Capítulo 3: Os Picos (XIX)

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— Alesia.

Alie saltou na cama e segurou um grito.

— Desculpa te assustar.

Art estava parado no meio de seu quarto, parcialmente iluminado pela janela.

— Art? — Ela se encolheu, escondendo-se com as cobertas. — Seu inconsequente, o que você tá fazendo aqui?

— Eu preciso da sua ajuda — disse Art num tom casual, como se sua invasão não fosse nada de mais. — É bem sério. Eu não viria se não fosse.

Alesia ficou séria. Picos... Despertava do sonho mais vívido que já tivera na vida.

— Aconteceu alguma coisa com o Von? — ela disse, lembrando-se do amigo desaparecendo na lanchonete.

— O Von deve estar ótimo — disse Art, sem ironias na voz. — É outra coisa. Descobri onde o Henderson mora, e vou entrar hoje. Preciso que você venha comigo. Quero descobrir onde ele e o Seh foram.

— Ah. — Mencionar Seh já era suficiente para convencê-la. — Ok.

Alesia saiu das cobertas e se sentou, acendendo o abajur do criado-mudo. Art arregalou os olhos, pela primeira vez demonstrando alguma emoção, e ela demorou um instante para entender. Como de costume, ela dormia só de regata e calcinha.

— Eu, hã, espero você trocar de roupa — disse Art, retirando-se. Estava corando?

— Homens — ela sussurrou, sorrindo preguiçosamente e tirando a regata. Naquele ponto do despertar ela não se importaria se ele espiasse. Uma parte dela sabia que ele não faria isso.

"Ele não te contaria nem que você pedisse nua", dissera Von. Olhando de relance o corpo seminu no espelho ela não soube se aquilo era verdade, mas certamente fazia sentido. Engoliu em seco. Quem que a esperava lá fora? Era o seu amigo de outrora, ou aquele que viu nos sonhos?

Art sempre foi difícil de entender. Difícil de ler, sagaz mas calado, sempre com um brilho frio nos olhos. Isso tendia a criar um certo fascínio em volta dele, algo similar ao que o silêncio de Tom fazia. Era engraçado como cada pessoa encarava isso de forma diferente. Por muito tempo ela não compreendeu direito o efeito que essa fascinação tinha em Cella, ou como Lena parecia simplesmente não ver. Alesia sempre achara que no fim Art não seria capaz de machucar uma mosca. Depois do sonho, sabia que estivera errada.

Ela ainda precisava processar a história dos Picos. Sentia-se como se tivesse assistido dez filmes em sequência, sem pausas para banheiro, sem tempo para pensar. Será que podia confiar em Art? Aceitou o convite dele muito rápido?

Enfiou a calça jeans que achou jogada num canto, pegou uma camiseta limpa e uma jaqueta, além de roupas de baixo. Colocou suas botas escuras (aquelas que Cella chamava de "botas de chutar bundas") e encontrou Art no corredor, apoiado na parede. Ele batucava o braço com o dedo, olhando para a porta.

— Você parece inquieto — ela disse, bocejando.

— Estou inquieto — disse Art, já caminhando em direção à saída. — Não consigo entrar sem a sua ajuda, e temo que eu esteja com pouco tempo.

— Pouco tempo pra quê?

— Pra entrar sem ser descoberto. Eles mantêm aquele apartamento vigiado, Henderson e Seh. Preciso agir rápido antes que a atenção deles volte pra lá.

Art atravessou a parede e ela ficou para trás, destrancando e trancando a porta. Quando saiu para o corredor viu Art indo em direção às escadas.

— Espera, anda devagar — disse ela, apertando o botão do elevador. — A atenção deles? Como assim? Em que a atenção deles estaria?

— Ora. Na casa do lago — disse Art. — Em Von, e no que quer que ele tenha encontrado.


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