Trevor ainda não se acostumara com a nova realidade que o cercava. Enquanto estava com Seh, eles nunca faziam nada muito fora do ordinário: descobrir informações, sentir, escutar. Talvez Von tenha feito fogo uma vez ou outra, mas não era comum. Sendo assim, ele demorou para entender o que havia acontecido.
Von desaparecera, junto com Alesia, como disse que faria. Até aí ok. Mas, em seu lugar, apareceu um velho. Quase no mesmo instante, perto o suficiente para fazer o cérebro de Trevor travar. Antes que qualquer um pudesse reagir, Cennen pôs-se à frente do grupo.
— Erm.
O modo como Cennen pronunciou o nome deu peso às letras.
— Cennen. — Erm quase sorriu; talvez aquele crispar leve dos lábios fosse o melhor que ele conseguisse. — É claro que você está envolvido. Você joga este jogo bem.
— Não há jogo — disse Cennen. Mal deu tempo para as palavras serem digeridas e continuou, intenso, severo. — Presumo que, a essa altura, você veio aqui confabular.
— Sim — A voz de Erm era baixa, monotônica, e presente em todos os cantos. Trevor recuou alguns passos, indo para mais perto de Jo, e percebeu que o volume das palavras não mudou. — Onde está aquele que fez o livro falso?
— Ele saiu. Retornará, te garanto. Erm, precisamos conversar. Este episódio recente, este e os passados, foram estúpidos e desnecessários.
— Vocês ainda estão chateados por causa da garota.
No momento que Erm disse "chateados", Jo fechou os punhos. Ela inclinou o corpo para a frente, pronta para dar um passo, mas Gaen foi mais rápido, mão apaziguadora pousando no ombro dela. Gaen não demonstrou nenhuma emoção, como de costume, mas Trevor sabia ver além do que ele tinha por fora. Explodia por dentro.
— Sim. Foi desnecessário e estúpido — disse Cennen, alisando o bigode. — Como está sendo agora. Você perdeu vários dos seus.
— Sim. Mas é o mesmo com vocês, não? Onde estão seus companheiros? Siman, Raffes, Merriam...
— Vocês argumentam que seus modos de ação são os mais simples e eficientes. — Cennen foi rápido em interromper. — Que, assim, vocês evitam dores de cabeça. Bem. O que está ocorrendo é uma grande dor de cabeça, não? Como foi antes, e, se nada mudar, como será novamente.
Cennen tinha jeito para oratória. A voz era alta e imponente o suficiente para fazer Trevor procurar por algum efeito, algo que a deixava tão grave e poderosa. Erm ouvia com atenção e uma expressão neutra; podia estar ardendo em raiva ou rindo dele. Como que para deixar o colega descansar, Gaen tomou o discurso:
— A nossa existência na capital vai de encontro aos métodos de vocês. Vocês aceitaram nossa cisão, mas não agem totalmente de acordo. Temos um número considerável de membros, a capacidade de guiar novas crianças, e...
— A situação se tornou ridícula — interrompeu Cennen. — Nós temos olhos suficientes para todo o país. Nós viemos aqui antes de vocês. Não concordamos com seus métodos, mas dividimos um número de preocupações, já que eu e Siman já pertencemos à sua organização. Então, aproveito o encontro para lançar um ultimato. — Cennen fez o corpo escorrer de uma perna à outra, procurando a posição mais confortável. Tirou as gordas mãos dos bolsos. Os olhos eram vivos, ágeis, pequenas órbitas escuras de pensamento e coragem. Os lábios eram uma linha. — Deixe este país conosco. Para sempre. Tirem seus olhos daqui, como tiraram dos outros quadrantes, e saiam.
— Ou tentem nos destruir. — Gaen desabotoou o único botão do terno. — São as duas únicas opções.
Trevor prendeu a respiração. Aquela gente era doida? Que tipo de blefe era aquele?! Erm era poderoso! Merda, Trevor, onde você se meteu? Que jeito idiota de morrer! Seh podia ter me ensinado a teleportar, que nem o Von fez! Os Mantos da Capital, Cennen, Gaen, Jo e talvez até Klen, pareciam calmos. Determinados. Aquelas palavras falavam por todos eles. Era até admirável.
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Princípios do Nada
Tajemnica / ThrillerE se a vida pudesse ser tão interessante quanto você achava que seria quando criança? E se todas as histórias que você imaginava, as aventuras, os poderes, a grandeza que você esperava para si... E se tudo isso fosse de novo verdade, tão real que ch...