisas rolarem da forma certa.

Enfim, chegamos no restaurante, entramos no mesmo e nos acomodamos em uma mesa, não demorando muito para fazermos nossos pedidos e voltarmos a conversar.

𝔒 𝔇𝔢𝔰𝔱𝔦𝔫𝔬 𝔫𝔬𝔰 𝔰𝔲𝔯𝔭𝔯𝔢𝔢𝔫𝔡𝔢 Onde histórias criam vida. Descubra agora